"A Madeira tem que recuperar diferencial fiscal que tinha antes da troika". Paulo Cafofo, à TSF e ao DN, defende diferença de 30% nos impostos face ao continente.
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Progressivamente e sem desequilibras as contas públicas, a Madeira tem que conseguir recuperar o diferencial fiscal de 30% que tinha antes da chegada da troika à região. Em entrevista à TSF e ao DN, Paulo Cafofo, acusa de ter sido o PSD a deitar ao lixo a autonomia da região.
Uma das consequências do programa de ajustamento que foi imposto à Madeira foi o aumento dos impostos. O senhor defende uma descida da carga fiscal na Madeira e se for presidente do Governo Regional da Madeira vai bater-se por isso?
Nós somos uma região ultraperiférica. Este arquipélago tem, pela sua insularidade, necessidades básicas. As acessibilidades, o transporte de pessoas e de bens necessita sempre do apoio para equilibrar não só a nossa economia, mas também o bem-estar de toda a população, e nós tínhamos aqui o diferencial de 30%. Quando se fala em autonomia parece que só o PSD é que é o defensor da autonomia, mas foi esse PSD precisamente que colocou a autonomia no caixote do lixo e isso verificou-se com a questão do PAEF, este Plano de Ajustamento Económico e Financeiro. Nós tínhamos aqui um diferencial de 30% no que diz respeito à fiscalidade e ele fez com que ficássemos sem esse diferencial, prejudicando obviamente não só as pessoas como também a economia, a competitividade das empresas madeirenses, seja internamente, seja também na capacidade de exteriorizarem os seus negócios para fora da ilha.
O que é que o senhor vai fazer se for presidente?
Eu penso que temos de repor progressivamente este diferencial fiscal.
Para os 30%?
Sem nunca pôr em risco as contas públicas e o rigor que devemos ter com elas. Aliás, isso tem sido algo que eu tenho feito aqui na Câmara Municipal do Funchal. Nós já reduzimos a dívida para metade daquela que tínhamos e, mesmo assim, conseguimos baixar impostos. Não só a devolução do IRS, como baixar o IMI para a taxa mínima, são exemplos de um bom equilíbrio entre pagar dívida, baixar impostos e ainda apostar na economia.
O offshore da Madeira ainda faz sentido? Compreende os argumentos de quem defende há muito tempo, como o Bloco de Esquerda, o fim deste offshore?
Na Madeira não podemos inventar muito no que diz respeito à economia de uma Região como a nossa. Nós temos o turismo que tem mais de 200 anos e é uma atividade fundamental para a nossa terra, mas também temos o Centro Internacional de Negócios que continua a fazer sentido como fator de possibilidade de entrada aqui nesta Região de fontes de receita que são obviamente importantes para a nossa economia.
Acha que o Governo central olha para a Madeira e para os Açores com os mesmos olhos ou, por outras palavras, o facto de o Governo açoriano ser liderado pelo Partido Socialista dá-lhe alguma vantagem?
Eu já respondi a isso. Acho que se aqui, no que diz respeito à Região, o Governo da República não olha de forma diferente independentemente de quem aqui estiver, seja o PSD seja o PS, também não acho que a nível dos Açores isso aconteça. Aquilo que eu vejo, isso sim, é uma coesão que é necessária em termos do nosso país porque não se pode comparar aquilo que é desigual nem tratar de igual o que não é igual. Nós somos umas Regiões Autónomas, a Madeira e os Açores - é preciso também dizer que entre a Madeira e os Açores há diferenças -, em que não pode haver um tratamento igual, as diferenças têm de ser consideradas e, nas diversas dificuldades que as regiões têm, as especificidades devem ser atendidas.
Um dos fantasmas que Alberto João Jardim foi usando ao longo dos anos, sempre que se chateava, digamos assim, com o Governo central era o da independência da Madeira. Há alguma circunstância em que essa possibilidade lhe passe pela cabeça?
[Risos] Deixe-me dizer, antes de mais, que agora o fantasma é o próprio Dr. Alberto João Jardim, que neste momento faz sombra ao próprio presidente Miguel Albuquerque face às lutas internas naquilo que foi a passagem de testemunho nada pacífica dentro do PSD, portanto não deixa de ter piada. Eu considero o próprio Dr. Alberto João Jardim um fantasma, mas um fantasma para o atual presidente do Governo.
