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Se, como se prevê, António Costa não for já o líder do PS quando houver as próximas eleições legislativas, teremos um fenómeno muito raro, senão único, na política portuguesa.
Dos nove maiores partidos, seis vão apresentar-se ao escrutínio com lideranças diferentes. O CDS, que não tem deputados, mas teve mais votos do que o Livre, mudou de líder. No PSD, aconteceu o mesmo. A Iniciativa Liberal seguiu-lhes os passos, um ano depois. O PCP não deixou Jerónimo de Sousa chegar ao fim do mandato, e interrompeu um longo ciclo do secretário-geral, apenas o terceiro desde a democracia. E, agora, o Bloco também vai mudar de líder. PAN, Livre e Chega, para já, mantêm as lideranças. Mas nada garante - se as eleições forem no calendário previsto - que não possam acontecer mais mudanças, sobretudo no PAN, onde a liderança de Inês Sousa Real tem sido muito contestada internamente.
Mesmo assim, ainda que Livre, PAN e Chega mantenham os atuais líderes até às próximas legislativas, há um significativo número de partidos que se apresentam com novos rostos. O que é bom para a democracia, para o eleitorado e, em última análise, para os próprios partidos que, por uma razão ou outra, ou pela conjugação de várias, tiveram a capacidade de renovar as suas cúpulas. A ideia de um líder a apodrecer no mesmo lugar, sem renovação de rostos, sem afinação de projetos, sem novas ideias ou formas de estar, ajuda a criar a ideia na opinião pública e no eleitorado de que "são sempre os mesmos". Até podem dizer o mesmo, pensar o mesmo, propor o mesmo, mas são outros. E esse refrescamento parece-me saudável e de saudar.
Se esta legislatura chegar ao fim, o PS estará no Governo há uma década. Antes disso, tinha estado, com José Sócrates, seis anos numa década; e, depois de Cavaco, com Guterres, outros seis numa década. Nos últimos 30 anos, o PS, em 2026, terá governado 22. O PSD (com o CDS) não chegam aos oito (quatro de Passos Coelho e três anos e pouco de Barroso/Santana Lopes).
A ciência política explica que não são as oposições que ganham eleições, mas os governos que as perdem. Tal como aconteceu no pós-Cavaco, em que os dois candidatos a primeiro-ministro eram-no pela primeira vez. Depois de Costa, seja na data anunciada ou, eventualmente, antes, caso o Presidente da República, as sondagens, a rua, e a opinião pública assim acabem por o determinar, a escolha dos portugueses vai, outra vez, recair não sobre um primeiro-ministro recandidato, mas por um outro rosto que nunca antes ocupou a função. Diz a história que essas eleições, com tudo em aberto e um candidato sem histórico, são mais participadas, mais polarizadas, mais interessantes e mais disputadas.
Quando houver, de novo, um jogo das cadeiras, um outro parlamento, uma nova realidade, uma recomposição partidária surgirá.
António Costa tem, portanto, se tudo "correr bem", três anos para decidir que legado vai deixar; que Portugal entrega depois de uma década de governação, onde se contarão seis anos de (quase) maioria absoluta (primeiro com a geringonça, depois com PCP), e mais quatro de uma maioria absoluta de facto. Por agora, a oposição, à esquerda e à direita, cerca o PS por todos os lados, numa estratégia de desgaste permanente, de descredibilização e desvalorização. Neste primeiro ano de maioria absoluta, o próprio Governo encarregou-se de fazer oposição a si mesmo, com os casos e casinhos que abalaram a estabilidade que a maioria conseguiu, mas não aproveitou.
Nas próximas legislativas, um novo ciclo vai abrir-se na governação. Quem é o último a ficar com a cadeira?
