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Relativamente ao funeral de hoje, todos sabemos quem vai, mas poucos sabem quem foi convidado e não vai! De todas as monarquias árabes apenas a Jordânia verá a presença do seu Rei e Rainha. Todas as restantes, delegaram nos respectivos Príncipes Herdeiros a representação dos respectivos reinos/países.
A excepção a esta "regra" é a Arábia Saudita, já que quem governa "de facto" é o Príncipe Herdeiro Mohamed Bin Salman (MBS), cuja presença parecia garantida para a Casa de Windsor, mas que viu no domingo (ontem), confirmada a presença do Príncipe Turki bin Mohamed al Saud, enquanto representante da Casa de Saud (Arábia Saudita, a Arábia da família Saud!). Desconhecem-se os motivos oficiais para esta não presença de MBS em Londres, mas o "Caso Jamal Khashoggi", o jornalista saudita assassinado no Consulado saudita em Istambul (Out. 2018), provocou uma reacção de repudio Ocidental conjunto à nova liderança em Riad, que se traduz num arrefecer das relações diplomáticas entre nós e eles. Este crime, analisado ao microscópio pela inteligência americana (Kashoggi escrevia para o Washington Post e era um residente de longa data nos Estados Unidos), teve como conclusão oficial americana (o grande aliado saudita no Ocidente), que a ordem para a execução do referido jornalista, partiu directamente do Príncipe Herdeiro MBS. Este engulho político e diplomático, tem pautado as distâncias criadas entre "os novos sauditas" e "os velhos europeus". Desta forma, MBS protege-se não se colocando a jeito das criticas e de algumas piadas propícias do "circuito de cocktail" de que é feita a diplomacia e onde de facto se faz política, já que o ambiente permite sentirem-se as temperaturas das várias partes e alinharem-se decisões antes de se partir para a acção.
Caso desconheça a razão principal que motivou a invasão do Kuwait pelo Iraque (1990), a História Oficial relata que num destes ambientes descontraídos, de copo na mão, Saddam terá abordado a Embaixadora americana em Bagdade e lhe terá perguntado se os EUA se importariam muito se ele anexasse o vizinho Kuwait. A resposta, também descontraída terá sido um não, mais tarde cristalizado num relatório oficial sobre a conversa que "os EUA não se metem em conflitos entre árabes, mas que qualquer querela fronteiriça terá sempre que ser regulada por meios pacíficos". No dia 02 de Agosto de 1990, respaldado com este não americano, Saddam Hussein invade e anexa o vizinho Kuwait e o Médio Oriente e o Mundo, nunca mais foram os mesmos!
Bem mais próximo de nós, Marrocos será representado pelo Príncipe Herdeiro Hassan (vulgo Moulay Hassan, sendo que Moulay não é nome é título, significando Príncipe). Aqui as razões são óbvias e baseadas em diferenças protocolares. Ou seja, o Rei de Marrocos protocolarmente não pode estar presente no funeral de uma grande figura mundial, delegando sempre tal função no seu herdeiro. Prova disso, foi a presença do jovem Moulay Mohamed, agora Rei, no funeral de Georges Pompidou, em Agosto de 1974.
A imprensa marroquina, foi aliás toda ao arquivo buscar imagens, relatos e pequenas histórias sobre a visita da Rainha Isabel II ao reino em Outubro de 1980, período conhecido como de "anos de chumbo", decorrente das duas tentativas de "putch" militar em 11 meses, entre 1970 e 1971, "anos" esses que perdurariam até à década de 1990. Uma dessas pequenas histórias que me contaram em Rabat, não em 1980, mas em 2008, foi a de um professor de língua árabe, que se lembrava de ver helicópteros a sobrevoarem a capital e pulverizarem perfume, horas antes da chegada da monarca. Precisamente a chegada nesse dia 27 de Outubro, marca a primeira de muitas "anedotas" destes 3 dias de visita oficial. Porquê? Porque o "protocolo pessoal de Hassan II" não tinha horas. Tudo começava quando ele chegava e terminava quando saía. Isabel II trouxe esta "medalha" de Marrocos, já que começou esta visita com uma "seca" de 30 minutos, tempo que teve que esperar pelo monarca alauita, que não adormeceu, antes marcou posição, já que desta foi "O Colonizador" (enquanto símbolo) que ficou à espera de um ex-colonizado! Depois, nos 3 dias seguintes, nada correspondeu ao anunciado pelo Protocolo do Palácio de Buckingham, no que foi considerado em privado, entre os membros da comitiva britânica de "tournée infernal"! Mais atrasos ao estilo do da chegada repetiram-se, um "sol de chumbo" durante estes 3 dias e almoços servidos às 16h, terão sido incompreensíveis para quem representa a pontualidade mundial!
Resta desejar "Bon Courage a Charles III" e desejar que esteja à altura da missão.
A Acontecer / A Acompanhar
- 19 a 21 de Setembro, "XX Jornadas del Instituto de Estudios Califales". Real Academia de Córdoba: Abd Al Rahman II (822-852). Biblioteca Viva de al-andalus, Córdova, Espanha;
- 22 e 23 de Setembro, "os Lusíadas-450 anos", Canal Youtube USPFFLCH e e-mail oslusiadas.450@gmail.com. Organização: Universidade de S. Paulo, Brasil;
- 21, 22 e 23 de Setembro, 4ª Edição do "Festival Nouakchott Reggae Urban Roots", Institut Français Mauritanie;
Raúl M. Braga Pires é autor do site Maghreb-Machrek, é Politólogo/Arabista e escreve de acordo com a antiga ortografia
