"Estamos a viver à beira do precipício. Nenhum partido hoje democrata pode estar descansado"
"A luta agora já não é prioritariamente contra a democracia liberal que a esquerda visa sempre, mas tem de ser contra a extrema-direita. Isso foi o erro principal", disse o filósofo José Gil à TSF
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O filósofo José Gil diz que Portugal está a viver à beira do precipício, tendo em conta o resultado das legislativas do último domingo, e nem mesmo a AD pode estar descansada com o voto dos portugueses, apesar da vitória nas urnas.
"Nós estamos a viver mundialmente, na Europa, - estou a falar nós os democratas, nós a democracia, e nesta democracia eu englobo a esquerda e a direita tradicionais -, estamos a viver à beira do precipício. Toda a gente está à espera que qualquer coisa aconteça, ou que vá para um lado ou que vá para o outro, mas muito provavelmente só para um lado. A saber que a onda se torna um tsunami e a extrema-direita tome o poder em França, tome o poder em Itália, que não tem ainda o poder todo, longe disso, na Alemanha, etc. E estamos a viver na corda bamba. Quando me pergunta: a AD pode estar descansada? Eu acho que não, mas nenhum partido hoje democrata pode estar descansado", considera o filósofo em declarações à TSF.
Questionado sobre se acha que o eleitorado do Chega defende todas as ideias racistas, xenófobas e homofóbicas do partido, José Gil diz que é preciso fazer uma grande análise a esse assunto. No entanto, não tem dúvidas em afirmar que o racismo está entranhado em Portugal.
"Eu não lhe vou dizer que os portugueses não são racistas, os portugueses não são xenófobos. Eu posso dizer isso, não são. Hoje eu verifico que em certas corporações há racismo. Há um sistema material, um funcionamento, que leva e predispõe ao racismo e à xenofobia. Portanto, isso tudo tem de ser analisado. Não se pode já etiquetar antes dessa análise. Eu não lhe chamo reflexão, dizem que é uma reflexão, é esconder uma espécie de incapacidade de ver mais longe", argumenta.
O filósofo considera que os partidos à esquerda, a começar pelo PS, enganaram-se no alvo ao longo dos últimos anos: "A luta agora já não é prioritariamente contra a democracia liberal que a esquerda visa sempre, mas tem de ser contra a extrema-direita. Isso foi o erro principal que começou, já toda a gente sabe, antes de António Costa, mas com António Costa que teve uma expressão sintomática com este dirigente do PS que precisamente era uma pessoa reativa, reagia constantemente a quê? Ao PS, à democracia liberal e não foi capaz de pensar um socialismo, um pensamento social novo, que tenha como prioridade primeira a defesa e reformulação da democracia, contra, neste caso, o Chega."
Para José Gil, de nada vale unir todos os partidos da esquerda se não for para combater, em primeiro lugar, a extrema-direita.
