Um livro que, mais do que "ajuste de contas", é "exigência relativamente ao futuro". PCP denuncia "assalto aos aeroportos"
Em declarações à TSF, Vasco Cardoso fala numa "segunda vaga do assalto, que está a ser desenhada neste momento, a propósito da exigência da construção de um novo aeroporto"
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O Partido Comunista Português (PCP) lança esta terça-feira um livro sobre a privatização da ANA - Aeroportos de Portugal, uma ação que considera fazer parte de um "assalto aos aeroportos". Com esta publicação, o partido, mais do que "um ajuste de contas de responsabilização política", pretende "exigência relativamente ao futuro".
A obra surge 12 anos após a privatização da ANA à francesa Vinci, em 2013. Entretanto, em 2024, o Tribunal de Contas conclui que o negócio não "salvaguardou o interesse público". Este foi o mote para o lançamento do livro intitulado 'Dossier Privatização da ANA - Assalto aos Aeroportos'.
Em declarações à TSF, Vasco Cardoso, membro da comissão política do comité central do PCP, explica que a importância da publicação advém do facto de a população ficar "sacudida com a espuma dos dias, onde os assuntos duram pouco mais do que um noticiário".
"Essa dispersão de informação não ajuda a olhar para aquilo que são as grandes questões que atravessam o nosso tempo", sustenta.
Foi assim que, após a oportunidade de "reunir um conjunto de informação rigorosa e auditável sobre todo o processo de privatização da ANA" e depois de verem chumbada na Assembleia da República a proposta para a criação de uma comissão parlamentar de inquérito a essa privatização, os comunistas começaram a "desenhar a possibilidade da realização de um livro, que traduzisse em texto" aquilo que consideram ser "um assalto aos aeroportos, que está neste momento a acontecer".
Mas Vasco Cardoso rejeita a ideia de que a publicação serve apenas para responsabilizar politicamente os Executivos socialistas e sociais-democratas. Mais do que isso, a verdadeira intenção é poder contribuir para a "exigência relativamente ao futuro": "Porque esse assalto não pode continuar."
"A responsabilização política é evidente que é necessária, mas a privatização da ANA foi há 12 anos e, na altura, a ANA foi vendida - ao contrário do que o Governo de então afirmou -, por cerca de mil e duzentos milhões de euros. No período que se correu, a ANA já alcançou praticamente dois mil milhões de euros de lucro. Isto é, a Vinci já pagou aquilo que entretanto pagou pela empresa e tem pela frente mais umas décadas de exploração dos aeroportos", salienta.
O comunista aponta, por isso, que, através da análise feita pelo Tribunal de Contas, é possível concluir que este foi um "negócio absolutamente ruinoso para os interesses nacionais", que vai permitir à Vinci "meter nos bolsos dos seus acionistas mais de 20 mil milhões de euros de lucro".
"Não estamos, por isso, a pensar apenas num ajuste de contas quanto à responsabilidade política", assegura.
O "assalto" feito na altura da privatização da ANA, diz, "continua todos os dias" e entende que isso é visível desde logo nos aumentos "significativos" das taxas aeroportuárias, que acarreta como consequência a redução "de forma muito significativa do investimento por parte da ANA".
"E essa é a segunda vaga do assalto que está a ser desenhada neste momento, a propósito da exigência da construção de um novo aeroporto. Ou seja, a ANA é privatizada sob a ideia de que isso era uma forma de se construir um futuro aeroporto e isso não se concretiza", denuncia.
Vasco Cardoso afirma ainda que a construção do novo aeroporto está "empancada durante estes anos todos" por uma única razão: "A Vinci não está interessada em sair de Lisboa e agora que se perspetiva a construção de um futuro aeroporto - porque naturalmente é insustentável a situação que está colocada em cima da mesa -, a Vinci vem dizer que além dos 20 mil milhões de euros que pretende ganhar com o atual contrato, quer mais 30 anos de concessão."
Acusa, por isso, a concessionária francesa de querer "agravar ainda mais as taxas aeroportuárias" e de "obrigar" o Estado a assumir um "conjunto de responsabilidades do ponto de vista financeiro, que garantam que a Vinci só virá a ter lucros no futuro".
Lamenta ainda que a edificação do Aeroporto Luís Camões, no Campo de Tiro de Alcochete, "em vez de já estar construído", esteja a ser projetado para 2037.
O livro é, assim, "um problema de denúncia do que está para trás, de responsabilização do PS, PSD e CDS por essa situação", mas sobretudo "de exigência relativamente ao futuro, porque esse assalto não pode continuar".
Afirmando uma "visão integrada para o setor aéreo", o comunista utiliza o facto de apenas quatro países da Europa terem privatizado os seus aeroportos para poder afirmar que Portugal foi sujeito a um "grau de experimentalismo".
"Grandes países como Alemanha e França não foram por esse caminho - e bem. É uma infraestrutura estratégica, que deve estar ao serviço do desenvolvimento da atividade económica nacional", justifica.
Além da privatização dos aeroportos, lamenta a intenção de seguir o mesmo caminho com a TAP, alertando que esta é a "principal cliente da ANA".
"Se houve empresa que foi prejudicada com o aumento das taxas aeroportuárias e com esta privatização que se desenvolveu foi a TAP. A TAP foi saqueada pela Vinci ao longo destes anos de privatização dos aeroportos, na medida em que é o principal cliente", defende.
O comunista argumenta que "entregar" uma companhia aérea, que foi recapitalizada, está a aumentar a sua atividade e obtenção de lucro, de "bandeira" é um "crime económico de igual dimensão àquele que foi cometido com a privatização dos aeroportos".