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Luís Montenegro decidiu fazer o que ainda não tinha sido feito. De forma descarada, a contar com uma maioria absoluta na Madeira, voou este domingo até ao Funchal, acompanhado de dois dos principais vice-presidentes do partido e do secretário-geral, para se apropriar daquela que ele esperava ser a grande vitória do PSD/Madeira (mesmo com a ajuda do CDS, que também entrava na coligação). Nunca por nunca, jamais em tempo algum, um líder nacional do PSD tinha sequer pensado viajar para a Madeira na noite eleitoral. Primeiro, porque com Alberto João Jardim essa viagem não acontecia. Segundo, porque o sempre tão proclamado «respeito» pela autonomia aconselhava a que o líder nacional celebrasse em Lisboa e desse o palco todo ao presidente do PDS/M. Terceiro porque na Madeira sempre foram favas contadas e, por via disso, a festa está previamente anunciada.
Calhou mal.
O sonho de uma noite de verão do líder do PSD esfumou-se, a maioria absoluta não chegou e a festa anunciada acabou depressa. Montenegro, que ainda assim levava o discurso estudado, ainda disse que, desde que tomou posse como líder do PSD, o resultado em eleições está «PSD, 1 - PS, 0 e Luís Montenegro 1, - António Costa 0». Lá teve de adaptar a frase de «maioria absoluta» para «maioria robusta» e desejou ter nas próximas legislativas o «mesmo resultado» que Miguel Albuquerque teve na Madeira. A gestão das autonomias levou a que Montenegro falasse antes de Albuquerque e que, depois, cedesse o palco ao líder regional. Tão depressa apareceu na sede de campanha como, a seguir, desapareceu para parte incerta. Só Nuno Melo, líder nacional do CDS, ficou até ao fim.
A viagem ao Funchal correu mal. Montenegro não entrou no palco lado a lado com Miguel Albuquerque, não ficou na fotografia da noite eleitoral, acabou por ser uma espécie de artista convidado para fazer a primeira parte de um concerto que soube a pouco. Deve custar ganhar umas eleições e ficar a «um bocadinho assim» do objetivo. Albuquerque anunciou que, apesar do que disse na campanha, não se demite por não ter tido maioria absoluta e que vai apresentar uma «solução de governo» estável e para quatro anos.
Sem o Chega.
Ora, aqui está a salvação da noite, para o PSD. O da Madeira e o outro. Albuquerque foi claro durante a campanha, não governaria com o Chega. E, talvez contaminado por esse discurso regional, a noite e as circunstâncias de domingo, na Madeira, obrigaram Montenegro a ser claro como nunca antes fora. «O PSD não governará com o apoio do Chega, nem na madeira nem no país», disse o líder do PSD- «Porque não precisa», acrescentou. Com a Iniciativa Liberal da Madeira a disponibilizar-se de imediato para «ouvir» as propostas do PSD/CDS para vir a viabilizar um governo e com Albuquerque a garantir, ainda no domingo, que as negociações estavam já em curso, em breve haverá uma geringonça na Madeira que garante ao PSD mais quatro anos de governabilidade. Com maioria.
E agora, PSD?
A grande lição da Madeira é que a direita tem hoje mais votos do que a esquerda. As sondagens para as legislativas dizem o mesmo. A clarificação feita por Albuquerque pode ter-lhe custado a maioria, o Chega entrou com estrondo no parlamento regional (quatro deputados) mas está fora da solução de governo. Ao anunciar que o PSD «não precisa» do Chega, Montenegro sabe que só pode contar com o PSD, com o CDS e, no limite com a Iniciativa Liberal para «apear» o PS do poder. Mas, para fazer funcionar esta aritmética eleitoral nas legislativas, o PSD precisa de ser capaz de liderar uma solução, de arrastar para perto de si CDS e IL, de firmar compromissos seguros com ambos os parceiros e, claro, de crescer. Uma solução de governo para o país sem o Chega é mais difícil de conseguir do que foi na Madeira.
Antes das legislativas, há europeias. A lição da noite de domingo, no Funchal, terá servido para alguma coisa no espaço à direita?
