"Se impedirmos a livre expressão, as opiniões não desaparecem, ficam é por exprimir. Estão lá para qualquer tiranete de turno que saiba acicatar os ânimos"
Quer menos estado na economia e na sociedade, mas há mais de dez anos que não trabalha no privado. Tem como prioridade o crescimento económico na UE para reter o talento dos jovens qualificados. Solidário com Aguiar Branco, defende a liberdade de expressão e um estado da Palestina. Primeira parte da entrevista à TSF.
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João Fernando Cotrim de Figueiredo, 62 anos, gestor, empresário e político português. É deputado pelo partido Iniciativa Liberal (IL) desde as Eleições Legislativas de 2019, tendo sido reeleito nas eleições de 2022. Foi, durante trêds anos e pouco, o 3º Presidente da Comissão Executiva da Iniciativa Liberal.
Estudou na Escola Alemã de Lisboa, seguindo-se a licenciatura em Economia na London School of Economics. De regresso a Lisboa, tirou um MBA em Administração, Negócios e Marketing na Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa. Foi administrador de empresas, presidente executivo do BPP, após a saída de João Rendeiro, diretor-geral da TVI de 2010 a 2011. Presidente do Conselho Diretivo do Turismo de Portugal entre 2013 e 2016, em 2015 foi eleito vice-presidente da European Travel Commission. Esteve, também, envolvido nas negociações que trouxeram a Web Summit para Lisboa, em 2015. Em 2019, foi eleito deputado, o primeiro representante da Iniciativa Liberal na Assembleia da República. Em 2022, multiplicou o resultado do partido, levando o mesmo a tornar-se a 4.ª força política, conseguindo eleger 8 deputados nas eleições desse ano.
Bem vindo ao TSF Europa, João Cotrim de Figueiredo… Para quem defende menos estado na economia e na sociedade, já lá vão uns anitos sem trabalhar numa empresa privada…
É verdade, mas também a única função propriamente pública, dado que ser deputado não faz parte da Administração Pública, a única função propriamente pública foi a do Turismo de Portugal, e que foi uma função que fez-me duas coisas: ter enorme respeito pela qualidade das pessoas que a Administração Pública tem, e portanto me levou a crer que se estivessem mais bem enquadradas e se tivessem alguns instrumentos de gestão…
Ajudou-o a romper com preconceitos liberais?
Não, eu não acho que os tenha, desse ponto de vista; eu sempre olhei para as pessoas uma de cada vez, portanto não é por estarem num organismo público que são automaticamente maus profissionais, nunca tive esse preconceito. Agora, o que me confirmou foi a ideia de que para retirar o melhor que as pessoas têm, e toda a gente tem algo muito importante para dar, têm que estar enquadradas em termos de gestão de forma diferente e tem que haver um mecanismo de compensação possível para as poder estimular e incentivar, e não há. Nas regras de remuneração e de promoção na Administração Pública é muito difícil de reconhecer o mérito, e eu tive esse problema, tanto que das 600 e tal pessoas que faziam parte do quadro pessoal do Turismo de Portugal, havia umas larguíssimas dezenas que eu acho que mereciam mais e não tinha a possibilidade de lhes dar mais.
“A Vida de Brian”, dos Monty Python é o seu filme favorito, segundo li, ou é um dos... foi líder partidário… depois saiu quando o partido tinha crescido substancialmente… pegando no filme, teve medo de começar a cair do alto e acabar, se me permite a expressão, ser crucificado?
