"Tiro no pé" com "caráter discricionário entre imigrantes". Esquerda unida contra promulgação da lei de estrangeiros
Pedro Delgado Alves, deputado do PS, admitiu, no Fórum TSF, "voltar ao tema" e pediu que "pelo menos haja abertura no futuro para corrigir este problema"
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Depois da promulgação das alterações à lei de estrangeiros pelo Presidente da República, foram várias as vozes que se levantaram contra a decisão de Marcelo Rebelo de Sousa.
No Fórum TSF, toda a esquerda parlamentar mostrou-se discordante relativamente à promulgação. Pelo PS, Pedro Delgado Alves admitiu que o partido pode avançar com outras propostas.
"Temos de resistir à tentação de ir no discurso populista e de ser manipulados por aquilo que a extrema-direita nos coloca em cima da mesa. E o Governo não foi capaz de resistir a essa tentação. Temos pena, mas esperemos que pelo menos haja abertura no futuro para corrigir este problema. O Governo manifestou tardiamente que talvez pudesse olhar para as propostas que fizemos sobre este visto para procura de trabalho, vamos aguardar, mas se não virmos desenvolvimentos voltaremos ao tema e queremos criar canais regulares, seguros e legais para imigração, algo que esta lei não conseguiu", disse o deputado socialista.
Paulo Muacho, do Livre, acusa o Governo de "ter dado a mão" à extrema-direita: "Discordamos destas opções. Entendemos que não é a forma, sequer, de o Governo conseguir atingir os objetivos que diz conseguir e, por isso, entendemos que, no mínimo, merecia da parte do Presidente da República um veto político para sinalizar precisamente essa divergência. E estas alterações, esta nova visão que o Governo, de mão dada com a extrema-direita, traz é um verdadeiro tiro no pé para o nosso país, porque vai ter implicações na nossa economia, porque a economia vai sofrer com estas alterações, e o próprio facto de ser contraproducente, porque, ao acabar com a possibilidade da existência de vistos para a procura de trabalho no nosso país, exceto nas áreas altamente qualificadas, o Governo acaba por estar a empurrar pessoas que as nossas empresas continuam a precisar para a ilegalidade, informalidade e irregularidade."
Seyne Torres, membro do Comité Central do PCP, aponta desigualdades entre imigrantes nas alterações à lei.
"Estas alterações continuam a manter um caráter discricionário entre imigrantes e não estamos de acordo com a promulgação pelo Presidente da República. Por exemplo, continua a perpetuar a diferença entre imigrantes altamente qualificados e cidadãos europeus aos outros imigrantes. Em relação ao reagrupamento familiar, os imigrantes altamente qualificados podem ter os membros da sua família abrangidos no artigo 99 e 100, contudo, para os outros imigrantes o reagrupamento familiar é só para quem tenha a cargo menores ou tenha um cônjuge ou algo equiparado", argumenta.
Pelo Bloco de Esquerda, Fabian Figueiredo afirma que a nova versão da lei não corresponde às preocupações de Marcelo Rebelo de Sousa e do Tribunal Constitucional, algo assumido pelo próprio Presidente da República: "O senhor Presidente da República diz que foi aprovado por 70% dos deputados. A lei anterior também já tinha sido aprovada por uma larguíssima maioria na Assembleia da República. Não é por uma lei injusta e inconstitucional ser aprovada pela Assembleia da República que deve ser promulgada pelo Presidente da República. É esse o papel que um Presidente da República tem, independentemente da maioria de deputados que a provam a lei. A segunda, repare na minudência do Presidente da República, diz que corresponde minimamente. Ou seja, não corresponde na globalidade às preocupações que o senhor Presidente da República levantou quando mandou a lei para o Tribunal Constitucional, nem corresponde na totalidade às preocupações que o Tribunal Constitucional manifestou e que o levou a chumbar."
"Por isso", considera Fabian Figueiredo, "a lei devia ter sido, ou novamente enviada para o Tribunal Constitucional, matéria não falta, a lei cria várias camadas de desigualdade que, a nosso ver, não devem estar na arquitetura jurídica portuguesa" ou "ser vetada, porque não corresponde às preocupações que o Presidente da República levantou e que o Tribunal Constitucional levantou, como fez em casos anteriores, veja-se o caso da eutanásia".
Alberto Matos, da Associação Solidariedade Imigrante, afirma que esta promulgação não vai tirar fôlego aos protestos de quem vem de fora para Portugal.
"A determinação dos imigrantes ficou bem patente na grande manifestação de 7 de setembro diante da Assembleia da República. Essa não se esgotou e, independentemente das instituições, dos deputados, de quem vier a pedir, e com toda a razão, a inconstitucionalidade pelo menos de aspetos importantes desta alteração à lei, os imigrantes vão continuar a manifestar-se e vão até intensificar, não só os contactos com os grupos parlamentares que estamos a ter e vamos ter nas próximas semanas, mas as ações de rua e de protesto", avisa.
Pelo Movimento Consenso Imigração, Rui Marques acredita que Portugal está "a cometer um erro crasso enquanto país em só estar a falar da regulação das entradas e não falar da integração dos imigrantes".
"O grande tema é a integração dos imigrantes. É o esforço que o país faz ou não faz para apoiar a boa integração dos imigrantes na sociedade portuguesa, porque aí é que se joga o futuro. Por exemplo, para o Orçamento do Estado para 2026 - tanto quanto é visível nesta altura, veremos que alterações virá ainda a sofrer -, a proposta de investimento da AIMA em políticas de integração é um euro por mês por imigrante. Ora, isso quer dizer que não há nenhum esforço consistente, realista e robusto para trabalhar a integração dos imigrantes. E sem imigração, aí sim temos um problema sério", complementa.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, promulgou a Lei de Estrangeiros, indica uma informação divulgada esta quinta-feira no site da presidência.
Na nota, Marcelo Rebelo de Sousa considera que o diploma, revisto e aprovado por 70% dos deputados, "corresponde minimamente ao essencial das dúvidas de inconstitucionalidade suscitadas por si e confirmadas pelo Tribunal Constitucional".
