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Sempre achei muita piada à ideia de que só trabalha quem não sabe fazer mais nada, porque toda a vida pensei que há sempre qualquer coisa melhor para fazer do que trabalhar, mas sempre gostei da minha profissão e na maior parte dos dias trabalhei com gozo, já lá vão bem mais de 30 anos. Vi, no entanto, que chegue para saber que aquilo que o Relatório do Custo do Stresse e dos Problemas de Saúde Psicológica no diz é que há um problema para resolver, mas nós fazemos de conta que não vemos o que temos à frente do nariz.
As novas gerações, com nomes em inglês ou definidos por letras, como a geração Y ou millennial é a geração dos nativos digitais e não parece ter disposição para passar por aquilo que as gerações anteriores estão a passar. Por causa do stresse, da ansiedade, da depressão, do burnout, de tantas outras questões relacionadas com a saúde mental, os trabalhadores portugueses, por absentismo ou presentismo, perdem todos os anos um mês de trabalho. Presentismo define-se por estar no local de trabalho sem produzir, ou produzindo pouco, por causa de doença física ou mental. Só no universo das empresas privadas, a Ordem dos Psicólogos estima que tudo isto tenha um custo de cinco mil milhões de euros.
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Em crónica de frases feitas, convém dizer que os millennials vêm confirmar aquilo que gerações anteriores já tinham confirmado. Essa coisa de dizer "no meu tempo é que era" é coisa de velhos. O tempo que conta é o tempo presente, o tempo em que os trabalhadores estão a perder direitos e a ser transformados em máquinas com uma dupla desvantagem em relação às máquinas: não têm a energia ilimitada das máquinas e têm uma saúde mental que não resiste a ser tratada como máquina. Os millennials é que sabem, a maioria não aceita trabalhar para lá do que lhe pagam, não abdica de ter vida própria e cuida da sua saúde mental. Quando não são bem tratados mudam de empresa. Percebendo que a revolução silenciosa está em curso, o capital reage pomposamente afirmando que as empresas estão com dificuldade em segurar talento. O que as empresas não estão a conseguir é tratar as pessoas como pessoas. Algum dia isso vai ter de mudar.