Paulo Raimundo acusa PS de "cumplicidade" com Governo e denuncia "ofensiva anticomunista"
O líder dos comunistas alerta que "não se dá combate às forças reacionárias alimentando as suas conceções e aplicando, a pretexto do seu combate, a política que projeta". Raimundo defende ainda que é "urgente dar uma oportunidade à paz" e a acusa a NATO de ser o "braço armado do imperialismo"
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O secretário-geral do PCP criticou esta sexta-feira as "cumplicidades" do PS com a política do Governo e considerou que, no atual momento nacional, não se pode "ficar em cima do muro". Paulo Raimundo defendeu igualmente que está em curso uma ofensiva anticomunista e uma campanha de desinformação à escala global, e atacou a NATO, a União Europeia e o "genocídio" de Israel contra o povo palestiniano.
No discurso de abertura no 22.º Congresso do PCP, em Almada, Paulo Raimundo criticou o Orçamento do Estado para 2025, viabilizado com a abstenção do PS, defendendo que "é mais uma peça" dos "interesses do grande capital" e inclui "novas tentativas de ataques aos direitos dos trabalhadores".
Paulo Raimundo considerou que o Orçamento do Estado "empobrece a vida aos pobres e enriquece a vida aos ricos", criticando em particular a redução do IRC em 1 ponto percentual, por considerar que vai dar "mais 400 milhões de euros direitinhos aos grupos económicos, esses tais que já hoje encaixam 32 milhões de euros de lucro por dia".
"Não surpreende que PSD e CDS, com Chega e Iniciativa Liberal (IL), assumam por inteiro os interesses dos que se acham donos disto tudo. Ainda que, sem surpresa, não se pode deixar de registar a opção do PS que, por maiores que sejam agora as suas proclamações, não conseguem disfarçar, nem muito menos apagar, as cumplicidades com as medidas aprovadas", afirmou.
Paulo Raimundo salientou que "o PSD e o CDS tiveram o Orçamento aprovado, o PS criou-lhes as condições para isso e ainda libertou e o Chega e a IL de ter de votar a favor", acrescentando que "todos, e perante as fabricadas discordâncias, são cúmplices da política que está em curso e desta política errada".
"Perante esta teia de cumplicidades, o PCP assume-se como a verdadeira força de oposição, resistência e de alternativa à política de direita. Um caminho que exige o combate ao avanço das conceções, objetivos e forças reacionárias que, apresentadas como antissistema, são o pior que o sistema produz", afirmou.
Para Paulo Raimundo, esse combate a forças reacionárias "obriga à rutura da política de direita, essa que é a causa funda que abre espaço e alimenta essas mesmas forças".
"Não se dá combate às forças reacionárias alimentando as suas conceções e aplicando, a pretexto do seu combate, a política que projeta", frisou.
O secretário-geral do PCP avisou que "a evolução do país nos tempos mais próximos dependerá do desfecho do confronto entre os que querem concluir o processo contrarrevolucionário e as forças que, ancoradas em Abril e na Constituição, lhes fazem frente e resistem".
"Um embate e um confronto que não se compadece nem admite que se fique em cima do muro. Que se fale de esquerda e se apoie a política de direita, que se fale nos direitos dos trabalhadores e se entregue de mão beijada benefícios para o grande capital, que se fale do superior interesse nacional, para a seguir se entregue mais uma empresa ao estrangeiro, mais uma parcela de soberania", afirmou, numa alusão ao PS.
Para Paulo Raimundo, "a situação nacional reclama iniciativa política, com propósitos e objetivos claros e sem hesitações para dar combate decidido à política de direita".
"As ameaças da direita exigem, e exigirão no futuro ainda mais, um PCP ainda mais forte e mais influente", referiu.
Raimundo sublinhou ainda que os tempos de hoje exigem "a convergência de diversas forças" e uma "nova ordem internacional de paz", disparando críticas à conduta da NATO nos mais diversos conflitos atuais, tanto no Médio Oriente, como na Europa, acusando a organização de ser "o braço armado do imperialismo". Perante aquilo que apelida de uma "ofensiva" anticomunista, pretende-se "legitimar a escalada do militarismo, as sanções, os bombardeamentos, as ingerências, os golpes e calar quem luta pela paz".
"Parem a guerra. Parem a morte. Parem o sofrimento. Parem de empurrar a humanidade para o abismo. É urgente dar uma oportunidade à paz", apelou, afirmando que a luta pelo fim dos conflitos é também uma luta pela democracia.
O líder dos comunistas garantiu assim que o partido não se calará "perante o genocídio de palestinianos às mãos de Israel" e vincou que "a Palestina não está sozinha e vencerá". Estas afirmações valeram-lhe uma ovação, em que se entoou "Palestina vencerá". Esclareceu, por isso, que o congresso do PCP também serve para dizer aos jovens que estes "não serão carne para canhão".
