Polícias querem TC e partidos a discutir direito "elementar" à greve, constitucionalista diz não haver "condição para alterar preceito legal"
Ouvidos no Fórum TSF, vários sindicatos policiais defendem que, tal como aconteceu com a "criação dos sindicados, mais cedo ou mais tarde", também a greve "vai ser algo que os profissionais da PSP, até porque são funcionários civis do Estado português - não são militares -, vão ter direito"
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O presidente da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP/PSP), Paulo Santos, garante que não vai desistir do direito à greve para este setor profissional e avança que vai "iniciar diligências" junto do Tribunal Constitucional e dos partidos políticos para discutir o tema. O constitucionalista Jorge Reis Novais entende, por outro lado, que "não haverá absolutamente condição nenhuma para que este preceito legal venha a ser alterado".
"Por exemplo, pedir ao Tribunal Constitucional que se pronuncie sobre a inconstitucionalidade de um barramento que não está proibido na própria Constituição. Obviamente, vamos fazer essas diligências, junto do nosso gabinete jurídico, vamos também envolver os partidos políticos para aproveitar esta ocasião", afirma Paulo Santos, no Fórum TSF, completando que esta tem sido a posição defendida pela estrutura sindical "há muitos anos".
O líder sindical considera ainda que, numa democracia, "um setor de profissionais, que são cidadãos uniformizados, não deve ter um direito elementar barrado", argumentando que esta questão não é "jurídica ou Constitucional, mas sim com uma questão política que tarda em ter a liberdade consagrada naquilo que é a sua interpretação".
Quem partilha da mesma opinião é Armando Ferreira, presidente do Sindicato Nacional da Polícia, que acredita que, tal como aconteceu com a "criação dos sindicatos, mais cedo ou mais tarde", também a greve "vai ser algo que os profissionais da PSP, até porque são funcionários civis do Estado português - não são militares -, vão ter direito".
Armando Ferreira sublinha, contudo, que este direito será "balizado por regras e pelo princípio de que a segurança pública nunca pode ser posta em causa".
O Governo deu um passo atrás e afinal já não vai debater o direito à greve das forças policiais. Margarida Blasco afirmou aos jornalistas, no domingo à tarde, que seria uma questão em cima da mesa. Horas depois, em comunicado, o Governo esclareceu que qualquer interpretação “não pode vincular o Ministério da Administração Interna que tudo tem feito cumprir o programa do Governo”. Na nota, o Executivo acrescenta que o direito à greve não vai ser discutido e que na agenda de trabalhos está apenas a representação laboral e os direitos sindicais.
Paulo Santos contrapõe e diz não quer perder a chama que se levantou e promete reforçar essa luta, esperando agora que todo o Governo seja "sensível" aos problemas dos polícias, tal como a ministra provou ser.
"Eu crio que a ministra não responde por si, responde por um Governo. Por isso, a apreciação que fazemos - e sabendo bem aquilo que são as limitações e o funcionamento dos Governos -, quero admitir que a ministra não será o fator de ruído para aquilo que são as nossas negociações. Queremos é que o Governo dê suporte financeiro, orçamental e político à ministra, que está sensível para resolver os problemas dos polícias e é isso que nós queremos", assume.
A ASPP entende, por isso, que o comunicado do Executivo é "uma desautorização" de Luís Montenegro perante Margarida Blasco, mas adianta que não cabe à estrutura sindical "fazer qualquer consideração daquilo que é o funcionamento e orgânica do Governo". Ainda assim, Paulo Santos confessa que "já começam a existir mais vozes para aquilo que está em discussão" e quer perceber se o primeiro-ministro "continuará fechado a esta matéria, discussão e reflexão que a ASPP fez há muitos anos e que parece que mais cedo ou mais tarde vai ser uma realidade efetiva".
Já o presidente do Sindicato Nacional de Oficiais de Polícia, Bruno Pereira, vai mais longe e, apesar de manter a confiança em Margarida Blasco, afirma que este episódio "fragiliza a posição da ministra" e não contribui para a "consistência que deve existir, por parte de quem assume essas funções, sendo elas particularmente difíceis, numa área que todos os dias é chamada à coação nos mais diversos assuntos do Estado".
Bruno Pereira espera, por isso, que este tenha sido um "caso sem repetição", lamentando que não tenha havido "um melhor acerto entre aquilo que é a posição do Governo e a posição da ministra".
Segundo o Decreto-Lei n.º 392/74, ARTIGO 3.º, não é permitida a greve às forças militares e militarizadas, aos magistrados judiciais, às forças policiais e guardas prisionais e aos bombeiros. Os motivos prendem-se com o facto de os serviços prestados pelos militares e forças militarizadas estarem diretamente ligados à soberania, pelo que se confundem com funções típicas do Estado.
Jorge Reis Novais, constitucionalista e professor na faculdade de direito da Universidade de Coimbra, sublinha, no Fórum TSF, que a restrição do direito à greve dos polícias está na Constituição, pelo que, mudar a lei não é uma função ao alcance do Governo, mas antes do Parlamento.
"A Constituição permite que o direito à greve das forças policiais seja restringido por lei e foi isso que a lei fez: a lei proibiu o exercício do direito à greve", explica.
Para Jorge Reis Novais, a questão que agora se levanta tem origem "numa gafe da ministra da Administração Interna": "Até porque não é uma questão que seja da responsabilidade do Governo. É uma questão da Assembleia da República. Só a Assembleia da República pode legislar sobre esta matéria e com uma maioria qualificada de 2/3."
O constitucionalista aponta, por isso, que, nos termos "daquilo que é o normal, lógico e previsível, não haverá absolutamente condição nenhuma para que este preceito legal venha a ser alterado, isto é, que os polícias venham a ter direito à greve".
