Passos: "É essa a revolta que sinto. Estão alegremente a levar o país para pior"
Líder do PSD acusa Costa e de fragilizar a banca só para atacar o anterior Governo. E de adiar problemas como quem espera eleições em breve. E alerta que a banca italiana e BCE são riscos "elevados".
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Passos Coelho diz sentir "revolta". Revolta com a forma como diz que o António Costa está a conduzir o país. "Essa é a revolta que sinto, por saber que este processo está a decorrer de forma consciente por parte das autoridades. As pessoas sabem que estão a agravar as perspetivas de futuro do país, mas estão alegremente a conduzir o país para uma situação pior apenas para poderem dizer que o passado foi pior do que as pessoas julgavam, para desqualificar os adversários e para poder - demagogicamente - atrair votos".
Em entrevista à TSF e DN, o líder do PSD fala sobre a CGD - e a situação da banca -, também sobre os perigos que vê no Orçamento. Fala do seu Governo, mas também deste, que diz estar a arriscar colocar Portugal em situação "muito perigosa". Aqui segue uma síntese - e aqui fica a versão integral, para ouvir.
Banca: o que Passos diz que não podia fazer...
"Em 2011 o sistema financeiro estava à beira da insolvência, agora não está. Tem problemas, como o país."
"Tivemos um envelope financeiro de 12 mil milhões. Havia na banca quem achasse que devíamos criar um bad bank. Essa opção não foi seguida porque o BdP dizia que exigia 40 a 50 mil milhões de euros, para garantir a limpeza dos balanços."
"Nestes quatro anos, os bancos limparam mais de 20 mil milhões de euros - mais de 5 mil milhões a CGD. E melhoraram a sua situação, não pioraram."
"Se no dia em que tomei posse entendesse que precisávamos de 40 mil milhões isso obrigava a segundo programa. Sendo certo que essas opções tinham sido consideradas pelo anterior Governo e tinham sido descartadas - e foram, por vontade das instituições. A troika tinha duas preocupações: não emprestar um volume que colocasse a sustentabilidade da dívida; e a preocupação de deixar os incentivos para que alguma coisa mudasse; e teríamos dado a impressão ao mundo de que estávamos como a Grécia. Essa opção, portanto, não existia."
"A injeção de capital nos bancos faz-se de acordo com o que os acionistas entendem ser a sua capacidade de pagar. Por mais dinheiro nos bancos tornava muito difícil que os bancos conseguissem remunerar os juros desse empréstimo. Praticamente o que estaríamos a fazer era criar condições para os nacionalizar, porque não teriam capacidade de remunerar de retomar o controlo acionista. Não quisemos ficar com os bancos no colo."
... E o que acusa Costa de fazer (à CGD e aos bancos)
"Tenho ouvido uma retórica do Governo que é incendiária em relação ao sistema financeiro e que só procura criar a convicção de que o Governo herdou uma situação caótica na banca que impede hoje o país de crescer e o Governo de fazer o que queria."
"A CGD tem até meados de 2017 para devolver os Cocos ao Estado, capital que o Estado emprestou. Não está em incumprimento. O banco foi alertando que teria dificuldade com o seu modelo de negócio de fazer o reembolso. Precisa de vender ativos, de melhorar o seu desempenho, isso estava a revelar-se difícil. Eu disse que me preocupava com essa dificuldade. Mas entendia que a CGD tinha ainda à mão possibilidades que o permitiriam realizar - na área internacional e mercado doméstico. Claro que tem um problema de rentabilidade, também devido à política do BCE - que está a acontecer sobre todos os bancos."
"A CGD tem um acionista, o Estado terá de resolver o problema. Se fosse PM estaria a fazer o necessário para recapitalizar. Mas não estaria a fazer, de forma perigosa e inaceitável, o que o ministro das Finanças fez: dizer que havia um desvio de 3 mil milhões. Está a induzir as pessoas em erro. Não existe um buraco na CGD, não é sério. Em vez de desmentir as necessidades que têm sido noticiadas - mais de cinco mil milhões, que não são verdadeiras e será menos de metade -, está a lançar uma suspeita sobre a CGD e sobre o resto dos bancos portugueses. E isso vai estourar-lhe nas mãos".
