Na véspera de terminar a "era Cavaco Silva", com o Presidente a entregar as chaves de Belém a Marcelo Rebelo de Sousa, a TSF foi falar com quem se sentou no Conselho de Ministros entre 1985 e 1995.
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Uma década como primeiro-ministro, outra como Presidente. Quatro eleições com mais de 50% dos votos. Esta semana chega ao fim a era Cavaco Silva, o político mais experiente do Portugal democrático (...e que sempre fez caminho olhando para a política como algo de menor). A TSF escutou a opinião de antigos companheiros de governo, num olhar sobre duas décadas bem diferentes do país, e para um político em circunstâncias muito diferentes, do Palácio de São Bento ao Palácio de Belém.
1985-1995 foi uma década de desenvolvimento, concordam todos. Marques Mendes, Silva Peneda, Braga de Macedo, Eduardo Catroga, Valente de Oliveira, Ferreira do Amaral e Faria de Oliveira, falam de dez anos de crescimento económico alimentado a fundos comunitários, esperança e níveis de consumo que os portugueses desconheciam, e uma definitiva abertura da economia pós-revolução, com as privatizações e a liberalização da comunicação social. A modernização do sistema financeiro, a reforma fiscal, ou o fim da reforma agrária, são outras das marcas identificadas por alguns dos antigos ministros de Cavaco Silva.
Todos falam de um homem decidido no comando do Conselho de Ministros, com pouca paciência para negociar ou para mudar de rumo. Um Primeiro-ministro que teve ventos favoráveis, mas que chegou a Belém num tempo de viragem e de crise. É dessa forma que explicam a outra década - 2006-2016 -, e a curva descendente dos índices de popularidade de Cavaco Silva. É o primeiro presidente que termina o segundo mandato com níveis de popularidade claramente negativos. Os antigos ministros lembram as agruras dos tempos da troika, a exigência das crises - financeira, social, e política -, e ainda um perfil de presidente - austero, institucional, e pouco dado a emoções e afetos - que talvez não tenha sido o que o país precisava nos últimos anos.
Marques Mendes
Marques Mendes acompanhou Cavaco Silva nos três governos, entre 1985 e 1995, primeiro como secretário de Estado Adjunto do primeiro-ministro e dos Assuntos Parlamentares, depois como secretário de estado da Presidência do Conselho e Ministros, e por fim, entre 91 e 95, como ministro-adjunto.
O antigo líder do PSD - Conselheiro de Estado de Cavaco e de Marcelo -, fala de um antes e um depois de Cavaco Silva primeiro-ministro.
E como se explica que um político que venceu quatro eleições com mais de 50% chegue agora, ao fim da carreira, com níveis de popularidade historicamente baixos, quando comparados com os anteriores presidentes?
Eduardo Catroga
Eduardo Catroga, ministro das Finanças de Cavaco Silva entre 1993 e 95, no final da segunda maioria absoluta, elogia o legado de Aníbal Cavaco Silva e diz acreditar que, apesar da crise e do clima negativo que se instalou na sociedade portuguesa, a história acabará por perceber que foi um grande Presidente da República.
Eduardo Catroga considera que, enquanto Presidente da República, Cavaco Silva foi também vítima de muitos preconceitos dos opositores, "uma certa classe intelectual e política", por ter sido o melhor primeiro-ministro de todos os tempos.
Conclui o antigo ministro que Cavaco Silva foi vítima do clima negativo que se instalou na sociedade.
Braga de Macedo
Amigo e colega de Cavaco Silva na universidade há quase 40 anos, Jorge Braga de Macedo foi também desafiado para a política pelo ainda presidente da República. O economista foi ministro das Finanças de Cavaco desde outubro de 1991 até final de 1993.
Para Braga de Macedo teria sido pior se Portugal não tivesse tido um chefe de Estado com os conhecimentos que Cavaco Silva tem, até porque de forma discreta ele tentou sempre influenciar os primeiros-ministros.
Silva Peneda
José Silva Peneda atravessou as duas maiorias absolutas de Cavaco Silva - esteve nos dois governos sempre com a pasta do Emprego e Segurança Social.
O antigo presidente do CES e atual conselheiro de Junker na Comissão Europeia considera que não é possível dissociar os 10 anos em Belém da personalidade de Cavaco Silva como um agente da política portuguesa que marcou muito os 40 anos da Democracia.
Silva Peneda recorda um dos momentos que testemunhou enquanto presidente do CES, com o Presidente da República a ser decisivo no último acordo de concertação social, já com a troika em Portugal.
Ferreira do Amaral
Ferreira do Amaral, antigo ministro dos dois governos liderados por Cavaco Silva, considera que há uma característica determinante no ainda presidente da República e que marcou os dez anos de Cavaco em Belém - o facto de ter encarado o cargo de uma forma muito institucional.
Para o antigo ministro das Obras Públicas, a força dessa marca de Cavaco Silva foi também o que acabou por determinar o que lhe correu pior.
Ferreira do Amaral acredita, por isso, que a interpretação do cargo de Presidente da República terá depois de Cavaco um novo enquadramento.
Valente de Oliveira
Valente de Oliveira é o ministro que mais tempo serviu em governos de Cavaco Silva. Durante 10 anos, entre 1985 e 1995, foi responsável pela pasta do planeamento e da administração do território.
Sobre o futuro, Valente de Oliveira acredita que Cavaco Silva "continuará a ter" uma disponibilidade constante para servir o país e que a História lhe fará justiça.
Faria de Oliveira
Fernando Faria de Oliveira, presidente da Associação Portuguesa de Bancos e titular da pasta do Comércio e Turismo de dois governo de Cavaco Silva (XI e XII governos constitucionais) divide a análise em dois momentos: Cavaco Silva enquanto primeiro-ministro e Cavaco Silva enquanto chefe de Estado.
Quanto aos dois mandatos na presidência, o antigo dirigente nacional do PSD considera que foram bastante diferentes.
Em 2014, Fernando Faria de Oliveira recebeu das mãos de Cavaco Silva a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique.