"A Opinião" de Nádia Piazza na TSF.
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O que a corrupção e o Nobel da Medicina deste ano têm em comum?
Tudo. Estranho? Nem por isso.
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Em traços largos, a corrupção é um fenómeno social e político, transversal a todas as civilizações e remonta à Antiguidade.
Não há dia que passe que não se levante pelos media ou chegue aos tribunais um caso de suspeita de atos de corrupção em Portugal.
Corrupção vem do latim - corruptio - que significa degradação, alteração e o verbo corrompere significa deteriorar, estragar.
Certo é que as medidas de repressão têm-se revelado impotentes para a eliminar, e as preventivas incapazes de a evitar.
E a corrupção tem outro sintoma, o da "maria-vai-com-as-outras". Num sistema incapaz de prevenir e punir atos de corrupção, "onde um come, comem dois, três..."
Depois há também o que mantém a prática blindada e bem irrigada, a cumplicidade. É um clube que se quer seleto.
Tudo bons rapazes.
Não são poucas as suspeitas que recaem sobre entidades mais ou menos obscuras, ou antecâmaras de entidades outras, onde a prática de atos menos corretos se fundam e afundam-se por estarem amparadas em teias de cumplicidade.
Quando um cai, caem todos no tão indesejado efeito dominó. A delação ou colaboração premiada é um, entre outros instrumentos, que funciona muito bem para quebrar esses "elos" da corrente. Basta apanhar um, mas o certo.
Os males que esse fenómeno tem provocado nos alicerces do Estado de Direito e nas Democracias, veja-se o caso do Brasil, chamaram-me a atenção quando da atribuição do prémio Nobel da Medicina deste ano pelas investigações ligadas ao combate do cancro através da imunoterapia.
A estratégia da investigação traduziu-se em remover o "disfarce" das células cancerígenas para o que próprio organismo lute contra a doença.
Recuemos. O cancro desenvolve-se porque algumas das nossas células ficam fora de controlo. Temos 30 bilhões de células e algumas morrem diariamente. As que estão perto das células que morrem, proliferam-se para substituir as mortas.
E quando as substituem, param de se reproduzir. O cancro acontece quando as células se reproduzem e não param de o fazer, e, voilá, sofrem mutações. Adulteram-se, degradam-se. Continuam a crescer, multiplicam-se e criam os tumores.
O tumor por si só não mata, dado que pode, via de regra, ser removido através de cirurgia.
O cancro mata porque se torna capaz de espalhar células "disfarçadas" de boas células para outros órgãos do corpo através do sangue, reproduzindo-se, dando assim à volta ao sistema imunitário. Ganham terreno, contaminam os outros órgãos com a sua programação. Alastram-se feito um Polvo. É esse o Mecanismo.
Segundo uma renomada oncologista italiana, "o cancro mata-nos porque lhe damos tempo para o fazer".
E estamos a marcar passo.
A corrupção, primeiro, previne-se através da transparência das instituições, dificultando disfarçar o que está à vista e, segundo, uma vez alastrada, tal metástase, o escrutínio dos cidadãos são como o sistema imunitário a funcionar por si próprio.
O País político descobriu outra vez o problema da corrupção, muito por conta de uma estratégia bem-sucedida da antiga Procuradora Geral da República de priorização das investigações e afetação de recursos no seu combate.
O hecatombe que está para se dar no próximo domingo no Brasil, em tudo devido à corrupção, só nos faz temer que tal fenómeno possa ser incontrolável.
De vez em quando acontece...
Mas, Portugal não é o Brasil. Pois claro que não. Mas o Brasil já foi Portugal.