Essa é uma interpretação possível, mas também desejamos honestos, ter 5%, que foi basicamente o que tivemos nessas eleições, não é provavelmente um alto…
Mas aumentou a representação parlamentar…
Eu percebo que essa decisão tenha carecido de muita explicação e provavelmente ainda careça porque não é comum, primeiro, como disse, sair naquilo que se pode chamar ‘em alta’, nem é comum a pessoa reconhecer que não tem todas as características pessoais para determinada função e que, neste caso, um partido e um projeto que eu gosto muito e que para o qual quero o melhor, precisava de uma pessoa diferente. Não é muito comum fazer isto com esta franqueza, e este desapego também. Mas mantenho todos os argumentos e os fundamentos da decisão que tomei porque acho que é isso; e com isto não estou a dizer que sou um exemplo para ninguém, estou só a dizer que quando se olha para a frente, e na altura estamos a falar de 2022 que tomei essa decisão, no final do ano, em que se perspectivava um ciclo político (tinha acabado de ser eleita uma maioria absoluta), de mais de quatro anos, porque as eleições foram em janeiro, e de estabilidade, portanto ninguém podia prever que passados menos de dois anos, o Governo viesse a cair por culpa própria; portanto nesse quadro que se perspectivava, na minha cabeça fazia todo o sentido, proceder à renovação mais cedo, dar tempo à nova direção e à nova liderança de se afirmar e disputar as eleições que viessem pelo caminho com toda a força e com toda a notoriedade que elas também exigem. E depois, do ponto de vista pessoal, de facto eu gosto muito de política, penso que é óbvio, nunca tinha tido atividade política, mas estando cá, assumo que sou político e que gosto de atividade política, talvez não goste tanto da atividade partidária, e as funções de liderança partidária exigem qualidades que eu acho que não tenho, e se calhar nem quero ter.
Nesta altura, embalado pela sondagem da TVI (de 18 de maio, que colocava IL e Chega empatados com 10% das intenções de voto), a Iniciativa Liberal tem como objetivo ficar à frente do Chega nas eleições para o Parlamento Europeu?
Diz bem, fui embalado e não é bem um objetivo, mas achei muita graça e confessei, eu tenho os meus pecadilhos, portanto vejo aquela proximidade da Iniciativa Liberal ao Chega e de facto dar-me-ia um gozo tremendo que a crista, que tantas vezes anda em alta também por outras sondagens e por outras coisas, se pudesse baixar, e se baixasse à custa da Iniciativa Liberal eu acho que era fantástico, mas não é provavelmente um objetivo e sondagens, como vocês já ouviram muitas vezes, quando são muito boas não entramos em euforia nem embandeiramos em arco, e quando são más também não entramos em depressão, porque cada uma tem o seu contexto e tem as suas mitologias. Esta foi particularmente interessante desse ponto de vista e acho que muita gente gostaria que acontecesse alguma coisa desse tipo para provar que não há inevitabilidades na política e que mesmo aquilo que parece particularmente difícil de parar ou de suster em termos de crescimento, pode um dia cair. E aí sim, olhe, esses já podem cair do alto da montanha e portanto, se eu tiver e a Iniciativa Liberal tiver algum papel nesse baixar de crista, dar-me-ia particular gozo. Isto é mesquinho o que eu estou a dizer, eu sei, mas acho que lá tenho direito a ter estas pequenas…
Está identificado o ódio de estimação. Quer mesmo ser eleito e ir trabalhar para um sítio que considera a capital da burocracia, acha que vai conseguir acabar com ela ou pelo menos contribuir para isso?
Com franqueza não sei. Mas é importante que alguém o faça, porque se ninguém tiver essa perspetiva de ir para outro, não sei se alguma vez usei a capital da burocracia, mas sou bem capaz de ter dito, mas se ninguém estiver disponível para ir para os sítios onde acha que uma mudança é necessária porque isso faria real diferença, e se ninguém estiver disponível para essa luta, então isso nunca vai mudar. E o que eu tenho notado, e já tenho feito este discurso mais ou menos inflamado, mais ou menos estupefacto, aos meus colegas, quer no Partido Liberal Europeu, quer com outras pessoas que trabalham no Parlamento Europeu, e por um lado eles apreciam, digamos, a visão de alguém de fora, que eles não se apercebem do próprio enredo em que se envolveram naquela grande burocracia….
