Como se esperava, poucas divergências foram assinaladas no frente-a-frente entre Ana Gomes e Marisa Matias. Focos de maior discordância relacionados com a área da defesa. Pelo meio: a vontade de Ana Gomes em ter uma convergência à esquerda pré-eleições?
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"Antes do dia seguinte às eleições há o dia anterior e não é por mim que não haverá convergência à esquerda". A frase aparece solta no meio do debate e não teve réplica de ninguém presente no estúdio, mas fica no ar a vontade de Ana Gomes de uma candidatura conjunta à esquerda? A resposta não surgiu no debate com Marisa Matias, como também não surgiram divergências de fundo.
Entre acenos de cabeça em concordância em várias matérias (e o sublinhar de "lutas" juntas no Parlamento Europeu), poucos foram os temas em que as duas candidatas provaram uma grande discórdia.
Ana Gomes tenta marcar as diferenças puxando três temas: Orçamento do Estado, Euro e Defesa. Mas, ainda assim, as diferenças não ficam muito vincadas.
No caso do Orçamento, Marisa Matias é acusada de contradições pelo facto de ter dito que, se fosse eleita, não vetaria a lei numa postura contrária àquilo que foi a posição do Bloco de Esquerda. Questiona Ana Gomes: "onde é que ficavam os mais vulneráveis deste país se de facto tivéssemos ficado à mercê de duodécimos?"
Elencando "as crianças em risco de pobreza, os jovens em precariedade, os idosos em insegurança e as mulheres que são as mais afetadas pela pandemia", a antiga eurodeputada aponta o dedo a Marisa Matias para perceber onde é que estas pessoas "ficavam se não houvesse recursos no OE para acorrer de emergência e minorar os problemas".
A candidata apoiada pelo Bloco não se fica e nega quaisquer contradições. À cabeça, Marisa Matias aponta a questão das leis laborais e a necessidade de ter os dados da auditoria ao Novo Banco antes de quaisquer transferências do Fundo de Resolução e questiona o posicionamento de Ana Gomes, algo que a própria ex-deputada considera que acompanhava a posição do Bloco.
"Não há nenhuma contradição entre dizer que a urgência que enfrentamos, as dificuldades e pessoas que já estão sem apoios sociais e que não estão protegidas com os direitos laborais, dizer que isto não é suficiente e, ao mesmo tempo, olhar e perceber que, não sendo um orçamento inconstitucional, eu não o vetaria", conclui Marisa Matias.
No caso da moeda única, Marisa Matias não se alonga, mas nota que esteve em divergência com Ana Gomes em questões relacionadas com a governação económica.
Já no capítulo da Defesa, Ana Gomes começa por realçar que "as questões da segurança e da defesa são demasiado importantes para serem deixadas à direita, incluindo à direita do PS". Aí, vinca que "fazia todo o sentido" questionar "o estado em que estão as nossas Forçar Armadas, se não precisam de ser redimensionadas, se não precisam de ter uma política de recrutamento aberta às mulheres e a minorias, que são normalmente discriminadas, se não precisam de ser devidamente equipadas face às ameaças que não são hoje as convencionais, que são as da cibersegurança, ciberdefesa, proteção das infraestruturas críticas e do nosso mar".
Ana Gomes elenca ainda o papel das Forças Armadas no combate aos incêndios e à pandemia para demonstrar a diferença face à candidata bloquista para quem "o maior problema de Defesa que temos na UE é a segurança e a proteção das pessoas".
"São os milhares de refugiados que já perderam a vida e, em relação a isso, acho que também há acordos como o com a Turquia que até Francisco Assis, apoiante de Ana Gomes, disse que era um acordo sórdido. Eu acho que esses são verdadeiramente os problemas de defesa na UE", nota Marisa Matias para quem tudo o resto deve ser feito na base da cooperação.
"Não acho que os exércitos dos diferentes países europeus devem estar ao serviço dos exércitos mais fortes como o alemão ou o francês", destaca Marisa Matias.
Polémica com a Ministra da Justiça? "Grave"
Num outro ponto em que ambas as candidatas estiveram de acordo é o da necessidade de ouvir mais explicações da parte da Ministra da Justiça no parlamento acerca da nomeação do procurador europeu José Guerra.
Ana Gomes diz que é contra "a banalização de pedidos de demissão de ministros", realça que isso é competência do primeiro-ministro, mas lembra que já há meses que vem alertando para a gravidade do assunto. Pior: Ana Gomes sublinha que "da Hola ao Politico isto está nas bocas do mundo e é inconveniente, sobretudo quando começamos a presidência da UE".
Já para Marisa Matias são necessárias explicações porque "há imensas contradições" num caso que considera ser "vergonhoso" e que dá uma "péssima imagem", mas nota que é preciso escutar as explicações de Van Dunem na Assembleia da República para poder tirar mais conclusões.