O presidente dos Médicos do Mundo admite que possa ter havido mais casos de violência, pelos inspectores do SEF. Em entrevista à TSF, Fernando Vasco refere um "dragão por trás da secretária" de quem exerce o poder e acredita que a violência poderia ter sido evitada.
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"Não foi por falta de aviso", afirma o presidente dos Médicos do Mundo em Portugal.
Foi na sala atribuída aos Médicos do Mundo (MdM) no aeroporto de Lisboa, que Ihor Homenyuk terá sido espancado até à morte, mas a organização nunca soube de nada.
O presidente, Fernando Vasco, garante que "nunca vimos o senhor, o nome de Ihor Homenyuk nunca aparece na lista", entregue pelos Serviços de Estrangeiros e Fronteiras à equipa que presta assistência médica aos passageiros retidos no EECIT (Equipamento Equiparado ao Centro de Instalação Temporária) do Aeroporto de Lisboa.
A enfermeira Celmira Magno, que coordena o trabalho dos MdM, no EECIT de Lisboa, explica que vai três vezes por semana ao aeroporto, onde recebe uma lista de pessoas que devem ser avaliadas. No caso de Ihor Homenyuk, os MdM nunca foram chamados. Celmira notou apenas que o gabinete "estava desarranjado" e ficou surpreendida quando soube das agressões, pela imprensa. "Ninguém está à espera que, no gabinete onde trabalha, se mate alguém ou que alguém morra, é traumatizante", confessa à TSF.
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No relatório do Mecanismo Nacional de Prevenção Contra a Tortura, em 2018, a Provedoria de Justiça já tinha apontado os problemas nos EECITs como "factores de risco para ocorrência de tortura e maus-tratos". Por isso, o presidente dos MdM afirma que "não foi por falta de aviso". Fernando Vasco assume que ficou chocado com a morte do cidadão ucraniano, mas nota que "uma estrutura policial ou militar tem sempre um ambiente diferente", onde "quem está, tem poder e quem chega se encontra em situação de menoridade". Quando este ambiente não é controlado, acrescenta, "estas coisas acontecem com muita facilidade. É o dragão por trás da secretária" de quem exerce o poder.
Questionado pela TSF, Fernando Vasco admite que a violência sobre Ihor Homenyuk "poderá não ter sido caso único" e defende uma mudança no SEF. De resto, as condições no EECIT do aeroporto de Lisboa já melhoraram. "O espaço não era bom", descreve o presidente dos MdM. Agora, as camaratas foram substituídas por quartos individuais e, devido à Covid-19, os passageiros já não ficam retidos no aeroporto, quando antes, um migrante "chegou a ficar 70 dias". Por parte dos MdM, "não mudamos o essencial, mas passamos a olhar de forma diferente", salienta Fernando Vasco. Estão agora, mais atentos, de olhos mais abertos.
* A jornalista escreve ao abrigo do antigo Acordo Ortográfico