Devem dizer: espera até cá chegares para veres o que mudas…
Mas eu sou o primeiro a dizer isso, eu tenho esta noção perfeita de que não há nada mais irritante que alguém que vem de fora e que acha que vai mudar tudo, eu só tenho essa noção, mas repito o que disse…
Somos todos treinadores de bancada, não é?
Sim, por um lado, e há provavelmente até uma desvalorização das dificuldades e das circunstâncias que levaram a que aquelas burocracias que aparecessem… às vezes é para, com interesses muito legítimos, tentar resolver um problema, vamos pôr aqui mais uma regra, mais uma limitação, mais um papel, mais um requerimento, e quando as pessoas voltam a olhar para o problema, está de facto um novelo criado. E eu acho que a Europa chegou a esse nível do ponto de vista do funcionamento interno, mas sobretudo porque depois isso introduz nas economias e nas sociedades que superintende, digamos assim, e que em alguns casos até governa, porque tem competências para isso, introduz nessas sociedades uma lógica perra, pouco dinâmica, pouco livre, vou usar a expressão porque é mesmo do que se trata. Não parece normal que a Europa, que sempre teve este ambiente de particular liberdade, de particular incentivo às pessoas para ‘vai e faz’, nos últimos dez ou vinte anos tornou-se o campeão da burocracia, e tudo o que tinha sido campeonato de inovação parece que deixou de querer concorrer.
Quais são as suas grandes prioridades, caso seja eleito?
Nós temos dito que há uma, que não é por ser mais importante, mas é por ser mais precedente, que tem que vir antes de tudo o resto, que é o crescimento económico. Porquê? Eu acho que somos lúcidos, e também não somos os únicos, mas nós somos lúcidos relativamente à natureza e à profundidade dos problemas que a Europa tem que resolver e dos desafios que agora tem pela frente, nos próximos cinco ou dez anos. O alargamento, a reconstrução da Ucrânia, a transição energética, a transição digital, os investimentos em defesa, são tudo coisas, decisões difíceis, caras, a maior parte delas muito caras….
Eu estava a pensar isso, continuar a ajudar a Ucrânia vai implicar muita despesa, muita despesa dos erários públicos. Mas com tudo isso… defende a continuação dessa ajuda?
Defendo a continuação e até a intensificação dessa ajuda, isto tem que partir um bocado ao contrário, que é quem está consciente da situação política ou militar, sobretudo da militar, definir aquilo que seria necessário para atingir aquilo que possamos chamar uma vitória da Ucrânia, que nunca será uma aniquilação da Federação Russa, evidentemente. Ou seja, as guerras acabam de uma de duas maneiras: ou um dos beligerantes se rende ou negoceia-se uma paz. E portanto o nosso objetivo é que a Ucrânia, mais tarde ou mais cedo, se possa sentar a uma mesa de negociações com um poder negocial.
O que não é o caso agora nesta altura...
O que não é o caso nesta altura, o que implica, inevitavelmente, sucessos militares que a Ucrânia teve numa determinada fase da guerra e deixou de ter, e está a acumular até desaires militares nos meses mais recentes… E portanto, sim, o apoio é para isso. Mas eu estava a responder à pergunta do porque é que o crescimento é precedente e é importante que as pessoas percebam isso, porque eu comecei por aquilo que é óbvio: é que o que temos que fazer é caro e se não estivermos a crescer os recursos vão escassear para conseguir fazer isso e, sobretudo, para conseguir fazer isso a tempo, mas também são complexos do ponto de vista técnico, muitos deles, e precisamos de pessoas muito boas, quer nas decisões mais políticas, quer na execução mais técnica. E se nós não crescermos, nós não vamos ter nem conseguir reter os europeus qualificados, que vamos precisar em números muito, muito grandes para conseguir vencer estes desafios. Vão todos procurar vida, é um bocadinho o que se passa em Portugal hoje mas transposto para a União Europeia nos próximos 5 ou 10 ou 15 anos. Vamos ter o mesmo problema: os jovens qualificados europeus vão ter melhores condições de trabalho e oportunidades mais interessantes fora da Europa se nós não voltarmos a crescer. Portanto, depois disso, aplicar os recursos, quer financeiros, quer os nossos ativos humanos que espero que continuemos a qualificar e a reter, para voltar a dar à Europa aquela imagem, e espero que seja mais que imagem, espero que seja mesmo realidade, de ser o espaço primordial de liberdade do mundo e o espaço de paz. Portanto, são dois planos que precisam e que são precedidos pela necessidade de crescimento económico.