Mas respondendo à questão: houve sempre aqui um contencioso de autonomia. Houve, nos primeiros tempos, movimentos independentistas, a FLAMA foi obviamente um desses movimentos, mas eu acredito na autonomia e não na independência. Não faz sentido nenhum, nós somos um povo que tem obviamente a sua identidade e depois da revolução que foi, não a Revolução do 25 de abril por si só, mas aquilo que ela precipitou - diria que temos aqui duas revoluções, o 25 de abril e a autonomia com a Constituição em 1976 - falta tirar agora o "R". Não estamos no tempo da revolução, mas da evolução desta autonomia, numa maturidade democrática em que nós nos sentimos enquanto portugueses, com direitos, claro, com uma identidade muito própria, reivindicativa, porque a autonomia, para mim, tem de ser sempre colocada em cima da mesa; não nos podemos acomodar com aquilo que temos, mas sim de reivindicar em termos do nosso estatuto político-administrativo o respeito institucional por aquilo que nesta Região se construiu, mas por aquilo também que ainda falta construir neste edifício que é a autonomia.
Como é que olha para o que se está a passar na Catalunha, acha que é minimamente comparável?
Não, não se pode comparar o processo todo da Catalunha com o processo das autonomias regionais, até porque a própria Espanha é completamente distinta daquilo que é Portugal. Portanto, não acho que sejam realidades comparáveis, embora estejamos aqui a falar em autonomia são autonomias completamente diferentes, completamente distintas, com um processo histórico diferente e, portanto, não acho que seja comparável.
Mas há um problema de autonomia na Madeira, ou seja, defende que a autonomia devia ser maior?
A autonomia está em constante construção, não é um processo acabado, é um processo que está em constante evolução, e parece-me que apesar de um período de uma liderança do Dr. Alberto João Jardim de maior afirmação, eu diria musculada, da autonomia, que fez todo o sentido; o contencioso da autonomia no que diz respeito ao Governo central e à República como afirmação fez todo o sentido nesta solidificação e nesta maturidade de que eu falei, aliás considero que não é matéria que esteja encerrada.
O senhor sempre se assumiu próximo do Partido Socialista, apesar de não ser militante, assume-se também como independente, quando olha para a atuação do atual Governo que erros ou lacunas é que lhe identifica?
Eu não sou, como disse e muito bem, filiado, mas considero-me militante do Partido Socialista por assumir os valores e vestir a camisola do PS. O Governo da República atual veio marcar uma outra forma de fazer política no nosso país depois de termos tido o PSD e o CDS a marcarem uma agenda muito clara de, mais do que acertar as contas públicas, um modelo de governação que empobreceu obviamente o país e os portugueses. O que se veio demonstrar foi que há outro modelo em que a parte social tem uma forte componente, sem que essa parte social inviabilize o crescimento do país, o desenvolvimento económico e, hoje em dia, Portugal é, na verdade, um bom exemplo em termos daquilo que se faz por essa Europa fora. Curiosamente, nós pensamos que estamos sempre à margem por estarmos no lado mais ocidental da Europa, estamos agora, na verdade, no centro enquanto exemplo para toda a Europa.
Claro que a governação não é fácil e têm sido muitos os desafios, quer políticos quer económicos. Há um problema que tem de ser resolvido no nosso país, que é um problema de planeamento, que tem décadas, e isso viu-se agora com a questão dos incêndios e da gestão do próprio território; penso que isso é, neste momento, o grande desafio que este Governo tem pela frente.
Do ponto de vista político, não identifica na atuação do Governo nenhuma falha? Estou-me a lembrar, por exemplo, de uma crítica que é feita recorrentemente que é a falta de reformas estruturais.
Não me revejo absolutamente nessa crítica, até porque a grande reforma estrutural deste Governo está a ser feita através da descentralização. Essa é a grande reforma de que este país precisa e isso tem sido feito com toda a coragem por António Costa, até porque também foi autarca e sabe muito bem que se os municípios, se as juntas de freguesia, podem governar melhor, há que dar condições para que isso aconteça. Essa para mim é a grande resposta às reformas estruturais; essa é a grande reforma estrutural de que o nosso país precisa.
O PSD tem uma nova liderança. Acha que Rui Rio pode vir a baralhar as contas políticas de António Costa ou o atual primeiro-ministro não tem nada a temer?
Eu considero que quem está na política e acredita naquilo que faz deve estar preocupado masi consigo do que com os outros. Se o Partido Socialista e António Costa cumprirem aquilo que têm cumprido com todas as dificuldades, com momentos bons e com momentos menos bons, não têm de se preocupar nem com Rui Rio nem com o Partido Social Democrata. Isto não é arrogância política, de maneira nenhuma, acho que devemos respeitar os adversários, conhecê-los mas, acima de tudo, estarmos preocupados com aquilo que é a governação. Há aqui um problema que terá de ser colocado na questão da geringonça: o que farão o PCP e o Bloco de Esquerda daqui para a frente, - essa é uma preocupação, mais do que o PSD - nas opções que cada um desses partidos possa tomar já nas próximas eleições.
