Anticorrupção no centro da luta política de Cravinho: plano rejeitado pelo PS, demissão e o apontar do dedo a Sócrates
O antigo ministro fez parte dos governos de António Guterres e Vasco Gonçalves. Morreu esta quarta-feira aos 88 anos
Corpo do artigo
O antigo ministro socialista João Cravinho, que morreu esta quarta-feira, aos 88 anos, foi um dos rostos da luta contra a corrupção. Em 2006, foi autor de um pacote anticorrupção, que incluía a polémica proposta de criminalização do enriquecimento ilícito e que colocava sob suspeita pessoas que tinham declarações de rendimentos que não correspondiam com o património real. Numa altura em que o líder do PS era o então primeiro-ministro José Sócrates, o plano acabou por não ser aceite pelos deputados socialistas no Parlamento, o que acabou por levar à demissão de João Cravinho da bancada.
Anos mais tarde, em 2014, em entrevista à RTP, disse que tinha sido travado de todas as formas e feitios e que "não houve a menor vontade política de levar aquilo para a frente". Já em 2021, em declarações à SIC, acusou o Governo de Sócrates de travar o combate à corrupção e denunciou comportamentos inadmissíveis do então primeiro-ministro.
Antes, em 2001, João Cravinho foi testemunha no processo que julgou o então presidente da Junta Autónoma de Estradas (JAE) Garcia dos Santos por desobediência qualificada, depois de ter recusado revelar ao parlamento quem lhe disse haver situações de corrupção em empreitadas daquele organismo público tutelado pelo Governo.
O caso remontava a 1998, quando Garcia dos Santos denunciou casos de corrupção na JAE, estrutura que deixou no mesmo ano em rutura com o então ministro das Obras Públicas. No ano seguinte, João Cravinho extinguiu a JAE.
João Cravinho nasceu em Angola a 19 de setembro de 1936 e contava com um extenso currículo. Fez parte do IV Governo provisório, liderado por Vasco Gonçalves, enquanto ministro da Indústria e Tecnologia, em 1975. Na Assembleia da República, foi deputado nos anos 1980 e no Parlamento Europeu em 1994.
Foi ainda ministro do Equipamento, Planeamento e Administração do Território do Governo de António Guterres.
Formado em Engenharia Civil, pelo Instituto Superior Técnico, e com mestrado em Artes (Economia) pela Universidade de Yale, chegou a frequentar durante dois anos um programa de doutoramento da Universidade de Oxford, que deixou após o 25 de Abril. Foi professor nas áreas de Economia Industrial e das Relações Externas.
Era um assumido defensor da regionalização, considerando, em nome da coesão, a OTA como a melhor localização do novo aeroporto de Lisboa. Para Cravinho, a escolha de Alcochete era "para satisfazer interesses económicos".
Foi diretor-geral do Planeamento da Indústria, fundador e diretor do Grupo de Estudos Básicos de Economia Industrial (GEBEI), consultor da OCDE, da UNESCO e da Comissão Europeia.
O seu filho, João Gomes Cravinho, foi ministro da Defesa e dos Negócios Estrangeiros em executivos liderados por António Costa.
