Foram buscar o melhor dos melhores. Os olheiros do Vaticano certamente que ponderaram no currículo invulgar de um madeirense, imerso há meio século nas águas da cultura, da bíblia e da poesia.
Corpo do artigo
José, criança retornada de Angola, em 1975, recebeu luzes da avó analfabeta, a quem chamou de sua primeira biblioteca da vida. Lisboa, a cidade, abriu-lhe os olhos ao mundo... Sempre encostado à cultura, depressa viu a palavra impressa, de poesia feita, sem gastar, em demasia, a religião... Entre a Universidade Católica e a telúrica Capela do Rato, resguardado das polémicas, preferiu sempre o debate na construção de pontes.
Um dia soltou-se o mistério: Tolentino, de pregador do Sumo Pontífice a arcebispo arquivista e bibliotecário da Santa Sé foi um passo, para receber do papa argentino, o convite para ser seu conselheiro. O filho de um pescador chega agora a cardeal, o segundo mais novo nesta série, o terceiro de Portugal no pontificado de Francisco, arcebispo José, cardeal Mendonça, ao serviço de sua Santidade.
11373549
Aqueles que com ele conviveram falam num homem carismático, filósofo e poeta, mas também um arquiteto de pontes. De alguém que, nos últimos anos, levou muita gente desinteressada a interessar-se pela palavra da Igreja Católica.
António Marujo, diretor do jornal digital religioso "7 Margens", considera que Tolentino Mendonça é capaz "de fazer pontes com mundos muito diferentes". "Tem a capacidade de chegar onde, muitas vezes, a hierarquia católica não chega, não é capaz de chegar ou não quer mesmo chegar", declara o jornalista.
TSF\audio\2019\10\noticias\04\antonio_marujo_1_tolentino_construtor
Já Edgar Silva, antigo padre e conhecido político comunista, que foi colega de escola e de seminário de Tolentino Mendonça, lembra o trabalho que fizeram juntos enquanto jovens padres. Em 1992, ambos estiveram envolvidos no manifesto "Mais e Melhor Democracia", que abalou a política e a igreja da Madeira.
"Era uma reflexão, uma leitura da realidade, que apontava desafios à própria sociedade e à nossa intervenção. Foram iniciativas com significado na nossa ideia de que os cristãos não podiam ficar de braços cruzados, mas assumir as exigências da participação e da transformação da sociedade", explica.
TSF\audio\2019\10\noticias\04\edgar_silva_1
Pedro Mexia, amigo de Tolentino Mendonça - e, tal como ele, poeta -, recorda que conheceu o futuro cardeal quando estudava na Universidade Católica. Desses tempos, Mexia lembra a capacidade fora do comum do capelão para motivar pessoas que nunca tinham manifestado interesse pela palavra da Igreja Católica.
"Há pessoas que estão muito distantes daquele universo que se sentem particularmente interpeladas, às vezes, simplesmente, pela maneira como ele diz as coisas", refere Pedro Mexia. "Na verdade, não é muito diferente do que acontece com o atual papa, que também gera uma boa vontade inacreditável em pessoas que nunca a mostraram em relação aos assuntos religiosos", compara.
TSF\audio\2019\10\noticias\04\pedro_mexia_2
*com Manuel Vilas Boas e Nuno Guedes