Corpo do artigo
Daniel Oliveira recorda o 25 de Novembro e critica a forma como a data foi assinalada pelo autarca de Lisboa. No seu espaço habitual de Opinião na TSF, o jornalista considera que Carlos Moedas "não aproveitou o palco da Câmara Municipal de Lisboa para celebrar o 25 de Novembro, uma data relevante no processo para a estabilidade democrática do país", mas sim para "assumir o 25 de Novembro, que foi derrotado no dia seguinte quando Melo Antunes falou ao país e travou os ímpetos de vingança de alguma direita".
"Não se derruba uma ditadura com 48 anos e no dia seguinte vive-se em democracia. O processo é conturbado, com avanços e recuos e não se celebra cada avanço e cada recuo, mas a data fundadora. Neste caso, o 25 de Abril, síntese que o país festeja na rua. Há mais do que um 25 de Novembro: há o de Jaime Neves, que pretendia aproveitar a derrota da extrema-esquerda militar para ilegalizar o PCP e recuar na democracia pluralista, e há o de Ramalho Eanes, Vasco Lourenço e Melo Antunes, que tinha o PCP com indispensável para a construção da ordem democrática, como anunciaram na televisão, frustrando os saudosistas", afirma.
TSF\audio\2023\11\noticias\28\28_novembro_2023_a_opiniao_de_daniel_oliveira
Há várias datas fundadoras da nossa democracia e tiveram todas lugar no dia 25, todas em Abril
O comentador defende que Moedas "quer federar uma direita cada vez mais radicalizada" e "escolheu a versão conflitual, divisiva e derrotada". "Só em Novembro se cumpriu Abril, escreveu a Câmara Municipal de Lisboa na sua página oficial", cita Daniel Oliveira.
Segundo o cronista, "há várias datas fundadoras da nossa democracia e tiveram todas lugar no dia 25, todas em Abril: a Revolução em 1974, a eleição para a Constituinte em 1975 e as primeiras eleições para a Assembleia da República, de onde saiu um governo legitimado pelo voto em 1976".
Não há nada de moderado na apropriação fantasiosa desta data, tentando garantir à direita uma centralidade na transição democrática que nunca teve
Daniel Oliveira recorda as palavras de Moedas na cerimónia sobre o 25 de Novembro: "Aqui estamos, os moderados." Uma cerimónia onde "os seus principais protagonistas vivos, Ramalho Eanes e Vasco Lourenço, não quiseram estar", diz o jornalista.
A data que pretendiam celebrar foi derrotada pelos que não apareceram na pequena festa privada de Moedas
"Logo depois houve um debate sem qualquer historiador, mas com a presença de José Miguel Júdice, fundador e ex-militante do MDLP, uma organização terrorista de extrema-direita do verão de 1975. Não há nada de moderado na apropriação fantasiosa desta data, tentando garantir à direita uma centralidade na transição democrática que nunca teve, e foi a própria Câmara que o mostrou nos cartazes que espalhou pela cidade e nas redes sociais em que ilustrou a data com a foto de um comício de Mário Soares e Salgado Zenha na Fonte Luminosa e não de qualquer movimentação do dia 25 de Novembro. Uma ilustração falsa e não esclarecida no cartaz para inventar uma iconografia popular sem a qual a data não sai (como não saiu este ano) das salas alcatifadas de cerimónias oficiais, e para alimentar uma visão radical e polarizada de um processo histórico onde a direita viajou quase sempre no lugar do morto", considera.
O cronista sublinha que "já se sabia" que "alguma direita tem há muito tempo uma relação difícil com o 25 de Abril". "Não precisam é de disfarçar com o 25 de Novembro, que também não foi como contam. Pelo contrário, a data que pretendiam celebrar foi derrotada pelos que não apareceram na pequena festa privada de Moedas", remata.
Texto redigido por Carolina Quaresma