A TSF recorda o percurso político do antigo deputado, autarca e primeiro-ministro.
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"Eu vim de longe. De muito longe. O que eu andei para aqui chegar", cantava, em 1982, José Mário Branco, num tema incluído no disco "Ser Solidário". A canção, essa, aborda o tempo vivido pelo músico e compositor nos meses que se seguiram ao 25 de abril, e pouco tem que ver com a história de Pedro Santana Lopes, mas, tal como canta José Mário Branco, também o social-democrata veio "de longe" e - até à candidatura apresentada em outubro de 2017 - muito andou "por aí" até aqui chegar.
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Há 12 anos, corria o ano de 2005, quando Pedro Santana Lopes deixava no ar o aviso e afirmava uma ideia que iria marcar boa parte do seu percurso politico: "Não me despeço. Não vou estar por aqui, mas vou andar por aí".
A garantia era deixada no Congresso do PSD, em Pombal, depois da pesada derrota frente a José Sócrates nas eleições legislativas, mas o caminho para a politica e para a liderança do partido e do pais tinha começado muito antes.
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Nascido em Lisboa em 1956 numa família católica, frequentou o Liceu Padre António Vieira e a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, onde chegou à presidência da Associação Académica - na qual, já nessa época, tinha como adversário político Durão Barroso. O gosto pela política surgiu cedo, por influência do pai, que lhe chegou a dizer que se queria ser alguém na vida teria de chegar à presidência da Associação.
Terminada a licenciatura - e, nesse momento, já filiado no PSD -, é convidado para adjunto de Álvaro Monjardino no Governo liderado por Mota Pinto, mas, pouco depois, volta à academia, desta vez na Alemanha, como investigador do Instituto de Direito Europeu e do Instituto para a Investigação da Ciência Política e Questões Europeias.
Sá Carneiro e o "PPD/PSD"
Em terras germânicas acumula experiência na área do direito que e lhe seria muito útil quando, em 1980, consumada que estava a vitória da Aliança Democrática, regressa a Portugal para ser o assessor jurídico daquele que sempre identificou como um ídolo, o então primeiro-ministro Francisco Sá Carneiro.
"Eu costumava dizer que uma pessoa podia ir para fora por uns tempos, voltar, e saber em que estrada ia encontrar Sá Carneiro. É muito raro isso acontecer muitas vezes na vida, em geral, mas, na política, em especial", sublinhava, numa entrevista concedida ao Instituto Francisco Sá Carneiro.
Além de assessor jurídico, ocupou o cargo de deputado pouco antes da queda do avião, em Camarate, num acidente que viria a provocar a morte de Francisco Sá Carneiro. Um rude golpe para Santana que, convidado por Francisco Pinto Balsemão para integrar o Governo, viria a dizer não ao convite daquele que era o sucessor do primeiro presidente dos social-democratas.
Dois anos depois, em 1983, e com um Governo liderado por Mário Soares, e formado por PS e PSD, chegava o tão falado Bloco Central, ainda hoje uma alternativa rejeitada por Santana Lopes: "Eu não tenho propensão para fazer um Bloco Central", adiantou, este mês, no momento em que anunciou a candidatura.
Cavaco Silva, o Governo e a curta, mas intensa, passagem pelo futebol
Apoiante de Cavaco Silva, foi peça importante na chegada de Cavaco a primeiro-ministro, aceitando o lugar de secretário de Estado da Presidência. Foi cabeça de lista do partido na eleições europeias e ocupou o cargo de secretário de Estado da Cultura, onde liderou obras como a construção do Centro Cultural de Belém (CCB). Um percurso político que, em 1995, já depois do Congresso de Lisboa - no qual acabaria por desistir da candidatura à liderança do PSD - seria interrompido. Candidato às eleições do Sporting, sucede a Sousa Cintra na presidência dos leões.
"Preferimos que o Sporting ficasse de fora desta aliança que existiu. Há uma maneira diferente de ver o futebol entre a nova direção do Sporting e outros elementos desportivos, sobretudo o presidente do FC Porto", afirmava, em 1995, depois da eleição de Pinto da Costa para a liderança da Liga Portuguesa de Futebol Profissional.
Pelo Sporting, chegaria a conquistar uma Taça de Portugal, mas, seria também responsável pelo fim de modalidades históricas do clube como o hóquei em patins ou o basquetebol, saindo ao fim de um ano. Uma curta passagem pelo dirigismo desportivo, para, logo depois, voltar à politica ativa nos social-democratas.
