Desacatos em Lisboa. Políticos "não ajudam se incendiarem esse fogo", proposta de despejos em caso de crime é "ilegal"
As declarações do autarca de Loures sobre os despejos dos moradores de habitação social que venham a ser condenados pelos tumultos estiveram em debate n'O Princípio da Incerteza
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O líder do Partido Socialista, Pedro Nuno Santos, visita, esta segunda-feira, os bairros periféricos de Lisboa afetados por desacatos após Odair Moniz ter sido baleado mortalmente pela PSP. A visita de Pedro Nuno Santos acontece depois das declarações do autarca de Loures, que defende "sem dó nem piedade" os despejos dos moradores de habitação social que venham a ser condenados pelos tumultos. No programa O Princípio da Incerteza, da TSF e CNN Portugal, a líder parlamentar socialista, Alexandra Leitão, deixa claro que, em matéria de insegurança, os políticos não devem incendiar as situações.
"Eu não vou pronunciar-me sobre nem o meu colega de partido em causa, nem sobre o que a direção do Partido Socialista deve fazer. Eu estou-me a pronunciar sobre a medida e a medida, obviamente, não tem cabimento num Estado de direito democrático. Em segundo lugar, no plano político, queria dizer que eu concordo com o que ambos disseram. Há um problema de perceção de insegurança maior do que a verdadeira insegurança. Mas os políticos não ajudam se incendiarem esse fogo. Os políticos devem fazer um discurso factual e tomar as decisões, também elas de segurança, que aos casos caibam", considera.
Para David Justino, a ideia avançada pelo autarca de Loures é "ilegal". "Estabelece-se entre o morador e o município um contrato de arrendamento que tem obrigações, tem deveres e também tem direitos. Não creio que num contrato de arrendamento constasse precisamente isso, não vi nenhum contrato de arrendamento da Câmara de Loures, portanto, estou só a levantar a suspeição, mas ele tem de estar sujeito ao regulamento da habitação social da câmara de Loures. No regulamento, que eu por acaso depois fui consultar e ver, não está lá nada disso. Quer dizer, está o mau comportamento dentro do prédio ou dentro do andar como motivo de rescisão de contrato. Agora, a situação que se viveu não está lá e, portanto, se querem rever, tudo bem, estão no direito de o fazer, só que é ilegal. A própria revisão nesse sentido é ilegal", explica.
Já o antigo ministro do PSD Miguel Macedo compreende os autarcas que defenderam estes despejos e o porquê de o terem feito.
"O presidente da junta de Santa Maria Maior, Miguel Coelho, ou o presidente da câmara de Loures não deixaram de ser socialistas porque fizeram esta afirmação. Eles fizeram esta afirmação, em grande medida, porque estão junto das populações e sentem problemas limite a que ousam, num determinado momento, melhor ou pior, dar expressão pública", sublinha.
Odair Moniz, cidadão cabo-verdiano de 43 anos e morador no Bairro do Zambujal foi baleado por um agente da PSP na madrugada de 21 de outubro e morreu pouco depois, no hospital, em Lisboa.
Segundo a PSP, o homem pôs-se "em fuga" de carro depois de ver uma viatura policial e despistou-se na Cova da Moura, onde, ao ser abordado pelos agentes, "terá resistido à detenção e tentado agredi-los com recurso a arma branca".
A associação SOS Racismo e o movimento Vida Justa contestaram a versão policial e exigiram uma investigação "séria e isenta" para apurar responsabilidades, considerando que está em causa "uma cultura de impunidade" nas polícias.
A Inspeção-Geral da Administração Interna e a PSP abriram inquéritos, e o agente que baleou o homem foi constituído arguido.
