O jovem povo de Faro, adolescentes às centenas, saiu à rua para assinalar o 25 de Novembro. O Algarve serve de exemplo àquela que pode ter sido a mais importante manifestação popular de um dia em que na Assembleia da República se trocavam cravos por rosas. Um rosa velho, bem entendido, se tivermos presente o sentimento de ajuste de contas com que uma certa Direita saudosista interpretou a cerimónia.
A mesma curva do Parlamento sempre muito paternalista no que respeita ao enquadramento das mulheres na sociedade, composta por deputados que continuam a estimar muito a ideia do protótipo da dona de casa desesperada e a cuidar dos filhos, enquanto o homem, valente macho independente, alimenta a família. No fundo, como no tempo dos três Salazares, quando em aldeias como a que mais estimo, homem que era homem, tinha de bater na mulher. "Todos os domingos, ao final da tarde, era uma gritaria", quando o marido voltava a casa após uma tarde passada na taberna, contou-me o Salvador, pessoa com credibilidade à prova de bala.
Décadas depois, ainda há um caminho longo a percorrer, porque, em boa medida, continuamos a ser um país machista. Percebe-se bem isso através da diferença salarial e na presença, ainda escassa, das mulheres nos mais altos cargos. Pior ainda, e é por isso que valorizo a ação dos estudantes das escolas de Faro que saíram à rua, também a violência em contexto familiar continua a ser um problema grave em Portugal. Felizmente, cada vez são mais as que perdem o medo e denunciam, embora muitas situações continuem escondidas sob um manto de medo e estigma.
Até ao dia 15 deste novembro de guerra entre rosas e cravos, 24 mulheres foram assassinadas no nosso país em contexto de violência familiar. É por isso que na passada terça-feira, Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres, as manifestações mais importantes para o país foram as que estiveram na rua com o mesmo propósito de Faro, sem flores, mas com cartazes a apontar um problema bem identificado que nos deve envergonhar enquanto sociedade. Oxalá que, num futuro próximo, não seja necessário assinalar este 25 de novembro.