Com uma guerra na vizinhança, como é o caso do Médio Oriente, qual deve ser a estratégia europeia aí?
Bom, tem que se dizer que, e a Iniciativa Liberal publicamente manifestou a sua solidariedade com Israel a 7 de outubro na condenação inequívoca dos ataques terroristas do Hamas, daí para cá a retaliação desproporcionada e a catástrofe humanitária que as ações de Israel provocaram na faixa de Gaza merecem total condenação. Portanto, aqui também o que a União Europeia e todos os amantes da paz devem fazer é criar condições para que se possam voltar a sentar as partes, e aqui lamento dizer o Hamas não deve ser uma parte, à mesa para perceber de novo quais são as condições mínimas para que a solução de dois Estados, que é a única que permite respeitar os direitos legítimos das várias partes que estão em confronto há décadas, para que isso possa acontecer. Já foi tentado várias vezes? Eu sei, mas de cada vez que há uma evolução histórica, conseguimos ficar mais perto de uma solução, e também já se perceberam quais são os problemas. Os acordos de Camp David, se fossem feitos hoje, teriam outras condições completamente diferentes, e se calhar não tinham dado origem àquilo que na prática foi uma desagregação da própria Autoridade Palestiniana. Portanto, neste momento o reconhecimento da Palestina acho que é um fator importante, o reconhecimento da independência da Palestina e do Estado da Palestina como tal, é um fator simbólico importante.
Portanto, uma linha seguida por Pedro Sánchez em Espanha...
Sim, quer dizer, Pedro Sánchez tem laivos de tomar parte que eu não acompanho, mas não vou discutir agora o tom nem a tática da coisa, vamos centrar-nos no que é essencial. Israel tem o direito de existir e está rodeado de um conjunto de vizinhos que muitos deles não lhe reconhecem exatamente esse direito, logo temos aqui um problema, mas todos eles têm legitimidade e sobretudo o povo palestiniano também tem legitimidade para reclamar uma pátria. A partir desta base que me parece indiscutível, temos que encontrar uma solução que não vejo outra que não seja uma solução de dois Estados. E a animosidade, a agressividade, a violência que durante décadas tem assolado aquela região, mostra que isto não foi interiorizado, que não é possível nenhum deles ganhar. Se nenhuma das partes tiver qualquer esperança de que é possível ter uma solução que lhe seja totalmente a contento, vai ter que viver com uma solução negociada e só essa é que pode garantir uma paz duradoura no Médio Oriente.
Manifestou-se contra "fechar a Europa como fortaleza", mas considera que o problema migratório deve ser tratado e não ser um "tema exclusivo da extrema-direita"... isso é porque os liberais e a direita moderada permitiram e foram coniventes com a narrativa da extrema-direita?
Não foram a jogo, acho que porque o assunto era incómodo em algumas vertentes, não foram a jogo, deixaram o discurso ser completamente dominado e influenciado não só pela retórica, mas até pelo estilo da extrema-direita, isso foi o pior serviço que se fez aos migrantes que já cá estão, aos que possam pensar em vir para a Europa e também para as populações dos países que os devem integrar, porque os argumentos de que a Europa precisa de muitos migrantes para crescer parecem quase cínicos. Isto não deve ser algo utilitário; se acabar por ter uma utilidade ótimo, mas não é isso que se deve estar a discutir. Nós temos que estar a discutir o princípio da coisa. Qualquer ser humano tem o direito de procurar uma vida melhor, é este o princípio, qualquer ser humano. E portanto, temos que estar disponível para os receber, mas depois não podemos ser cegos em relação aos problemas que isso está a criar, pois basta passear em Portugal, nas grandes cidades, e se percebe que nós não estamos a conseguir receber as pessoas, estamos a conseguir deixá-las entrar, mas aquilo não é digno, aquilo não é integrar pessoas, e portanto, pior, se isto não é devidamente acompanhado e gerido, estamos a criar um problema social, que, esse sim alimenta depois as forças extremistas que passam a ter razão, porque vai haver problemas relacionados com a falta de integração.
