"Claríssimo genocídio." Gomes Cravinho lamenta que Governo português não reconheça Estado da Palestina
À TSF, o ex-ministro dos Negócios Estrangeiros do Governo de António Costa fala em “divergência rara” entre diferentes Executivos de Lisboa, em matéria de relações externas
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"É claríssimo", responde João Gomes Cravinho quando questionado pela TSF sobre se o que está a acontecer na Faixa de Gaza se pode apelidar genocídio.
Não há nenhuma sombra de dúvida quanto a isso. Obviamente, é uma matéria para juristas poderem debater, mas aquilo que salta aos olhos é que parece corresponder por inteiro àquilo que é a definição de genocídio e, portanto, não tenho nenhuma hesitação em classificar deste modo aquilo que Israel está a fazer em Gaza.
O ex-ministro dos Negócios Estrangeiros do Governo PS, defende que se o Executivo de Antóno Costa tivesse continuado até ao fim do mandato, já teria reconhecido o Estado da Palestina. “É evidente que a postura do Governo do PS era diferente da postura do Governo que está atualmente em funções”, sublinha, em declarações à TSF.
“Isso é relativamente raro porque há uma tradição de grande continuidade na nossa política externa”, adianta. Cravinho lembra a divergência maior entre PS e PSD, em 2003, quando os Estados Unidos invadiram o Iraque, apoiados pelo Estado português, mas, “fora isso, ao longo da história, desde o 25 de Abril, tem havido poucas divergências de fundo. Agora surge esta questão em relação ao reconhecimento da Palestina”, lamenta.
O Grupo de Apoio aos Refugiados Palestinianos tem criticado a inação do Executivo português, por não apoiar a saída de famílias palestinianas de Gaza, e o próprio Partido Socialista acusou esta quarta-feira o Governo de Luís Montenegro de ter "um silêncio ensurdecedor" em relação a esta matéria. Por sua vez, os socialistas denunciam igualmente o silêncio governativo "ensurdecedor" sobre o apoio à saída de famílias palestinianas de Gaza. O PS diz que há famílias identificadas que "vivem numa linha ténue de sobrevivência" e cuja saída "é sistematicamente recusada por parte das autoridades portuguesas, em contraciclo com países como França, Espanha, Itália ou Roménia", que têm promovido corredores de acolhimento humanitário.
No entanto, Gomes Cravinho admite que retirar pessoas da faixa de Gaza é muito difícil, se não impossível nesta altura. ”Durante aquele período em que fui o ministro dos Negócios Estrangeiros, havia um esforço permanente, quotidiano, para procurar retirar de Gaza. Primeiro as pessoas com nacionalidade portuguesa e os familiares”, conta. “Mas isso era extremamente difícil. As autoridades israelitas dificultavam muitíssimo o processo, e apenas conseguimos retirar alguns, poucos, muito menos do que desejávamos e isso inteiramente por responsabilidade das autoridades israelitas”, acrescenta. O antigo ministro lembra que, do lado português, os serviços diplomáticos, tanto em Israel, no Egito ou na Palestina, faziam um esforço constante para retirar essas pessoas, mas eram bloqueados pelos israelitas.
“Infelizmente houve mesmo três nacionais portugueses que foram mortos por mísseis israelitas, pessoas que estávamos a tentar retirar e que tinham sido dirigidas por indicação Israelita a Khan Younis, supostamente uma cidade salvaguardada dos ataques e acabaram por ser mortos por mísseis israelitas”, recorda.
“Toda a responsabilidade é das autoridades israelitas e não havia nenhuma falta de esforço por parte das autoridades portuguesas”, acentua.
“As autoridades israelitas têm, desde o princípio, transformado a vida em Gaza num inferno e continuam a fazê-lo, não têm demonstrado nenhuma abertura humanitária”, critica.