"Com esta abordagem de dar a entender que receberam um país em circunstâncias horríveis, para andarem a denegrir o que fez o Governo anterior, estão a semear condições para tornar o sistema financeiro ainda mais vulnerável. E isso pode ter consequências desastrosas."
"Todo o mundo financeiro está à espera de ver o que acontece aos bancos italianos. Que têm um problema de capital e de rentabilidade. E como o Governo italiano não há semana em que não venha dizer que tem este problema, acho que o problema se vai agravar consideravelmente. E vai ter que tomar decisão sobre se vai fazer uma recapitalização pública."
"Há uma diferença da Itália para nós: é que a Itália tem dinheiro para meter nos bancos e nós não temos. Se houver um contágio, nós temos que pedir dinheiro para meter nos bancos porque não o temos, é tão simples como isso. [Há risco de 2º resgate?] Estou a dizer que há riscos muito sérios que se estão a correr com estas políticas."
Orçamento: em teoria, as vacas voam
"Espero que tenha razão e que o défice fique abaixo dos 3%. Mas cada vez menos acredito nesse resultado. As pressões orçamentais são muito grandes. O Governo está a funcionar com menos dinheiro para investimento (este cortou tudo no investimento público). A despesa de funcionamento tem menos dinheiro."
"Despesa está a ser adiada, chutada para a frente. Não se trata de maquilhar, é recorrer a expedientes. Os números estão lá, vemos as dívidas do SNS a crescer 70 milhões num mês. É voltar à velha prática. Por outro lado existe uma opção clara do Governo de deixar para o segundo semestre o impacto de medidas tomadas - 35 horas, IVA restauração, aumento salários. Associado ao ritmo de crescimento resultará na dificuldade de fazer o encaixe de impostos necessário. As receitas vão ficar muito aquém".
"O risco que estamos a correr é o défice de ficar acima dos 3%. E quando ouço o ministro das Finanças e o primeiro-ministro dizerem que não, parece conversa de pura demagogia política de quem está à espera de eleiçõezinhas daqui a uns meses e quer chegar lá em boas condições."
"[Poderá estar errado nesse julgamento?] Em teoria sim, mas em teoria - como o dr. António Costa comprovou - as vacas voam."
[Há risco de BCE esgotar o programa de compra de dívida portuguesa?] "Há seguramente o risco e ela está muito próxima de ser esgotada - muito antes do fim do ano. O BCE pode rever esses limites e aumentá-los outra vez. Se isso não acontecer podemos estar a emitir dívida pública que o BCE não está disponível para comprar. Isso teria consequências muito graves."
"Desgosta-me. Revolta-me"
"Não sou de virar a cara, nem de ter flutuações de humor. Nós temos um caso difícil no país e de probabilidade de sucesso modesta. Mas valia a pena lutar por ela. Este Governo está a transformar um caso de probabilidade de sucesso difícil numa probabilidade de fracasso elevada. E isso a mim desgosta-me, porque fizemos muito para colocar o país no campeonato de países desenvolvidos. E há um momento em que o país terá futuro noutro campeonato.
"Mobilizando o país contra um inimigo externo, dizendo que o Pacto de Estabilidade impede o país de crescer. Imagine: um homem que se candidatou dizendo que nos pinha a crescer 2,4%, agora não consegue por causa do Pacto Orçamental. O que nos impede de crescer é a nossa dívida."
"Prefiro que Portugal cumpra as obrigações, não nos importamos de fazer sacrifícios, mas para melhorar. Agora, fazer sacrifícios para piorar é que não faz sentido nenhum. E essa é a revolta, a revolta que sinto por saber que este processo está a decorrer de forma consciente por parte das autoridades. As pessoas sabem que estão a agravar as perspetivas de futuro do país, mas estão alegremente a conduzir o país para uma situação pior, apenas para poderem dizer que o passado foi pior do que as pessoas julgavam, para desqualificar os adversários e para poder -demagogicamente - atrair votos."