"Querem calar a voz da paz, mas enganem-se. Aqui estamos e aqui estaremos para denunciar todos os responsáveis e cúmplices desta escalada que, para muitos, não tem fim", assumiu.
Paulo Raimundo defendeu que a "ofensiva ideológica" sempre esteve presente, mas entende que a grande diferença nos dias de hoje é "a sua dimensão, meios e instrumentos ao seu serviço". Criticou por isso o "caminho de fomento do militarismo, com um perigo de conflito mundial, que a não ser travada, pode gerar consequências catastróficas".
"Intensificam-se à escala global os mecanismos de condicionamento ideológicos, ancorados em grandes grupos económicos, que condicionam meios de comunicação e as redes digitais, e procuram impor um pensamento único e iludir com a natureza do capitalismo. Querem ocultar a exploração dos trabalhadores e a destruição da guerra. Querem atrasar a luta dos povos e liquidar direitos. Querem calar quem luta pela paz. Rescrever a história, incluindo a da história portuguesa", alertou.
Na sua análise à atual conjuntura mundial, Paulo Raimundo referiu-se também por uma vez à guerra na Ucrânia.
"Os últimos anos são reveladores da violenta ofensiva do imperialismo, com a sua escalada de confrontação e guerra, como vemos no Médio Oriente, na Palestina, no Líbano e na Síria, na Europa, nomeadamente na Ucrânia, na Ásia-Pacífico e noutras partes do mundo. Um caminho de fomento do militarismo, de crescentes ameaças à paz, com o perigo de um conflito mundial que, a não ser travado, poderá assumir catastróficas proporções", disse.
E foi neste contexto que introduziu as suas duras críticas à Aliança Atlântica e aos Estados Unidos, sustentando que a "expressão concreta" da escalada é em si mesmo a NATO, "com a sua ação belicista, o seu sucessivo alargamento, a sua intervenção de âmbito global".
"Representando hoje mais de metade das despesas militares no plano mundial, a NATO é o braço armado do imperialismo e o seu mais perigoso instrumento na ofensiva em curso. Uma ofensiva que é liderada pelo imperialismo norte-americano e cujo objetivo de imposição da supremacia dos interesses dos Estados Unidos não se alterará com a nova administração Trump", afirmou - uma referência à sua ideia de continuidade na administração de Washington.
A seguir, Paulo Raimundo associou a União Europeia à NATO, advogando que é "cada vez mais evidente o seu caminho militarista". Em contraponto, destacou a China e outros países de economias emergentes: "Um processo de rearrumação de forças em que a China assume um papel destacado e onde participam outros países em desenvolvimento com um crescente peso económico e político, que procuram convergir, num quadro muito heterogéneo, na resistência ao domínio do imperialismo".
O líder do PCP acredita assim que estes são "tempos de desinformação e censura promovidos à escala global" e entende que "ignorar esta ofensiva seria não apenas ingénuo, mas perigoso" para a luta que está a ser travada.
Fazendo uma reflexão sobre o partido, Raimundo reconheceu que "cada um tem não só o direito mas também o dever de dar a sua reflexão" e disse que os comunistas foram chamados a "identificar questões, problemas e caminhos para entender e intervir na realidade concreta". Falou ainda na realização de mais de 900 reuniões, que envolveram mais de 14 mil membros do partido para afirmar que a preparação do congresso foi "aquilo que o povo precisava que fosse: debate, intervenção, luta e projeto".
"Olhamos para a vida e a sua evolução a partir dos interesses da classe dos trabalhadores e do povo, dos explorados e oprimidos. Aqui não assimilamos. Pelo contrário. Damos combate aos interesse e à ideologia e objetivos do capital. Assumimos a nossa visão patriótica e os nossos deveres nacionalistas. Queremos transformar a sociedade, romper com as injustiças e desigualdades, abrir caminho para uma alternativa para o país. Queremos a paz e a democracia. Queremos os valores de Abril no futuro de Portugal", apontou.
Denunciou ainda a "natureza opressiva do capitalismo", argumentando que, nos últimos anos, as cinco pessoas mais ricas do mundo "duplicaram a sua riqueza, condenando milhões de pessoas à miséria" e lamentou um "sistema que ataca a democracia e promove a guerra".
Os trabalhos do 22.º Congresso do PCP começaram precisamente às 10h30, como estava agendado, com os delegados a entoarem "A Internacional", tendo posteriormente aprovado várias propostas de funcionamento do Congresso, como o seu regulamento, a sua presidência e os seus órgãos.