Quando diz que há aqui um problema, refere-se ao resultado pós-eleitoral?
Não, refiro-me à gestão de um Governo numa fase em que vamos entrar, uma fase eleitoral. Teremos em 2019 três eleições, as eleições europeias, as legislativas nacionais e as legislativas regionais aqui na Madeira. São três desafios importantes para todos os partidos, neste caso, no que diz respeito às eleições legislativas nacionais começamos a entrar numa fase de linha vermelha, porque começamos a entrar numa fase de campanha que é, obviamente, de definição de posições e de marcação de território. Aí, o António Costa terá de ter a capacidade, nesta fase pré-eleitoral, de conseguir manter estas convergências que tem mantido até agora.
Acha que o Partido Socialista, a nível nacional, tem condições para ganhar as próximas legislativas com maioria absoluta?
Eu considero que esse é um cenário de grande probabilidade; face à governação, face ao sucesso governativo, face também à opinião que nós sentimos na rua das pessoas, considero que essa hipótese pode acontecer. Estou confiante nessa vitória e também acredito que a maioria absoluta pode estar ao alcance do Partido Socialista.
Sendo o senhor militante não filiado do Partido Socialista...
Sim, até porque eu não gosto do termo independente, porque o termo independente parece alguém que está à margem e que não tem nada a ver. Não, eu estou comprometido e estou comprometido também com o Partido Socialista porque lidero aqui no Funchal uma coligação em que o maior partido é o Partido Socialista, portanto revejo-me obviamente no PS, sou militante.
É militante não filiado do Partido Socialista. Gosta mais de ver o PS aliado ao PCP e ao BE ou se preferiria e acharia mais natural que essa aliança do Partido Socialista fosse feita mais ao centro, com o PSD, por exemplo?
Por acaso acho interessantíssimos estes tempos da vida política que nós estamos a viver. Sempre nos habituámos, depois do período revolucionário, a que houvesse uma mistura, o Centrão, em que o PS, eu diria que nos últimos tempos esteve colado ao centro, e partidos à direita também, como o CDS estivessem mais colados ao centro. Sinceramente não gosto muito dos Centrões, prefiro que haja uma clarificação ideológica e um posicionamento dos partidos. Obviamente que prefiro que o PS esteja à esquerda do que esteja no centro, que muitas vezes não é centro, é um centro-direita.
Nos últimos 30 anos o que é que mudou no país para melhor?
Nos últimos 30 anos tem havido uma evolução muito grande no nosso país. Eu diria que a educação tem sido efetivamente o motor na qualificação dos portugueses e naquilo que nós temos de melhor. Não somos um país rico, não temos muitos recursos e a mais-valia são as pessoas, e a educação e a qualificação dos portugueses são o grande avanço dos últimos 30 anos.
E para pior?
Para pior, penso que tivemos a falta de planeamento do nosso país. Foi algo em que, ao longo dos anos, houve um descuido por parte de todos os governos naquilo que é o planeamento do nosso território e essa é a grande lacuna que temos tido.
Nos próximos 30 anos que transformações é que imagina no país?
Este país tem de se virar para o mar. Nós temos estado muito centrados na Europa e eu considero que o mar e a economia do mar serão o grande futuro do nosso país.
E no mundo, o que é que gostava que mudasse?
Eu gostava que houvesse tolerância no mundo. Quando pensamos que há setenta e poucos anos tínhamos todas as convulsões na Europa, parece que foi há muito tempo, mas foi há tão pouco tempo. O que eu gostaria era que houvesse tolerância por parte de quem lidera o país a começar com a tolerância com os nossos vizinhos.
Há algum acontecimento dos últimos 30 anos que se recorde de ter acompanhado pela TSF?
Infelizmente há uma matéria sobre a qual a nível nacional há um desconhecimento: a TSF está aqui há pouco tempo. Curiosamente, este é um dos aspetos da insularidade, seja em termos de canais televisivos, seja em termos de rádios, nós madeirenses - e os açorianos também - estamos sempre limitados no que diz respeito a recebermos informação. Temos sempre os media regionais, mas não nacionais e, portanto, eu não me recordo precisamente por esse motivo.
A TSF, no entanto, é para si um sinónimo de quê?
De informação, de informação credível. Nós vivemos num mundo global onde a informação está ao alcance de um clique e há boa e má informação. Infelizmente a informação, hoje em dia, é produzida por meios sem qualquer credibilidade e é um grande desafio para a comunicação social o afirmar-se com credibilidade na informação que pode transmitir e pode proporcionar a toda a sociedade. E, aqui, a TSF é reconhecidamente uma rádio em que a credibilidade e a informação são verídicas. Na política não há nada como termos confiança nos políticos, e na informação também, não há nada como termos confiança em quem nos dá as notícias.