Associação pede que o alcatrão recém-colocado em Santiago de Riba Ul seja removido.
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O alcatroamento de 70 metros de uma estrada antiga apontada como datando do período da ocupação romana está a gerar preocupação em Oliveira de Azeméis, revelou esta quinta-feira a associação local que quer a autarquia a preservar esse património.
Em causa está uma via que, nesse concelho do distrito de Aveiro, foi recentemente coberta com material betuminoso, o que elementos da Associação Dona Urraca Moreira (ADUM) consideram um "erro grave" em matéria de preservação arqueológica e atribuem ao "desconhecimento e desinteresse" da Câmara sobre o assunto.
"Não se percebe porque é que quiseram alcatroar esta calçada em Santiago de Riba Ul, onde não havia necessidade nenhuma disso, já que não passam lá carros e a via quase não tem utilização. Do que esse caminho precisava era de limpeza e parece que só o alcatroaram para depois não terem que andar a perder tempo a ir lá cortar as ervas de vez em quando", disse à Lusa o porta-voz da ADUM, André Santos.
Fundada em 2010 para estudar e valorizar o património arqueológico do município, a associação defende que no território de Oliveira de Azeméis há muitos mais troços de estrada datados da era romana e lamenta que a autarquia não invista na sua preservação, para efeitos de valorização histórica e turística.
"Já reunimos com o presidente da Câmara e ele admitiu o erro, dizendo que a calçada de Santiago não estava sinalizada como património, mas isso só demonstra que há lá alguém que não anda a fazer o seu trabalho em condições ou não lê os documentos como devia", argumentou André Santos, referindo que em mandatos anteriores a existência da via estava devidamente identificada.
O porta-voz da ADUM espera que a situação possa agora ser reanalisada e corrigida, para que o alcatrão recém-colocado em Santiago de Riba Ul seja removido e se devolvam os 70 metros de via romana ao seu estado original.
"Aquilo não pode ter resistido 1.500 anos para agora desaparecer só porque uma ou duas pessoas fizeram asneira", defendeu.
A associação está disposta, por isso, a "colaborar com a Câmara para que situações destas não voltem acontecer no futuro" e se possa equacionar até a criação de "um museu municipal dedicado em específico a arqueologia", dado que "há muito património nessa área disperso pelo concelho e a precisar ser escavado, estudado e preservado".
André Santos realçou que esse trabalho deveria iniciar-se com "um registo oficial das antigas calçadas que ainda existem em Oliveira de Azeméis", para o que disponibiliza como base os dados já recolhidos pela ADUM, "fruto do trabalho de campo que membros da associação vêm realizado desde 2012 e que, até ao momento, já identificou mais de 2.500 metros de calçadas [romanas e reais] distribuídos por 27 localizações diferentes".
Grande parte dessas vias terá sido construída "no período da Romanização e na Idade Média" e é vestígio de uma rede viária "constituída por dezenas de quilómetros" através do território do concelho.
"Não são simples caminhos locais - estamos a falar de estradas que entravam e saíam do concelho, e só uma autoridade forte e com um vasto domínio do território poderia construir estruturas deste género", salientou.
Contactada pela Lusa, fonte oficial da autarquia informou que "a Câmara não tem conhecimento nem registo de que o caminho intervencionado está classificado como de salvaguarda pública", uma vez que o troço em causa "não está inventariado no Plano Diretor Municipal como área de interesse patrimonial ou arqueológico".
Reconhecendo que o percurso na origem da discussão "é utilizado por transeuntes para circular a pé", a autarquia explica ainda que a pavimentação se verificou "após várias reclamações por parte dos seus utilizadores".
A mesma fonte acrescenta que, "sempre que a autarquia tem conhecimento concreto do interesse patrimonial, solicita parecer à Direção-Regional de Cultura do Norte".
"Para evitar futuras situações desta natureza, a Câmara irá trabalhar em articulação com associações locais na identificação de eventuais troços de calçada romana que não estejam ainda devidamente identificados e salvaguardados nos instrumentos territoriais", conclui.