"Estratégia inábil e perigosa." Ordem dos Médicos vai apresentar 20 medidas para fixar profissionais no SNS
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Médicos, enfermeiros e sindicalistas aguardam pelas mudanças prometidas pela ministra da Saúde, que na segunda-feira defendeu que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) tem vivido dificuldades também pela dependência do trabalho de médicos tarefeiros. No entanto, há alguns receios na estratégia que o Governo quer seguir e, mesmo que seja preciso reduzir o trabalho dos prestadores de serviços, defenderam que a prioridade deverá ser tornar o SNS mais atrativo. A Ordem dos Médios (OM) vai apresentar 20 medidas ao Governo.
A questão dos médicos tarefeiros entrou na ordem do dia, após a urgência de obstetrícia e ginecologia do Hospital Garcia de Orta, em Almada, ter fechado de forma inesperada no passado fim de semana. Sem querer apontar responsabilidades, a ministra da Saúde, Ana Paula Martins, sublinhou a dependência das urgências de trabalho médico feito em regime de prestação de serviços, considerando que este modelo ainda vai ter muitas dificuldades nos próximos tempos ao SNS, sobretudo de recursos humanos.
Lembrando que os médicos tarefeiros não obedecem às mesmas regras dos profissionais do SNS a trabalhar nas suas equipas, Ana Paula Martins defendeu: "Não podemos ter contratos completamente distintos, ao ponto de haver alguns hospitais (...) onde temos regimes em que os profissionais são contratados sem ter que fazer urgência, mas afinal o mesmo profissional noutro hospital, a não poder ter essa prerrogativa.”
Ana Paula Martins disse que a nova legislação vai "clarificar" qual o regime que é seguido para a contratação do trabalho em prestação de serviço e admitiu o risco de as regras a definir poderem afastar alguns profissionais. O risco é igualmente reconhecido pelo bastonário da OM, Carlos Cortes, que considera “a estratégia [do Governo] profundamente inábil e perigosa para o SNS”.
“A primeira coisa a fazer não é retirar condições aos prestadores. A primeira coisa a fazer é criar condições de valorização para podermos atrair os médicos para o SNS”, alertou, esta terça-feira, no Fórum TSF.
“É pelos prestadores de serviços que o SNS consegue dar hoje a resposta, insuficiente e com imensas dificuldades, mas consegue ainda dar a resposta que nós temos”, prosseguiu.
Para Carlos Cortes, a ministra da Saúde está certa no objetivo traçado, mas errada na estratégia traçada. A OM vai, por isso, apresentar um pacote de 20 medidas ao Governo com “receio de que as coisas possam a vir a correr ainda pior no SNS”.
Já o presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH), Xavier Barreto, fez uma leitura diferente e mostrou-se convicto de que a estratégia do Governo pode ser “bem sucedida”, uma vez que não só pretende desincentivar a prestação de serviços, como criar condições mais atrativas no SNS.
Xavier Barreto disse que “o trabalho em prestação de serviços feito por médicos não tem qualquer vantagem, nem em termos de custo, porque são duas ou três vezes mais caros que os restantes profissionais, nem em termos da qualidade”. Mas o Executivo "não se pode limitar a pensar em resolver esta situação dos tarefeiros", ressalvou.
Do lado dos enfermeiros, o bastonário Luís Filipe Barreira sublinhou que há também uma enorme escassez de profissionais e é prioritário que o Governo tome medidas para atrair os jovens para o SNS.
No Fórum TSF desta terça-feira, o bastonário da Ordem dos Enfermeiros aproveitou para alertar para outra situação: “Estamos em setembro e os planos de desenvolvimento e orçamento das Unidades de Saúde Locais, que são um instrumento importante da gestão estratégica das instituições, ainda permanecem no Ministério das Finanças sem aprovação e estes planos permitem, de facto, uma contratação de enfermeiros com vínculos mais estáveis.”
Do lado dos sindicatos, Joana Bordalo e Sá, da Federação Nacional dos Médicos (Fnam), disse ficar a aguardar as mudanças prometidas por Ana Paula Martins em relação aos médicos tarefeiros, esperando que não fique "na calha" fechar a porta a especialistas e, por outro lado, deixar a aberta a contratação de médicos sem especialidade.
