O dia de todos os santos é dia de recordar os mortos e de homenageá-los. A TSF ouviu a psicóloga Cristiana do Nascimento sobre como viver melhor este dia e os períodos de luto que são inevitáveis, mas de que pouco se fala
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Mitos
A ideia de que só a morte de alguém desencadeia um processo de luto. Não é assim. Por vezes faz-se o luto de pessoas vivas, num divórcio, por exemplo, numa perda de autonomia, no diagnóstico de uma doença grave.
Outro mito é que o processo de luto passa por uma sequência exata de fases. Não é verdade. Por vezes as fases acontecem em simultâneo. O luto, sendo um processo universal, é vivido de forma individual.
Durante muito tempo achava-se que a pessoa de luto tem de chorar, mas cada pessoa tem formas diferentes de manifestar tristeza, de viver as emoções, e não passa necessariamente pelo choro.
Termos de ser muito fortes para atravessar um processo de luto, também é definitivamente um mito. A tristeza e o sofrimento não são sinais de fraqueza. A tristeza é uma reação natural e expetável perante uma perda.
O luto não é sempre sinónimo de depressão, ao contrário do que por vezes se pensa. E há ainda a questão do vestir de preto, associado ao luto. Cada vez mais as pessoas estão a tentar afastar esse preconceito.
Como apoiar quem está a fazer o luto
É estar presente, é apoiar e isso, por vezes, pode ser apenas estar lá para escutar, estar disponível para ouvir. Pode ser estar disponível para fazer alguma tarefa burocrática, retirar o peso de alguma obrigação.
Devemos acompanhar essa pessoa, nomeadamente a cerimónias fúnebres ou religiosas. Sobretudo estar presente e disponível, não só para falar sobre a morte e sobre o luto, mas passa muito por aí, por estar lá de todas as formas que possam ajudar.
Luto prolongado
Nos adultos, quando as características do luto se mantêm muito acentuadas mais ou menos 12 meses após a morte da pessoa. Quando se prolongam as manifestações de grande tristeza, quando continua a haver incapacidade de ser funcional, muita rejeição e grande negação da morte. Mantém-se a dificuldade de retomar o trabalho, de estabelecer relações sociais. Tudo isto indica que se está perante um luto prolongado.
Nas crianças e adolescentes, considera-se que é luto prolongado quando estas atitudes e sentimentos se prolongam para lá dos seis meses.
Falar sobre a morte
Culturalmente silenciamos a morte e não falamos sobre ela. Nas conversas sociais, familiares, é um tema tabu. Mas é um assunto do qual deveríamos falar cada vez mais. É a única certeza que temos na vida, que um dia vamos morrer. E falar sobre a morte, desconstruir a morte, é muito importante para depois fazermos processos de luto saudáveis.
Sobretudo pelo medo, muitas pessoas não falam porque não querem sequer confrontar-se com a morte; com a sua própria morte ou com a morte do outro, com a morte das pessoas que amam. Há esta dificuldade em imaginar esse confronto, por isso evita-se falar sobre a morte.
Seria muito importante desconstruir para conseguirmos viver o luto de uma forma mais pacificada. E a vida também, naturalmente. Vivemos, muitas vezes, angustiados com o medo da morte.
(Re)visitar os mortos
Muitas pessoas têm rituais de homenagem a quem já morreu, seja através de idas ao cemitério, seja através de celebrações religiosas, seja a ir a locais significativos para a pessoa, e sim, é uma forma de relembrar, de homenagear.
Quando as pessoas se sentem confortáveis com isso, é isso que devem fazer, é viver este dia de forma o mais positiva possível, com a recordação e a lembrança da pessoa que morreu, mas também celebrando-a e homenageando-a.
Luto patológico
Quando as pessoas continuam com uma tristeza muito profunda, muito marcada. Quando não conseguem falar da pessoa que morreu, quando estão ainda num contexto de grande negação, de grande raiva, de grande revolta.
Também quando não reaparece o sentimento de prazer em coisas que anteriormente eram prazerosas ou não se vislumbra um novo significado para a vida, por exemplo, tudo isto são questões que nos devem manter em alerta.