Braço de ferro na urbanização da Alta de Lisboa: PS acusa Moedas de "não defender os interesses do município"
"A Câmara vai estar a transferir terrenos para uma entidade privada, que é a SGAL em troca da construção de habitação, de equipamentos, de infraestruturas, mas nesse contrato não está expresso quais é que são as penalizações para a SGAL, caso não apresente a devida construção", diz Carla Madeira à TSF.
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Vai ser até à última hora o braço de ferro entre Carlos Moedas e a oposição sobre o que fazer ao contrato para terminar a urbanização da Alta de Lisboa. Um contrato que prevê a cedência de lotes à empresa para construir habitação.
O compromisso com a sociedade imobiliária criada pelo antigo magnata dos casinos Stanley Ho já vem desde 1984, quando a Câmara era liderada por Krus Abecassis.
A coligação Novos Tempos, de Carlos Moedas, quer alargar o prazo para terminar as obras até 2032. É a primeira vez que está em cima da mesa a extensão do contrato por um período de sete anos. O PS apresentou entretanto uma proposta para que o contrato seja estendido apenas mais dois anos.
A votação das duas propostas é na segunda-feira, 31 de março, no último dia do atual contrato com a Sociedade Gestora da Alta de Lisboa (SGAL).
À TSF, a deputada municipal Carla Madeira, do PS, afirma que não se trata de uma mera prorrogação do prazo do contrato e, por isso, defende que seja visto pelo Tribunal de Contas e sublinha que a proposta de Carlos Moedas favorece mais o privado do que a própria autarquia.
"O PS entende que a proposta que foi apresentada pela Câmara não defende devidamente os interesses do município e dos lisboetas e por motivos vários. Essencialmente, porque compromete um conjunto vasto e importante de terrenos urbanizados na Alta de Lisboa durante o período de sete anos. O contrato da Câmara é um contrato de sete anos, o que significa que, durante esses sete anos, a Câmara vai estar a transferir terrenos para uma entidade privada, que é a SGAL (Sociedade Gestora de Alta de Lisboa) em troca da construção de habitação, de equipamentos, de infraestruturas, mas nesse contrato não está expresso quais é que são as penalizações para a SGAL, caso não apresente a devida construção", diz a socialista.
O PS defende que a câmara não pode ficar presa a este compromisso com a empresa durante dois mandatos: "Dois anos não é o mesmo que sete anos. Sete anos são dois mandatos. Está lá dito que este vai ser o último contrato, é por isso que são sete anos, e que a SGAL vai realizar tudo o que falta, mas depois não está lá escrito em lado nenhum o que é que acontece se não for realizado. E, entretanto, nós corremos o risco de perder os terrenos que ainda estão neste momento na posse da Câmara para uma entidade privada e depois não os poder reaver. Portanto, isto preocupa-nos não estar qualquer referência no contrato de o que é que acontece aos terrenos que nestes sete anos passarem para a SGAL se não ocorrer a construção, nomeadamente a construção de habitação, que é devida."
Em causa está a construção de 12 mil casas e de infraestruturas em atraso. O PS receia que todo o processo termine com mais especulação imobiliária na Alta de Lisboa.
"Há aqui várias coisas no contrato que nos colocam muitas dúvidas, nomeadamente a ausência de visto do Tribunal de Contas, o perdão da TRIU [Taxa pela Realização, Manutenção e Reforço das Infraestruturas Urbanísticas], a desobrigação de compromissos antigos, como a construção da ligação entre o Campo Grande e as Galvanas. E aqui nós estamos a falar duma área que permite cerca de 12 mil habitações. Ora, nós com este contrato numa altura que nós vivemos uma crise da habitação grave, estamos a privar o município de uma parcela importante de terreno da cidade de Lisboa, que permite a construção de 12 mil habitações", explica.
A socialista Carla Madeira critica também o facto de a extensão do prazo ter sido apresentado pela Câmara já fechada, sem dar tempo para ouvir os moradores da zona ou para analisar o contrato.
"Este contrato foi apresentado pelo município à Câmara e à Assembleia Municipal a poucos dias da finalização do contrato. A última prorrogação que foi feita termina a 31 de março, ou seja, na próxima segunda-feira e só há cerca de duas semanas é que foi dado conhecimento aos eleitos, quer na Câmara, quer na Assembleia Municipal, do teor deste contrato. Portanto, não deu Tempo para uma análise adequada do contrato. Não deu tempo para nenhuma negociação, para a audição das associações de moradores e, portanto, é para nós inaceitável", revela.
O contrato com a Sociedade Gestora da Alta de Lisboa foi celebrado nos anos 80, quando o objetivo era converter o bairro da Musgueira,
na altura a maior mancha de barracas de Lisboa, em habitação.
A TSF pediu esclarecimentos ao presidente da Câmara Municipal de Lisboa, mas sem sucesso.