Rangel e o partido "do meio", esquerda fala em "miseráveis", Ventura e o "fora de jogo", Carneiro não é assessor e Leitão quer cortar. Rejeição chumbada
Sem surpresa, após a discussão do programa do Governo, o Parlamento chumbou a moção de rejeição do PCP, abrindo caminho para o Executivo assumir em pleno a governação
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O primeiro-ministro sublinhou hoje que o Governo sai do Parlamento legitimado, depois da discussão do programa, e concentrado em resolver problemas das pessoas e crescer economicamente, esperando colaboração da Assembleia da República.
Em breves declarações aos jornalistas no Parlamento, depois de discutido o programa do Governo e chumbada a moção de rejeição apresentada pelo PCP, o primeiro-ministro, Luís Montenegro, afirmou que o Executivo sai “legitimado e investido pelo Parlamento” e “agora cumpre-lhe executar o seu programa”.
“É isso que nós vamos fazer, concentrar-nos na resolução dos problemas que afetam a vida das pessoas, projetando a qualidade de vida de cada uma e projetando o crescimento da nossa economia para criarmos mais riqueza e podermos ter mais justiça social”, acrescentou.
Para isso, disse, o Governo conta com “o apoio que foi dado nas eleições” e também “com a colaboração da Assembleia da República e de todos os representantes do povo”.
“Foi isso que também resultou da discussão no programa de Governo”, concluiu.
Toma agora a palavra o ministro do Estado e dos Negócios Estrangeiros, que vai encerrar o debate do programa do Governo. Paulo Rangel começa por lembrar que em pelo período pré-eleitoral, a 28 de abril, Portugal experimentou um acontecimento disruptivo: o apagão, que causou um impacto generalizado e decorreu de um choque externo. Explica que menciona este caso para sublinhar que nos últimos meses o país experimentou também um "apagão político" durante a votação da moção de rejeição ao Governo, que fez cair o XXIV Executivo, contra a "manifesta vontade do eleitorado". Tal só pode ser superado por um "reset", que foram as eleições de 18 de maio.
"Com uma maioria maior e a confiança inequívoca dos portugueses, este Governo, este primeiro-ministro apresentam-se aqui com um novo ímpeto, um fôlego e garra num verdadeiro recomeço para transformar Portugal", atira.
Garante ainda que as eleições tornaram os sociais-democratas "mais fortes" e reconhece que "Portugal não pode esperar".
Rangel pede que os líderes da oposição cumpram a "palavra" de que irão cooperar democraticamente com o novo Executivo. Dirige-se especificamente aos dois maiores partidos da oposição - PS e Chega -, a quem é exigida "responsabilidade" e "iniciativa". Nota a disponibilidade demonstrada para cooperarem e pede que cumpram a "palavra".
"A AD é um movimento político do meio e esse é um dado político incontornável", vinca, acrescentando que a estabilidade política e a responsabilidade são uma "urgência nacional".
No plano internacional, denuncia a situação geopolítica "mais complexa" desde a II Guerra Mundial, com o conflito Israel-Irão. O governante diz que este conflito não pode, ainda assim, fazer esquecer a Guerra na Ucrânia e garante que a solidariedade para com os ucranianos é para continuar. Em Gaza, lamenta a política de colonatos na Cisjordânia e a interrupção da entrega da ajuda humanitária, pedindo igualmente a libertação dos reféns israelitas e sublinha o direito de defesa de Israel. Ainda assim, falha comprometer-se com o reconhecimento do Estado da Palestina, sendo que apenas continuará "as consultas com os parceiros quanto ao reconhecimento, aguardando com expectativa a conferência organizada pela França e pela Arábia Saudita".
"Nem por um segundo as incertezas da conjuntura internacional retiram o ânimo deste Governo para reformar o Estado", assevera, apelando para um Estado "atlético".
A AD vai "reabilitar a Saúde e a Educação", controlar e regular a imigração, dar prioridade à segurança, à mobilidade e à habitação. "Vamos fazer isto e muito mais", atira.