Mas está preocupado com o aumento do discurso de ódio na Europa?
Estou preocupado com uma espécie de tendência fácil para usar o discurso simplista, pegando em fenómenos que são sobretudo emocionais, e tentar fazer pontos políticos, todos eles baseados na divisão e distinção entre pessoas, no apelo ao pior que tem o ser humano: a inveja, o medo, a resistência à mudança, isso sim, porque não só tem efeitos políticos imediatos, mas tem efeitos políticos duradouros, porque transformam as sociedades em sociedades sobretudo fechadas, as tais fortalezas. Talvez a principal opção que se coloca às pessoas na política, em todo o mundo, cada vez que vão votar ou participar numa escolha política é se queremos uma sociedade aberta ou uma sociedade fechada, a todos os níveis. E essa guerra estamos a perdê-la, porque de facto o que tem crescido são os adeptos das sociedades fechadas, estamos a perdê-la, ou porque não vamos a jogo, ou porque não temos coragem de defender aquilo que sempre defendemos, que é a liberdade das pessoas.
Então, mas todo esse discurso, para si, não está então no âmbito da liberdade de expressão?
Está, claro.
Ou seja, pode existir?
Pode.
O João Cotrim de Figueiredo disse que as pessoas podem dizer as patéticas que quiserem, e pediu coerência no debate sobre a liberdade de expressão. Então, a quem é que faltou essa coerência?
Olhe, a quase todos, porque os que proferiram as afirmações sobre…
Incluindo o Presidente da Assembleia da República?
O Presidente da Assembleia da República… bem lembrado, estava a ser injusto, talvez José Pedro Guilherme Branco tenha sido a pessoa mais coerente no meio disto tudo, e já agora a Iniciativa Liberal. Porquê? Porque no mesmo dia tivemos, na parte da manhã, o Chega a dizer que o Presidente da República não pode dizer determinada coisa, e que deve ser processado por traição à pátria, e na parte da tarde tivemos outras pessoas a dizer que o deputado André Ventura não pode dizer não sei o quê, e também deve ser sancionado ou lhe deve ser retirado a palavra. Nem um, nem outro. E se a liberdade de expressão serve para alguma coisa, é para nós nos habituarmos a ouvirmos opiniões que não gostamos, mesmo aquelas mais patéticas, porque há uma coisa que para mim é evidente, e não sei porque é que as pessoas não ligam mais a isto: se impedirmos a expressão de opiniões, por muito que discordemos delas, se impedirmos essa expressão, as opiniões não desaparecem. Elas ficam é por exprimir, e ficando por exprimir ficam por combater ou por ser impossível contraditá-las. Mas estão lá. Qualquer tiranete de turno, qualquer pessoa que saiba acicatar os ânimos das pessoas, vai lá e usa essa opinião; pior, se tiver essa opinião e ela não for expressa, gera aquilo que eu em tempos me lembro de ter ouvido. A seguir à primeira eleição de Trump, também causou uma certa perplexidade um painel, penso que na Universidade de Columbia em Nova Iorque, onde havia uma série de pessoas a tentar explicar como era possível um populista daqueles ter conseguido ganhar uma eleição, e há um psicólogo chamado Steven Pinker, que também analisa politicamente a vida, que dizia , analise psicológica dele: não há nada mais poderoso do que alguém que tem uma ideia, que pensa que é o único no mundo, de repente ver alguém na televisão a expressar a mesma ideia! Não só adere imediatamente à pessoa que está a emitir a opinião, como sente que nos anos todos em que essa opinião não foi expressa, o estavam a enganar. Aquela velha questão de que ‘o sistema não funciona para mim’, tem aqui um exemplo extraordinário. Isto é poderosíssimo, do ponto de vista psicológico, e multiplicado por milhões dá aqueles movimentos de massas que queremos evitar. Portanto, expressão o mais livre possível, nos limites da lei, que já os tem, não é uma liberdade sem qualquer limite, já os tem, o incitamento à violência e ao ódio já são puníveis pelo Código Penal, mas deixem dizer as baboseiras todas, não há nada que destrua melhor ou mais a credibilidade de uma posição política do que uma baboseira. Basta ver as opiniões do embaixador Tânger Corrêa para perceber o que é que ele fez à credibilidade do Chega. Eu não sou adepto de teorias da conspiração, como alguns outros são, mas se fosse eu diria que Tânger Corrêa foi escolhido por globalistas ou pelo Soros ou por alguém para estar à frente do Chega, para o destruir, e está a fazer um bom trabalho.
