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Daniel Oliveira defende que o regresso de Pedro Nuno Santos ao Parlamento "foi inesperadamente bem-sucedido" e que "resulta de méritos seus", mas também "de alguma dose de sorte": a da "oposição ter decidido chamá-lo à primeira comissão de economia e só depois à comissão parlamentar de inquérito".
"Ali podia explicar as escolhas políticas que fez, enquadrar essas escolhas nas que outros fizeram antes de si, exibir o descaramento de uma direita que fez uma privatização à 25.ª hora, quando já se sabia derrotada, com cartas de conforto em que o Estado assumia o risco e o novo dono capitalizava a TAP com o dinheiro da TAP, e explicar a decisão de não deixar a TAP acabar com custos estruturais para o país", explica Daniel Oliveira no seu espaço habitual de Opinião na TSF.
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Segundo o comentador, o ex-ministro "tinha consciência da impopularidade da decisão, mas, tal como tentou com o aeroporto, não empurrou com a barriga".
"Até os seus adversários reconhecem que isso o distingue do primeiro-ministro. Tudo isto é mais mobilizador do que falar de mensagens esquecidas, o tema que o esperava na CPI", refere Daniel Oliveira.
"A segunda sorte foi Hugo Mendes ter ido à CPI na véspera, aplanando o terreno para si. Na desconfortável comissão parlamentar de inquérito, Pedro Nuno Santos voltou a estar bem na defesa das suas contestáveis escolhas políticas", considera, confessando: "Não terei sido o único a esquecer-me, por várias vezes, que já não era ele o ministro."
Relativamente à gestão política da TAP, Daniel Oliveira concorda com Pedro Nuno Santos "quando recorda que a interferência foi-lhe sempre exigida pela oposição, nos prémios dos gestores, na frota de carros, na ausência de rotas que se julgavam importantes, e até no preço das maçãs a bordo".
"Ainda hoje é criticado por ser intrometido demais e de menos. O mais complicado, onde se sentiu todo o seu desconforto, foi o que levou à sua demissão. E não tinha como não o ser", afirma o jornalista, elencando um conjunto de pontos onde considera que Pedro Nuno Santos "tem razão".
"É compreensível que se afaste de uma equipa uma pessoa que se acha competente, mas que cria um problema de coesão na direção no meio de uma restruturação. Não é por acaso que o novo CEO teve a oportunidade de escolher a sua própria equipa. Não vou discutir o valor da indemnização, porque isso me obrigaria a discutir os salários na aviação e, muito mais relevante, a diferença entre o que se paga aos conselhos de administração de empresas que operam no mercado global e aos seus trabalhadores", diz Daniel Oliveira.
O cronista relembra a banca pública, "onde ninguém maçou Paulo Macedo por ter oferecido indemnizações superiores a esta por razões semelhantes".
"O que interessa aqui", sublinha o comentador, "é o incumprimento da lei".
"Segundo a Inspeção-Geral de Finanças, o Estatuto do Gestor Público não foi cumprido, e o ex-ministro e o secretário de Estado não se livram da crítica quando se escondem atrás dos advogados da empresa. A substituição de uma vogal é poder exclusivo do acionista. Assim como não conseguiram justificar a aceitação de um comunicado da TAP à CMVM, que não apresentava as verdadeiras razões para a saída. Mas a maior fragilidade de Pedro Nuno Santos era mesmo a mensagem esquecida que confirmava que ele tinha dado o 'ok' a uma indemnização que, a bom recordar, todos estavam convencidos ser legal", defende Daniel Oliveira, esclarecendo que esta "não é a sua maior fragilidade por ser o mais relevante", uma vez que "ele já se tinha demitido e assumido a responsabilidade política da indemnização" tendo sido "ele a revelar a existência da mensagem". "É a sua maior fragilidade, porque a avaliação que cada um faça deste facto depende de acreditarem ou não que ele realmente se esqueceu da mensagem."
De acordo com o jornalista, "os que acreditam lamentam que não se tenha apercebido da importância política do que provavelmente é banal em empresas desta natureza, a ponto de não ficar na sua memória". "Os outros acharão que mentiu. Depende da convicção que têm do seu bom caráter e isso é sempre um problema", atira.
"Fazendo cada um a sua avaliação e sabendo-se que o percurso de um político, como qualquer pessoa, também se faz de erros, tem sido consensual que Pedro Nuno Santos não está, ao contrário das previsões, politicamente morto. Se houvesse dúvidas sobre isso, ele fez questão de manter intactas todas as pontes dentro do Partido Socialista, talvez para justificar a sua própria ineficácia na CPI, de onde Fernando Medina também saiu sem um beliscão", sublinha.
Daniel Oliveira afirma que "um deputado do PSD usou a cartada que sobra sempre que as coisas correm mal": a comparação com José Sócrates.
Isto porque "Pedro Nuno Santos é ambicioso, coisa nunca vista na política, carismático, o que me parece um elogio, e, veja-se bem, grisalho".
"Só que o problema de Sócrates não era ser combativo e até ter, em algumas áreas, visão estratégica, como se vê no caso da aposta na energia renovável. Era a forte suspeita de ser corrupto, que ninguém, no seu perfeito juízo, aponta a Pedro Nuno Santos. Se a comparação fizesse sentido perante alguém que acabara de reconhecer vários erros, coisa nunca experimentada pelo antigo primeiro-ministro, quem dera ao PS ter um Sócrates honesto, o que é uma contradição nos termos", diz.
Na opinião de Daniel Oliveira, o ex-ministro Pedro Nuno Santos "percebeu que tinha deixado de ter condições para ser ministro" e "que o ministro depende da sua autoridade perante o povo".
"Assumiu a responsabilidade e preservou o seu futuro político. Esta é uma lição para quem julgue que continua realmente a ser ministro só porque é útil numa guerra com o Presidente. O que distingue um bom político também é saber avaliar se tem condições para cumprir uma determinada função. Para isso, não chega o apoio do primeiro-ministro", remata.
Texto redigido por Carolina Quaresma