Dirigindo-se a José Luís Carneiro, garante que esta política será levada a cabo "com boas contas e contas certas" e, acima de tudo, "justas".
Saídos do "inesperado apagão político", o Governo vem "cheio de energia" e "pleno de iniciativa" para a nova legislatura.
"A via da iniciativa é a via da modernidade", cita.
Votos contra: PSD, PS, Chega, IL, CDS, JPP
Votos a favor: PCP, Livre e BE
Abstenção: PAN
"Depois da tentativa do show do populismo", toma a palavra o líder parlamentar do PSD, Hugo Soares, para desmentir André Ventura sobre o Conselho da Europa, que esta quarta-feira informa que o discurso racista está a crescer em Portugal: "ou é mentira, ou é ignorância" que essa entidade nunca tenha feito recomendações no capítulo da corrupção. E desafia o líder do Chega a não indicar nomes para aquela organização.
Carneiro esclarece que não decidiu extinção do SEF e assegura que o país está mais seguro hoje, em resposta a Hugo Soares, que o acusou de ter sido "o pai da extinção". O social-democrata resposta que tem todo o gosto em estendê-la ao PS e lamenta que o socialista "não assuma a paternidade".
O programa do Governo é um "espelho cristalino" com "atitude reformista", assinala Hugo Soares.
Enumera as já conhecidas prioridades do Executivo e diz que, no final de contas, há "imperativos coletivos", como é "salvar a escola púbica e o SNS".
Nesta linha e sublinhando que a estabilidade política "é importante para Portugal", Hugo Soares fala no tema que tem inquietado o Parlamento: o parceiro do Executivo. Pergunta a cada grupo parlamentar, sobre um tema específico que lhe diz muito, se seria capaz de votar contra: o aumento do salário mínimo ao PCP, a autonomia das regiões ao JPP, a desburocratização à IL, entre outros.
E remata: “O nosso chão comum são as soluções completas para a vida dos portugueses.”
Com quem vai governar o Governo? Com os portugueses e eles não perdoarão a quem desperdiçar o seu esforço.
Isabel Mendes Lopes, líder parlamentar do Livre, aponta que o programa do Governo "não está à altura do momento histórico que vivemos", aliás, recorda até "o passado" de austeridade. Transformar Portugal constrói-se, prossegue a deputada, com Cultura (que agora perdeu o ministério próprio) e a "tratar os imigrantes como seres humanos que são".
Também com políticas de combate ao discurso de ódio, que está a crescer em Portugal, com a proteção dos direitos das mulheres — com Isabel Mendes Lopes a apontar que nenhuma ministra falou no debate de terça-feira — e com o reconhecimento do Estado da Palestina.
Direitos não se perdem nem se compram e estamos cá para o assegurar
O Livre vai votar a favor da moção de rejeição do PCP.
Se o conselho é assim tão mau, se não serve para nada, e se o Chega combate tanto os tachos, porque tem deputados indicados precisamente nessa delegação?
O líder do Chega, André Ventura, começa o seu discurso por afirmar que Portugal tem um primeiro-ministro que joga com os "dois pés", mas que está "fora do campo, fora da linha e fora de jogo". E, por isso, considera que Luís Montenegro é um "mau primeiro-ministro".
Programa do Governo trouxe mais medidas "que não foram ou não serão concretizadas" e acusa Montenegro de jogar o mesmo jogo de António Costa. Continuando a analogia futebolista, lamenta que o Executivo tenha escolhido jogar na nova legislatura com "a mesma equipa".
Este, diz, é o dia de mostrar que este Governo "não é bom", mas há uma "alternativa" política. Atira ainda a extrema-esquerda, que "acabou reduzida a quatro ou cinco".
Assume, por isso, que o Chega vai "levar a sério" o trabalho de liderar a oposição, mas deixa claro que não contará mais com um partido que seja "somente uma muleta".
"Não começamos bem quando dizemos que vamos resolver a crise na habitação e acabamos a atribuir em Lisboa 127 casas ocupadas ilegalmente", lamenta, acrescentando que "quem ocupa casas, comete crimes, em Portugal, vai preso".