Santana autarca, Santana primeiro-ministro. E um governante a caminho de Bruxelas
De regresso às disputas dentro do partido, concorre à liderança do PSD, em 1996, e sai derrotado por Marcelo Rebelo de Sousa. O passo seguinte é a carreira de autarca. Primeiro, na Figueira da Foz - onde permanece até uma nova candidatura à presidência do PSD, sendo derrotado por Durão Barroso - depois, a pedido de Durão, na Câmara Municipal de Lisboa.
Como autarca da capital, é responsável pela ideia de dar início ao polémico Túnel do Marquês, uma obra que, diria mais tarde, foi marcada por um "ambiente de guerrilha política e muita oposição" numa autarquia que viria deixar, em 2004, para suceder a Durão Barroso, o primeiro-ministro que tinha seguido para Bruxelas.
"Acho que nunca mais acontecerá ir alguém para presidente da Comissão Europeia e vir-me bater à porta a pedir para substituí-lo como primeiro-ministro e o partido dizer a mesma coisa. Ainda por cima, como é quase consensual a opinião de que fui mau primeiro-ministro, menos hipóteses há de isso acontecer", diria, mais tarde, em entrevista à SIC.
Um Governo que era ainda... "um bebé na incubadora"
A contragosto, mas sem convocar eleições, Jorge Sampaio, então presidente da República, aceita Santana como primeiro-ministro. Um mandato marcado por casos e episódios insólitos, desde as guerras entre governantes, até à saída de Marcelo Rebelo e Sousa do lugar de comentador por alegadas pressões do executivo, passando por uma metáfora que, em resposta a Cavaco Silva, ficaria célebre.
"Este é um Governo a quem ninguém deu quase o direito de existir antes de ele nascer, e que, depois de nascer através de um parto difícil, teve de ir para uma incubadora (...) Tem sido difícil para quem está na incubadora, ver passar a família e, em vez de acarinhar, haver membros da família que dão uns estalos no bebé"
Na véspera, Cavaco afirmara que tinha "chegado o tempo dos políticos competentes afastarem os incompetentes", referindo-se à substituição de Santana Lopes como primeiro-ministro. Pouco mais de quatro meses depois da tomada de posse de Santana Lopes como líder do Executivo, este era apenas mais um dos vários incidentes que levariam Jorge Sampaio a dissolver o parlamento, alegando uma uma "grave crise de credibilidade do Governo".
"O país não estava à deriva. Foi para isto, foi para estes anos que se seguiram que houve a bomba atómica?", questionava Santana Lopes, depois de, já este ano, numa biografia lançada em março, Jorge Sampaio ter afirmado: "Fartei-me do Santana como primeiro-ministro, estava a deixar o país à deriva".
Ainda assim, garante Santana, a saída foi feita "sem rancores", sublinhando que "o povo não decide bem só quando nos dá razão a nós".
O "regresso" a Lisboa, António Costa e o tempo para avançar
Depois dessa, outra bomba, com a derrota estrondosa nas legislativas e a maioria absoluta de José Sócrates. De seguida, o regresso à autarquia de Lisboa para terminar o mandato e, em 2007, a liderança do grupo parlamentar do PSD, onde volta a encontrar-se, em vários debates quinzenais, com o então líder socialista.
Em 2009, uma nova batalha, desta vez - e uma outra vez - para a Câmara Municipal de Lisboa e contra aquele que, agora, em 2017, pode vir a ser, num futuro próximo, o principal adversário político: António Costa. "Perder como perdi não custa muito", escrevia, dias depois da derrota, criticando, no entanto, as sondagens, que lhe tinham sido desfavoráveis, com "grande discrepância", depois de conhecidos os resultados eleitorais.
Daí em diante, seguiu-se a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e o lugar de provedor, mas sempre com um pé fora e outro dentro do partido. "Keep cool, tenhamos calma, cada coisa a seu tempo", dizia, em 2016, em pleno Congresso do PSD, quando o tema ainda eram as eleições autárquicas. Chegou a ser falado como candidato, mas não avançou, deixando o partido à beira de um ataque de nervos.
O tempo de avançar chega agora. Homem de convicções fortes e eterno 'enfant terrible' do PSD - ou do PPD/PSD, como gosta de sublinhar -, diz quem o conhece, e até quem o apoia, que não tem papas na língua, que não leva desaforos para casa, que fala primeiro e pensa depois, mas que, nos últimos anos, se tornou num politico mais ponderado. E com objetivos bem definidos.
"Defendo que é preciso fazer pactos de regime nalgumas matérias: obras públicas, justiça e saúde. Segurança social também acho que é prioritário, mas reconheço que difícil devido às diferenças ideológicas", salientou, no momento em que, na SIC, anunciou a candidatura, adiantando ainda que tem também como prioridade matérias como a "coesão territorial" e a "descentralização".