Há oito candidatos para liderar um concelho que é casa de 210 mil pessoas. Ao longo dos 167 Km2 de Loures convivem zonas muito urbanizadas com áreas rurais. Cada lado tem as suas queixas e algumas são de todos
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Em Camarate, no Bairro das Fontaínhas, a memória política do país está marcada pela tragédia aérea que, entre outros, custou a vida a Sá Carneiro. A rua estreita, tão estreita que não cabem dois carros ao mesmo tempo, é constantemente atravessada por aviões a baixa altitude e guarda ainda a placa que assinala o acidente, uma marca que colocou Loures no mapa da política nacional.
Encontramos Manuela à janela. Precisamente a mesma janela onde pousava os cotovelos no dia 4 de dezembro. "Estava aqui, ouvi um grande estrondo", conta com sotaque das ilhas, "como sou açoreana, achei que era um sismo e fiz logo uma reza das nossas. Depois achei que era uma garrafa de gás a explodir. Juntou-se muita gente. Era um fogo, um fogo ali em cima. A guarda mandou-me ir para dentro e nunca mais vi nada."
Durante muitos anos esta rua foi local e romaria política. Hoje menos. Mas quem aqui vive é tão pobre como há quase meio século. Há é mais vizinhos imigrantes.
A pressão habitacional está por todo o lado e sai particularmente cara em freguesias como Moscavide e Portela, onde o preço do metro quadrado já ultrapassa os 3 100 euros. Outros problemas mais ou menos generalizados são os transportes públicos reorganizados pela Carris Metropolitana, mas ainda com queixas de intervalos longos e ligações falhadas; e a saúde, com o Hospital Beatriz Ângelo, inaugurado há apenas 13 anos, a acumular episódios de sobrelotação e tempos de espera de até 17 horas nas urgências.
Os candidatos
Ricardo Leão, de 50 anos, conquistou a câmara em 2021, sem maioria absoluta, após oito anos de gestão comunista. O seu mandato ficou marcado pela polémica declaração sobre o despejo “sem dó nem piedade” de inquilinos municipais envolvidos em distúrbios e, mais recentemente, pelas demolições no Bairro do Talude. Recandidata-se com a promessa de consolidar projetos em áreas-chave: educação, saúde, mobilidade, habitação, desporto e requalificação do parque habitacional. Entre as prioridades, destacam-se a Linha Violeta do Metro, a Linha Intermodal Sustentável e novos centros de saúde e escolas.
O PSD volta a apostar em Nélson Batista, de 54 anos, gestor e vereador com os pelouros do Ambiente e da Economia e Inovação. Apresenta a segurança, a habitação e a mobilidade como áreas prioritárias - olha para os modelos de Lisboa e Cascais como referência.
A CDU concorre com Gonçalo Caroço, bioquímico de 50 anos, vereador sem pelouros neste mandato, mas com experiência executiva durante a presidência de Bernardino Soares. Assume a candidatura como “única capaz de inverter o rumo” e aposta em políticas para habitação, saúde, mobilidade, educação, cultura e desporto.
Do lado do Chega, Bruno Nunes, gestor de 48 anos, deputado e vereador, procura transformar Loures na primeira “câmara Chega”. Com discurso de rutura, centra-se na segurança, limpeza urbana, habitação e gestão financeira. Reivindica o “legado” de André Ventura no concelho.
À esquerda, surge a coligação “Construir o Futuro”, que junta BE, PAN e Livre. O cabeça de lista é Luís Sousa, de 48 anos, que coloca a habitação, a saúde, a educação e os transportes ecológicos no centro da agenda. Critica a falta de transparência na governação atual e promete orçamentos participativos e sessões públicas regulares.
A Iniciativa Liberal estreia-se com Luís Martins, ex-controlador de tráfego aéreo de 69 anos. Defende uma gestão financeira rigorosa e critica o “populismo” de PS e Chega, propondo soluções para habitação, mobilidade e saúde.
Também pela primeira vez em Loures, o ADN apresenta João Gomes, de 55 anos, trabalhador dos Serviços Municipalizados e surdo de nascença. Quer um concelho inclusivo e integra na lista dez candidatos surdos. As suas bandeiras são a habitação acessível, a mobilidade e a inclusão social.
O oitavo nome é Isabel Elias, jurista de 62 anos e fundadora do MPT. Defende a legalização de bairros clandestinos e a construção de casas a custos controlados. Residente em Lisboa, assume a candidatura como resposta a um desafio lançado por moradores do concelho.
As contradições
Loures é um mosaico de gente e de vivências: trabalhadores da logística e comércio no eixo Sacavém–Prior Velho, jovens famílias em freguesias densas, comunidades envelhecidas no Norte rural. A imigração é visível — da Quinta do Mocho, exemplo de transformação social, ao Talude, sinal de que tudo pode sempre voltar ao princípio.
O concelho tem sido palco de alternância entre PS e CDU, com ciclos prolongados de governação. Em 2021, Ricardo Leão pôs fim a oito anos de presidência comunista, mas governou sempre sem maioria absoluta, em entendimento com o PSD. O executivo OS
Os problemas
A saúde é incontornável, com a falta de médicos de família e a pressão sobre o Hospital Beatriz Ângelo, construído há 13 anos, ainda com sinais de edifício moderno, mas ao nível dos recursos já extenuado por tanta procura. Nos transportes, persistem as críticas à rede da Carris Metropolitana. A habitação é outro ponto central, com preços em alta e falta de soluções acessíveis para jovens e famílias