A sua colega, deputada do PS Alexandra Leitão, disse que o Presidente da Assembleia da República, ainda que possa estar coberto pela lei, digamos assim, devia ter feito uma advertência ao deputado André Ventura. Partilha dessa opinião?
Isso chama questão de estilo, não sei. Já me perguntaram se teria feito exatamente a mesma coisa se fosse Presidente da Assembleia da República, demorei cerca de meia hora a responder, porque só imaginar-me ser Presidente da Assembleia da República demorava tempo, mas francamente não sei, é uma questão de estilo. Talvez isso possa ser feito sem aquela noção de mestre-escola ou de guardião de uma certa moralidade que também não compete ao Presidente da Assembleia. Eu não desgostei da forma como José Pedro Guerreiro Branco lidou com o assunto e queria-lhe mandar daqui uma mensagem da para isso. Ao contrário do PSD, que parece que se prepara para lhe tirar o tapete, porque o seu líder parlamentar confessou logo na altura que na Conferência de Líderes ia tratar do assunto porque não estava totalmente de acordo com a posição assumida. Se José Pedro Guerreiro Branco precisar de apoio, precisar de alguém que esteja com ele, tem na Iniciativa Liberal certamente, nesta matéria um aliado.
Imagine que alguém, de algum partido mais favorável ao fim da guerra em Gaza e aos palestinianos dizia, ‘já se sabe que os judeus são um bocado preguiçosos ou gananciosos’…
Ou lentos…
Já para não dizer orientais… mas uma referência tal como sugeri, feita relativamente aos judeus, seria encarada por si como liberdade de expressão ou como antissemitismo?
As duas coisas.
Não deixava de ser antissemitismo?
Claro. Antissemitismo, neste caso, porque atribui a uma etnia, uma característica. Genericamente, o Rui Rocha teve um discurso fantástico sobre a importação coletiva de culpas e eu poderia acrescentar também a importação coletiva de méritos. Qualquer importação coletiva, talvez seja uma das grandes diferenças entre a postura liberal de estar na política e outras, é de que nós temos horror a todo tipo de coletivismo, a começar com o coletivismo que atribui a grupos, sejam os quais forem, seja qual for a característica que os distinga, atributos e virtudes ou defeitos que sejam comuns. Não, é pessoa a pessoa que se deve olhar para o problema. Portanto, é antissemitismo nesse sentido porque se referiu ao povo judeu, mas se tivesse a referir ao povo turco, não há uma palavra para designar isso.. ‘Antiturquismo’, podemos inventá-la aqui, mas também foi…. é uma opinião condenável, mas tão livre de ser expressa como qualquer outra.
O novo programa TSF Europa pode ser ouvido de segunda a sexta-feira às 09h15 e às 18h15. Já as entrevistas na íntegra com os cabeças de lista às europeias podem ser ouvidas depois das 16h00 e sempre em TSF.pt até às eleições.