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O PS anda zangado com o mundo, mas o mundo é que tem razões para andar zangado com o PS. Os socialistas têm uma especial obrigação de liderar o combate à corrupção e não de andar a reboque das pressões do Presidente da República ou dos outros partidos, tanto mais que carregam o peso de um ex-líder e ex-primeiro-ministro andar a prestar contas à justiça. O PS gaba-se de ter estado na aprovação da maioria das leis de prevenção e combate à corrupção, mas não tem como explicar que ainda não tenha saído do papel uma Entidade para a Transparência que foi criada em 2019. Uma legislatura inteira de opacidade na vida de uma entidade que deveria zelar pela transparência.
Se recuarmos no tempo encontramos mais, muito mais ineficiência na prevenção e combate à corrupção. As leis foram feitas e são muito boas, as instituições foram criadas, mas depois, como bem lembrou ontem Marcelo Rebelo de Sousa, "provam mal ou provam pouco por dificuldade de aplicação". O PS pode tentar passar as culpas, mas corre sempre o risco de ter alguém, como o Chefe de Estado, a lembrar o óbvio.
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O PS tem de carregar sozinho esta responsabilidade? Não, não tem, a outra parte do Bloco Central, o PSD, também tem de fazer mais do que fez até agora. Mas, desculpem lá, é preciso lembrar ao PS que é o PS que tem um ex-líder sob suspeita e que, com uma maioria absoluta na mão, empenhou a sua força em desvirtuar a proposta de João Cravinho. E não, não é o ex-deputado socialista que tem "a memória afetada", como insultuosamente lhe respondeu Constança Urbano de Sousa. Memória afetada é a memória seletiva que a linha da frente do PS está a utilizar para nos tentar convencer que o que vimos acontecer não aconteceu. Tem razão Manuel Alegre, "é canalhice" aquela resposta, porque atenta contra a dignidade de um dos nossos mais velhos.
O embaraço é grande e é isso que explica que o PS atire em todas as direções. Não se pretende que seja atribuído ao Partido Socialista o monopólio das culpas, nem a exclusiva responsabilidade pelos fracassos da luta contra a corrupção, mas já era um avanço se o PS não respondesse com um injustificado autoelogio às pressões para que assuma a sua parte da culpa. Ouvir dirigentes socialistas salientar que o PS é o campeão da legislação anticorrupção soa a insulto à inteligência dos portugueses.