A TSF convidou especialistas a analisarem o OE2018 ao longo de toda a semana. Hoje escreve Ricardo Cabral, professor de Economia na Universidade da Madeira.
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Muito já se disse acerca do Orçamento do Estado de 2018. Os partidos à direita consideram-no uma oportunidade perdida e o regresso do despesismo público. Os partidos à esquerda, que suportam o Governo no Parlamento, realçam a continuidade no processo de recuperação de rendimentos das famílias, mas defendem que se poderia ter ido mais longe. Vários jornalistas económicos apontam os riscos, nomeadamente, nos ganhos de eficiência ambicionados, em falta de esclarecimento, por exemplo, sobre o destino de 5 mil milhões de euros para compra de activos financeiros e na melhoria do saldo estrutural.
O OE2018, nos seus grandes números, é muito parecido com o cenário para 2018 proposto no estudo "Estratégias Orçamentais para 2018-2021: as opções de política" (1), nomeadamente em relação às estimativas para o PIB nominal, redução do peso da dívida pública, receita e despesa pública total e despesa com consumos intermédios.
O Governo prevê no OE2018 que a despesa pública total cresça 2,9% em termos nominais entre 2017 e 2018, abaixo do crescimento da despesa pública entre 2016 e 2017 (+3,5%), muito inferior ao previsto no Programa de Estabilidade (PE) para 2017 (+4,6%).
O crescimento previsto da despesa pública de 2,9%, - 1,5 p.p. acima da taxa de inflação prevista - contribui para o crescimento da economia após longos anos de estagnação, prevendo-se, aliás, no OE2018, uma descida ligeira do peso da despesa pública em três décimas do PIB. Prevê-se ainda que a despesa primária (que exclui a despesa com juros) cresça 3,7% em 2018, menos do que em 2017 (+4,1%). Afigura-se-me, porém, que será difícil atingir essas metas devido à forma como algumas alterações orçamentadas na despesa pública estão estruturadas.
A principal diferença do OE2018 em relação ao estudo acima citado é que, no OE2018, é orçamentada uma menor despesa com pessoal e um maior volume de investimento. Essa é claramente uma opção de política, mas a taxa de crescimento do investimento prevista - +40,4% - parece de muito difícil execução, depois de já este ano ter falhado as metas orçamentadas: o Governo estima agora que o investimento público em 2017 subirá quase 18%, muito abaixo dos 36,6% previstos em Abril no PE.
Orçamentar grandes aumentos do investimento pode ser uma forma de sobre-orçamentar a despesa pública e de controlar melhor a execução orçamental ao longo do ano, porque é mais difícil executar e mais fácil suspender ou atrasar projectos de investimento. Com efeito, aumentos da despesa nas rubricas de pessoal ou prestações sociais teriam efeitos quase automáticos na despesa.
O OE2018 parece optimista quando estima reduções da despesa pública em quase 800 milhões de euros, em resultado de ganhos de eficiência (p. 29 do relatório do OE2018). Mas, afigura-se, prudente quando: subestima a posição de partida (é provável que o défice em contabilidade nacional em 2017 seja inferior a 1,4% do PIB); apresenta um cenário macroeconómico com um crescimento umas décimas abaixo do esperado em 2017; e subestima a potencial contribuição do Banco de Portugal para as contas públicas, caso o BdP não constitua provisões adicionais para riscos gerais, ou se as provisões forem "razoáveis".
Em conclusão, afigura-se que o Orçamento do Estado representa a normalização da política orçamental, promovendo a consolidação orçamental e a consolidação do crescimento da economia e do rendimento das famílias portuguesas.
(1) Ricardo Cabral, Luís Teles Morais, Paulo Trigo Pereira e Joana Andrade Vicente, "Estratégias orçamentais 2017-2021: as opções de política", Police Paper 10, Instituto de Políticas Públicas, 21 de Setembro de 2017.