A 16 de fevereiro de 2020, Marega decidiu abandonar o relvado durante uma partida em Guimarães. Cansado de insultos vindos da bancada, de onde até uma cadeira choveu na sua direção, o jogador tomou uma atitude inédita que marcou o debate sobre o racismo no futebol em Portugal. Mais de um ano depois, a investigação acabou com a suspensão provisória do processo, mediante pagamento de uma multa e afastamento dos arguidos de recintos desportivos durante um ano.
Houve um antes e um depois do caso Marega no desporto nacional? Depende se o olhar lançado sobre o tema for otimista ou, pelo contrário, se focar no copo meio vazio. Rodrigo Cavaleiro, presidente da Autoridade para a Prevenção e Combate à Violência no Desporto, disse ao jornal Público não ter dúvidas de que o incidente mudou a atenção ao problema. Nos últimos quatro anos, 19 pessoas foram condenadas por atos racistas e xenófobos em recintos desportivos. Ainda assim, uma média anual muito pequena face à quantidade de gritos, frases e cartazes que continuamos a ver e ouvir dentro dos estádios.
Este fim de semana, Vinícius Júnior marcou o pós-jogo entre Real Madrid e Valência. As análises à partida e sobretudo aos hábitos entranhados há anos na La Liga correram mundo. De Espanha ao Reino Unido, passando pelo Brasil, vários comentadores consideraram que a mudança é "inescapável" e que as lágrimas de Vinícius abriram espaço à esperança.
Num gesto de grande alcance mediático, ao final da tarde de segunda-feira o Cristo Redentor desligou a iluminação, em solidariedade com todos os que sofrem preconceito, em qualquer ponto do mundo. "Preto e imponente", comentou o futebolista em reação ao momento simbólico, confessando sentir-se emocionado com essa e outras manifestações de luta e de carinho que tem recebido ao longo de meses.
O ritmo acelerado a que hoje circula a informação e o efeito multiplicador das redes não têm apenas impactos negativos. Podem potenciar mensagens fortes, ajudar a lançar ações globais. O que não significa necessariamente que isso chegue para mudanças efetivas. A rapidez é muitas vezes baseada na emoção. As mentalidades mudam devagar. Educar exige tempo. Digerir os temas e percebê-los na sua complexidade também.
Momentos como o da saída de campo de Marega e o da revolta em torno de Vinícius Júnior são importantes. Lançam mensagens à escala mundial. Para que a mudança seja uma realidade, é preciso que sejam acompanhados de ações coerentes. Dentro dos clubes, nas claques, nas estruturas de formação onde os pais são tantas vezes os piores exemplos para os filhos. E fora de campo, claro. Na vida.