Onde havia austeridade podem agora chamar-lhe restrições. O virar de página pode ser a outra face da mesma moeda. A conversa mantém-se a mesma e a culpa está sempre no passado.
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O debate do Orçamento do Estado começou com muita retórica, mas nenhuma certeza sobre o futuro que espera a maioria dos portugueses. O primeiro-ministro, António Costa, continua a insistir na página de austeridade que foi virada, sem que essa convicção possa ser acompanhada por quem lhe garante a existência como governo. As esquerdas limitam-se a tentar convencer-nos que acordamos do pesadelo e a direita que entramos nele.
Muita palavra bonita, muita retórica de parte a parte, sem que alguém se mostre capaz de nos renovar a esperança. Vamos aprovar um orçamento, sem que ninguém acredite verdadeiramente que é o melhor que o país pode ter. Quem o apoia diz que ele é pior que o esboço que foi enviado a Bruxelas e quem procurou alterá-lo na Comissão Europeia diz-nos que ele vai levar o país à desgraça.
PS a atacar o PSD e vice-versa, Bloco a justificar o voto favorável e PCP a tentar provar que está vivo é o resumo do início de um debate que não consegue transformar palavras bonitas em euros no bolso dos portugueses. E a pergunta impõe-se: Como é possível que tenhamos gasto tanto tempo comparando o que existe com o que podia existir se a direita estivesse no poder, quando o que importa é saber em que pode ser diferente o orçamento com a maioria de esquerda que existe? Para os clubismos partidários, tudo isto pode produzir muita adrenalina, mas para o povo que trabalha ou procura trabalho é areia para os olhos.
Como disse António Costa a angústia seria muito maior se este fosse o último orçamento da legislatura, como não é, como é só o primeiro, Costa está apenas angustiado. O povo, que não veste a camisola partidária, já não tem angústias, vai sobrevivendo. A prova de que este orçamento não é de ninguém foi dada pelo próprio primeiro-ministro ao confessar que, por imposição de Bruxelas, deixou cair a descida da TSU para os salários mais baixos. O orçamento já não é de esquerda e muito menos de direita, nem de Bruxelas. É de Marte mas, como diz o ministério das Finanças, não há marcianos para pagar a conta.