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As recentes eleições autárquicas, de forma ressonante, vieram recuperar a infame expressão "Portugal é Lisboa e o resto é paisagem".
Quase todos os políticos avaliaram o sucesso da respetiva força partidária, usando como unidade de medida os resultados obtidos na capital. Não estaremos perante comportamentos de desprezo para com o resto do país, aferindo a prestação dos partidos políticos escrutinados nacionalmente com base num único critério?
É um mero [e (in)feliz] exemplo do centralismo atroz para o qual está atirado Portugal, pois Lisboa controla e se assume diapasão da nação.
Por esta e por outras, apercebem-se as consequências da excessiva centralização, que continua a maleficiar o resto do país e a favorecer continuamente a capital. A quem interessa esta situação? Alguém lucra com a sua vigência?
Em face disso, a descentralização, com caráter de obrigatoriedade a partir de 1 de abril do próximo ano, será a etapa (des)necessária que estabelece a transferência das competências para os órgãos municipais e para as entidades intermunicipais em diversos domínios, também, nos da educação e da saúde.
Este passo (medroso? prudente?) convoca uma imprescindível consonância entre as pessoas e os eleitos, mais-valia do processo, através da atribuição de alguns poderes às comunidades locais. Contudo, ainda é sentido como um avanço que fica aquém, e que não mitigará as assimetrias que enfraquecem a coesão territorial, esteando um país cada vez mais desigual.
No concernente à Educação, a matriz de competências deverá ser assegurada através da participação das escolas na sua construção, salvaguardando, deste modo, surpresas indesejadas, que nem autarcas nem diretores de escolas pretendem arrecadar.
A autonomia das comunidades escolares é um objetivo que os responsáveis por estas desejam ver reforçada. Reclamada insistentemente pelas escolas, é a mesma - salvaguardando os respetivos patamares de atuação e responsabilidade - com que contam as autarquias para ajudar a construir um país mais justo e menos heterogéneo, contrariando o desenvolvimento arbitrário que dita: Lisboa, a capital do império, com tudo e o resto do país com as migalhas!
O envelope financeiro atribuído/a atribuir às autarquias deverá corresponder, efetivamente, ao montante que o desempenho das novas funções implicará e que terá de ser liquidado, embora, em alguns casos identificados, isso não esteja a suceder, contribuindo para incrementar a desconfiança no processo. O poder político central tem de ser o (bom) exemplo e contribuir para o sucesso do instituído.
O caráter audaz e empreendedor, apanágio dos nossos antepassados, incorporado na essência de povo corajoso - Valente e Imortal - deverá ter reflexos na construção do caminho que tenha como destino a libertação deste centralismo - excessivo - que tolhe as iniciativas dos territórios, culminando no desinvestimento, na desertificação do interior, e atribui todo o tipo de mordomias a quem delas não carece e até esbanja.
A mera delegação de responsabilidades em que se transformará a descentralização, não ilidirá a continuação do favorecimento sintomático da capital, absorvendo o grosso das verbas para investimento à custa do oblívio do resto do país, e da aprovação de leis, oportunamente talhadas à feição dessa região, como se o país não tivesse formas e estilos díspares.
A regionalização é o (próximo) destino almejado, que possibilitará à Educação, também, sair a ganhar.
Professor; diretor