Fala ainda num "corte do sistema político" que nos últimos anos absorve os "rendimentos do país".
Sobre os incêndios, lamenta a falta de meios denunciada por vários autarcas para combater os fogos rurais. "Como é que podemos ter um Governo que nem no mais básico e fundamental consegue dar resposta aos portugueses", questiona.
"Este estado de coisas tem de acabar. Não podemos continuar a ser o parente pobre da Europa. Temos de defender Portugal dos fogos", urge.
Afirma ainda que os sucessivos governos não foram capazes de fazer a reforma necessária da Justiça e é por isso "que ainda se riem na nossa cara", mas avisa que esse tempo "está a acabar".
Lembra o polícia esfaqueado na segunda-feira e lamenta que nenhum dirigente político se tenha pronunciado ou escolhido "andar de cravos na rua".
"Passou a haver o ódio do bem e o ódio do mal", denuncia, questionando onde estava o comunicado do primeiro-ministro ou a nota da Presidência da República sobre este caso.
"Se for um português comum, não importa. Morre, morre, morre e mais nada", diz.
Alerta, contudo, que o país "está a mudar" e diz que o Chega não tem medo de dizer que alguém "é cigano".
"Senhor primeiro-ministro, é preciso saber se o que vai fazer é mesmo mudar este estado de coisas", afirma, lamentando o aumento do IMI e da carga fiscal.
Lamenta o chumbo da proposta do Chega sobre derrama estadual e acusa o PS de agora a integrar. Pede agora uma pensão digna para todos os antigos combatentes deste país.
"O país tem um novo primeiro-ministro e um novo líder da oposição. A partir de agora será assim: trabalhar, trabalhar, trabalhar", vinca.
A coordenadora do BE, Mariana Mortágua, nota que a composição do Governo é a "mesma", algo particularmente "penoso" na área da Saúde, assim como os interesses da AD, que "vão transformar pobres em miseráveis".
Fala ainda numa "confusão entre reformar o Estado e enfraquecê-lo" e questiona o que muda neste programa faça aos programas anteriores.
Este Governo "diz ao que vem no que diz respeito ao trabalho", com menos dias de férias e com muito mais horas laborais. A bloquista acusa a AD de querer transformar aumentos salariais em "prémios esporádicos".
Critica ainda o aumento dos dias de férias, desde que os trabalhadores deixem de receber salário.
Fala ainda no perigo da radicalização, na sequência do desmantelamento do grupo de extrema-direita, onde estava um chefe da PSP "que recrutava pessoas".
Mariana Mortágua, que teve dois minutos para falar, fica sem tempo, mas não abandona o púlpito. A banca do Chega vai criticando a demora e Aguiar-Branco pede à bloquista que saia. Mortágua fala numa tentativa de alterar a dinâmica dos trabalhos.
Toma a palavra José Luís Carneiro, para afirmar que "subsistem muitas perplexidades" no programa do Governo sobre os temas económicos e que o Governo não conta com o PS para "desinvestir no Estado Social".
Lamenta a falta de investimento no setor da agricultura e das pescas, quer a descentralização da Cultura e fala na "grave crise na Habitação", apresentando como objetivo para os próximos 10 anos que todos os cidadãos tenham uma casa para viver.
Anuncia ainda que não apoiará o modelo de empréstimos para pagar os custos do Ensino Superior, por fazer com que os estudantes contraiam dívidas.
O nosso papel não é o de auxiliar, mas o de fiscalizar e o de legislar para servir o país. O senhor primeiro-ministro responde perante o Parlamento, não é o Parlamento que responde perante si.
O secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo, lembra que apesar da "propaganda" a "realidade acaba sempre por se impor" e começa por elencar os principais desafios apresentados ao país.
Desde logo, sublinha que os trabalhadores são confrontados com baixos salários e precariedade, 1,8 milhões de pessoas trabalham por horários noturnos e o comércio continuam sem feriados e fim de semana.
"Este é o país onde se empobrece a trabalhar", declara.
Fala ainda em "ataque a direitos" que servem os "grandes interesses", mas não "os trabalhadores". Critica ainda a "negociata" do Novo BES. "É a velha imobilista receita neoliberal", atira.
