"São Jorge". O filme que sensibilizou Costa para os problemas do bairro da Jamaica
António Costa voltou a visitar o bairro que o deixou "chocado" quando assistiu ao filme de realizador Marco Martins. Depois do choque com a ficção, o choque com a realidade.
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Pode dizer-se que é um dos casos em que a arte, neste caso, o cinema, acabou por influenciar o poder político. No dia em que o primeiro-ministro, António Costa, visitou o bairro Vale de Chícharos, - mais conhecido por bairro da Jamaica - no concelho do Seixal, confessou que foi um filme que lhe chamou a atenção para a falta de condições das mulheres, homens e crianças do bairro.
"São Jorge", do realizador Marco Martins
, estreou em 2016 e retrata, além de um olhar global sobre crise portuguesa, a vida dura nos bairros da margem sul do Tejo. Parte do filme foi mesmo filmada no bairro da Jamaica - mas também, por exemplo, no bairro da Belavista -, onde a realidade vivida pelos habitantes não passou despercebida ao primeiro-ministro.
"Assisti à primeira projeção do filme 'São Jorge', do Marco Martins, e fiquei surpreendido e chocado", confessou, no Seixal, António Costa, numa cerimónia simbólica de entrega de uma chave de um imóvel a uma antiga moradora do bairro que começa agora a ser demolido.
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Depois do choque com a ficção, deu-se o choque com a realidade. "Poucos dias depois, vim visitar o Alfeite e aproveitei para procurar o bairro Jamaica, que era sinalizado no filme, e percebi que a realidade era mais dramática do que a ficção que o filme contava. Na altura, enviei logo uma mensagem ao ministro do Ambiente", prosseguiu António Costa, numa sessão em que, além de ex-moradores e representantes da autarquia, marcou presença o ministro do Ambiente e Transição Energética, João Pedro Matos Fernandes, que confirmou.
"A primeira aproximação que tive ao problema do bairro de Vale de Chícharos foi com uma mensagem enviada pelo primeiro-ministro, António Costa, que me disse ´vá ver o São Jorge'. E eu fui", conta o governante.
Esta sexta-feira, e depois de bater de frente contra a realidade, António Costa encontrou, no bairro, quem com ele assistiu ao filme de Marco Martins, do lado de lá do Tejo, no Cinema São Jorge, em Lisboa. Maria Francisca, de 60 anos. Os últimos 23 no lote 10 do Jamaica. "Já estive consigo no São Jorge, senhor primeiro-ministro", disse a António Costa, que respondeu: "Eu sei, olhe, foi aí que começou".
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No bairro da Jamaica, com o primeiro-ministro, esteve também o realizador Marco Martins, que explica a importância da arte como um holofote apontado aos mais frágeis e aos problemas das periferias. "O primeiro-ministro esteve na estreia e ficou muito impressionado com uma realidade que desconhecia. Ver que passados estes anos o problema se está a resolver deixa-me muito comovido", diz à TSF o realizador de "São Jorge".
"Ultimamente os filmes também têm esse objetivo, criar um foco e apontar uma luz para uma realidade que é desconhecida, ou que não é, mas que é como se fosse", acrescenta Marco Martins, que fala ainda de um bairro que tem sido mal compreendido pela sociedade: "Muitas vezes estes bairros estão conotados com uma certa marginalidade e o que encontrei era uma realidade completamente distinta, de famílias que trabalhavam e passavam dificuldades. E receberam-me muito bem".
O realizador conta ainda que a rodagem do filme fica na memória de todos os que fizeram parte de "São Jorge". "Foi uma experiência que nos marcou a todos, os atores reconheceram a importância do filme".
Terminada a primeira fase de realojamento de dezenas de moradores que há vários anos habitavam os prédios precários, o bairro da Jamaica já começou a ser demolido. É o princípio do fim para o bairro que deve desaparecer por completo, o mais tardar, em 2022.