Mário Soares: o Presidente "incapaz de fingir um gosto" e adepto de power naps que o dotavam de um "discurso agregador"
O nascimento do ex-líder do PS será assinalado esta sexta-feira no Parlamento. Margarida Pinto Correia revela, na TSF, que Soares "gostava de ser questionado com perspicácia" e "não tinha pudor em dizer o que pensava"
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No ano em que se comemora o centenário do nascimento do antigo Presidente da República Mário Soares, a mandatária para a Juventude na candidatura do socialista às eleições de 1991, Margarida Pinto Correia, lembra o homem adepto de "power naps" (uma sesta rápida), capaz de discursos "agregadores".
O ex-líder do PS nasceu em 7 de dezembro de 1924, uma data que será assinalada esta sexta-feira (6 de dezembro) com uma sessão solene na Assembleia da República, além de um vasto programa que irá estender-se até ao final de 2025, com várias iniciativas espalhadas pelo país. Na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, será feita este sábado uma cerimónia de apresentação do III volume da Coleção Obras de Mário Soares - "Escritos da Resistência".
Em declarações à TSF, Margarida Pinto Correia fala num homem "muito afável e nada distraído em relação às pessoas", embora nem sempre o "parecesse".
"Mário Soares, para o bem e para o mal, tinha uma opinião sobre as pessoas e era, não sei se muito certeiro, mas muito sarcástico e específico sobre o que as pessoas eram. Caraterizava-as com alguma facilidade", destaca.
O fundador do PS, assume, "gostava de ser questionado com perspicácia" e não se "coibia de filosofar sobre a vida, a política e a situação atual de todos os países".
"Se o questionassem com leviandade, ele desprezava-as e esmigalhava-as, porque não tinha pudor em dizer o que pensava", conta.
Margarida Pinto Correia admite que, tal como o cargo exigia, Soares "fazia jogos políticos", mas mantinha a "transparência" na forma como tratava as pessoas, pelo que era "incapaz de fingir um gosto que não tivesse".
"Foi autor de uma expressão que até hoje eu uso muitas vezes e que me pareceu deliciosa na altura, porque muito certeira, que foi 'O seu pai era daqueles peixinhos vermelhos em água benta', porque pertencia a um grupo grande de católicos que tinha sido muito ativo no pré-25 de Abril. Era católico de esquerda e isso levantava-lhe diversas questões", revela.
A então mandatária para a Juventude destapa ainda uma faceta menos conhecida do homem que passou vários anos na estrada em campanha: "Andávamos no carro a percorrer o país por todas as estradas possíveis e o dr. Mário Soares dormia com muita facilidade e fazia uma power nap. Os cinco minutos em que ele dormia eram ótimos porque acordava como novo."
Margarida Pinto Correia confessa que, no início, "ficava estarrecida", com receio de que Soares, depois disto, apenas fosse capaz de "balbuciar" discursos. Mas a realidade não era bem essa.
"Ele discursava numa terriola qualquer, entrava no carro, falava um bocadinho e dizia 'Pronto, agora vou descansar' e adormecia profundamente", aponta, acrescentando que, quando chegava ao destino pretendido, 20 ou cem km à frente, Mário Soares mostrava-se detentor de um "discurso inflamado", para surpresa de todos.
"Obviamente que se teria preparado nos dias antes, mas naquele momento, ele saía do nada e fazia um discurso extraordinário que agregava as pessoas à volta dele", recorda.
Mário Soares foi uma das principais figuras da resistência ao regime do Estado Novo, primeiro-ministro de três Governos constitucionais (1976/1978, 1978 e 1983/1985) e chefe de Estado entre 1986 e 1996.
