"A Opinião" de Nádia Piazza, na Manhã TSF.
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Começaram a serem ouvidos este mês os 13 acusados pelos crimes de homicídio e atentado à integridade física, ambos na forma negligente, no caso dos incêndios de Pedrógão Grande, incêndio que matou 66 pessoas e feriu mais de 250.
Foram falhas no combate, na gestão dos combustíveis, na proteção civil que levaram o Ministério Público a deduzir uma acusação inédita no país.
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Diz a lei que os planos de defesa da floresta devem ser obrigatoriamente "elaborados, executados e atualizados" pelas câmaras municipais.
Perante a incompetência de muitos municípios, Pedrógão Grande logo à cabeça, onde o exemplo deveria ser mandatório depois da tragédia de 2017, a autarquia viu novamente o seu Plano Municipal de Defesa da Floresta Contra Incêndios (PMDFCI) chumbado pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) a 3 de janeiro deste ano. Ainda não se sabem as razões e, entretanto, mais um verão quente e seco se aproxima.
O Governo, que já se apercebeu, tarde e a más horas, que grande parte das autarquias locais são governadas por atores políticos de uma novela de fraca qualidade, aprovou na Lei do Orçamento de Estado para 2019, um regime excecional que "em 2019, independentemente da existência de Plano Municipal de Defesa da Floresta contra Incêndios (PMDFCI) aprovado..." e passa a elencar um rol de disposições.
Fora isso, tanto ontem como hoje, a lei continua a não ditar consequências diretas civis e criminais para os responsáveis pela coisa pública em casos como esses. Porquê? Porque os partidos são incompetentes como guardiões da justiça e da democracia.
Veja-se as conclusões do recém-criado Observatório para os Incêndios Rurais que chama de "autista" o Governo por aprovar os Planos Regionais de Ordenamento Florestal sem verter as lições e conclusões então alcançadas, dizendo mesmo que foi uma oportunidade perdida (!) -, leis que são aprovadas no Parlamento e homologadas pela Presidência e que vêm cheias de alçapões que permitem às EDP's e ASCENDI's da vida que passem pelos intervalos da chuva sem assumir responsabilidades e aos presidentes de câmara que continuem olimpicamente sem cumprir legislação em vigor.
Sempre que abordamos este tipo de mixórdia temática ficamos com a sensação de que nos últimos 20 anos as instituições foram capturadas por interesses de uma claque dirigente servida por gente corrupta e/ou incompetente.
Pedrógão fica no centro do país, é o umbigo para onde todos temos de olhar, aí joga-se muito do nosso futuro coletivo. Aqui culminou em tragédia a incompetência das instituições públicas, responsáveis da coisa pública do menor ao mais alto nível. Foi uma lição que fez dar passos, mas não mudamos o registo. O registo é o mesmo porque os atores e o sistema são os mesmos.
Aqui em Pedrógão, a corrupção, o compadrio e a incompetência foram postas a nu. É rude, é grotesco. Faz querer jogar a toalha ao chão, sair à rua em protesto, emigrar, fazer como os outros...abster-me e deixar de me pôr numa fila para a ir a votos eleger mais do mesmo e, pior, para o mesmo, seja a cor que for.
Mas também foi em Pedrógão que se uniram as gentes de bem para mudar esta realidade, mostrando sem vergonha a sua vergonha. Mas até quando?
Muitas famílias e vítimas querem acreditar na Justiça do homem.
Mas pasmem. Os argumentos da defesa já chegaram à Troika...só falta culpar o Pai Natal, a este ritmo.
Nesse jogo do empurra-empurra das culpas, dos pareceres encomendados à boa maneira portuguesa, temo que esse processo possa resvalar - tal como Entre-Os-Rios - para uma anedota a que a Justiça portuguesa nos tem habituado nos últimos anos, em que não há dúvida da culpa mas não há rosto que lhe sirva.