Dirigindo-se ao primeiro-ministro, afirma que esta política vai transformar Portugal num "país mais injusto e desigual", um caminho que o PCP "não podia deixar passar em claro".
Acusa ainda o "trio" PS, Chega e IL de serem sustento do Governo e de contribuírem para a "instabilidade da vida das pessoas".
"A vossa política merece rejeição", garante, voltando a falar num "cheiro a troika".
A líder parlamentar da IL, Mariana Leitão, afirma que o país "não tem margem para governos sem ambição". Critica, por isso, o "texto tímido, vago, que foge às grandes decisões" do programa apresentado. Diz que não é mais do que um "exercício de equilíbrio político", especificamente desenhado para "não ofender ninguém".
"Portugal precisava de uma rutura, mas mais uma vez recebeu um remendo", atira, acrescentando que o Executivo desistiu de "liderar".
A liberal defende ainda o acesso pleno e universal à Saúde e critica a repetição do erro do "centralismo" na Educação. Na habitação, lamenta que o Executivo assuma o Estado como promotor na área da habitação.
"Sem aumentar a oferta não há solução possível. Libertem o mercado", apela.
Sobre a redução do IRS anunciada por Montenegro, diz que há é "um pequeno alívio" sentido já em 2025, mas que se vai manter até 2029.
"Queremos acabar com a máquina trituradora dos rendimentos dos cidadãos", afirma.
A IL defende, por isso, "um Estado ao lado dos cidadãos" e aponta que o distingue o partido dos liberais do Governo é a "coragem para enfrentar o que está mal, para cortar o que está a mais e os interesses que parasitam o Estado".
"Aos partidos da governação, falta-lhes coragem para enfrentar a máquina do Estado", acusa.
Assume ainda a vontade de levar a cabo "cortes cirúrgicos", mas "racionais" e lamenta a continuação de um Estado que "custa muito" ao país e que é o "maior obstáculo ao progresso".
"O PSD não quer reformar o Estado. Quer governar o Estado tal qual como ele está", dita.
Sublinhando a necessidade de estabilidade no país, João Almeida, do CDS, descreve como mudou o panorama político do Parlamento após as eleições de 18 de maio: "a esquerda reduzida neste Parlamento é muito agradável de ver", algo que resulta "da vontade dos portugueses".
Traça prioridades, como "lei e ordem" e "um Estado mais leve e mais eficaz". Com a direita a dominar na Assembleia da República, João Almeida acredita: "É mesmo desta que vamos conseguir" as alterações desejadas.
Inês Sousa Real fala num "mau programa de Governo" cujo "caminho é piorar em várias áreas", com destaque para o Ambiente, proteção animal, Habitação, Cultura (que agora perdeu o ministério próprio), Defesa e deixa também críticas à ministra da Saúde.
Quando os direitos das mulheres estão sob ataque sem precedentes e a violência doméstica já matou sete pessoas, o senhor primeiro-ministro acha que é boa opção reduzir a presença feminina no Executivo.
O deputado único do JPP, Filipe Sousa, garante que o partido vai dar o "benefício da dúvida a este Governo porque Portugal precisa de estabilidade".
Apesar de encontrar "pontos convergentes" no programa do Governo, reitera que desejava que fosse "mais claro relativamente às regiões autónomas".
Sem "varinhas mágicas ou soluções perfeitas", Filipe Sousa acredita que, "com espírito de missão, é possível fazer melhor" e assume ter uma "ideia agregadora" para o país. O JPP diz ainda estar empenhado em "renovar a esperança dos portugueses no presente e futuro".
A Assembleia da República aprova esta quarta-feira o programa do XXV Governo Constitucional, através do chumbo da moção de rejeição do PCP, que não tem o apoio de PS e Chega.
O período de encerramento tem cerca de duas horas para intervenções dos partidos, por ordem crescente de representatividade, e do Governo, seguindo-se a votação da moção de rejeição do PCP ao documento, que PS e Chega já disseram inviabilizar.
