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"Agora é a nossa vez" entra diretamente para o pódio das piores frases políticas do século XXI. Estará, muito provavelmente, entre as piores frases políticas desde que a democracia nasceu na Grécia, em 500 Antes de Cristo, mas por falta de tempo para fazer uma pesquisa exaustiva, prefiro não ser perentório nesta afirmação. Fiquemos pelo século XXI.
Num momento em que uma maioria absoluta, conquistada há pouco mais de um ano, é posta em causa por manifesta azelhice e trapalhice do governo, o que o líder da oposição tem para nos dizer é que, agora, é a vez deles. Como se a dinastia de Borgonha tivesse de ceder o trono à dinastia de Avis.
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O pior do Bloco Central não foi ter governado com austeridade há 40 anos, nem ter ameaçado deixar o país sem uma verdadeira alternativa. O pior foi mesmo o que nos revelam os suspeitos telefonemas entre Newton e Azevedo, falando de um acordo para tomar Lisboa e, a partir da capital, diz o deputado do PSD, "tomar o país". É claro que aquela suposta aliança com o PS, na lógica de "eu-é-que-sou-o-presidente-da-junta", nem precisa de ser verdade para sabermos que o país está tomado pelo bloco central de interesses. Ouvir Luís Montenegro dizer "agora é a nossa vez", manifestando uma vontade desmesurada de ir ao pote, e no dia a seguir apanhar com esta história na televisão é de levantar as mãos ao céu.
Como é de levantar as mãos ao céu ler no Expresso de hoje que o governo se prepara para entrar em campanha com o nosso dinheiro, comprando eleitorado que possa desmentir que é chegada a vez dos de Avis. E ao mesmo tempo confirmar que é verdade que o PS está agarradinho ao poder. Que andem uns armados em Borgonha e outros em Avis poderia apenas servir para nos entreter, como tem acontecido nas últimas semanas, mas é outra vez a nossa vida que está em jogo.
As contas certas de uns e de outros têm servido para baixar alguma coisa da dívida em percentagem do PIB, mas os 235 mil milhões de euros que Costa encontrou em 2015 são agora 278 mil milhões. É fácil fazer as contas, são mais 43 mil milhões de euros, quase o dobro dos orçamentos anuais da Saúde e Educação juntos, para lembrar dois setores que estão em maca no corredor, enquanto não chega a vez de regressar aos cuidados intensivos, onde vão parar sempre que se torna muito difícil gerir a dívida pública.
Em 38 países analisados pela OCDE, Portugal é o país mais dependente do banco central. Enquanto que a República Checa, a Noruega ou a Dinamarca nada devem, o nosso país tem metade da sua dívida a rolar em Frankfurt. A média da OCDE é 25%, Portugal está nos 50%. Pagamos hoje pela divida que fazemos quase o dobro do que pagávamos o ano passado e seis vezes mais que há dois anos. Quando voltar a acontecer, façam um favor às pessoas que sofrem verdadeiramente com as crises: não façam de conta que estão muito surpreendidos.