"Obviamente, apresentei a demissão." Costa abandona liderança do Governo e não se recandidata
António Costa é alvo de uma investigação autónoma do Ministério Público num inquérito instaurado no Supremo Tribunal de Justiça, mas garante que "não lhe pesa na consciência "a prática de qualquer ato ilícito".
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O primeiro-ministro, António Costa, anunciou esta terça-feira que apresentou a demissão do cargo na sequência da abertura de um inquérito, pelo Supremo Tribunal de Justiça, à sua conduta nos negócios do lítio e hidrogénio verde, e anunciou que não tenciona recandidatar-se.
"Obviamente, apresentei a minha demissão a sua excelência o senhor Presidente da República" e "a demissão foi aceite", revela Costa. Cabe agora ao Presidente da República "ponderar qual é a data a partir da qual produz efeitos a demissão". Até lá, garante, vai manter-se "em funções até ser substituído".
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O primeiro-ministro garante que se dedicou "de alma e coração a servir os portugueses" e que "estava disposto" a cumprir o mandato "até ao termo desta legislatura".
Uma coisa é certa desde já, António Costa não vai voltar a entrar na corrida a São Bento. "Não me vou recandidatar ao cargo de primeiro-ministro. Foi uma etapa que se encerrou", esclarece.
"Fui hoje surpreendido com a informação oficialmente confirmada de que já foi, ou irá, ser instaurado um processo-crime contra mim", afirma António Costa, assegurando: "obviamente estou totalmente disponível para colaborar com a justiça".
Aos portugueses, o primeiro-ministro garante que não lhe pesa na consciência "a prática de qualquer ato ilícito ou sequer censurável" e que confia na justiça "e no seu funcionamento".
Por entender que a "dignidade" das funções de primeiro-ministro "não é compatível" com estas suspeitas, "obviamente", diz, apresentou a demissão ao Presidente da República.
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"Ninguém está acima da lei"
Em resposta às perguntas dos jornalistas, António Costa afirma que compete ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, decidir os próximos passos, sublinhando que "a última coisa" que fará será "condicionar a decisão do Presidente".
"O Presidente da República não questionou as minhas razões, compreendeu e disse que iria tomar as providências necessárias à demissão do primeiro-ministro", diz.
Sobre a justiça em Portugal, Costa sublinha que teve oportunidade de a "servir" em várias funções e diz orgulhar-se "muito" de que os instrumentos essenciais para o combate ao crime tenham contado com o seu contributo.
"Orgulho-me muito de ser o líder do partido que contribuiu para desenhar o nosso sistema de justiça", assinala também, sublinhando que a Polícia Judiciária disse recentemente que "nunca teve tantos meios".
"Ninguém está acima da lei e ninguém se pode intrometer na aplicação da lei, seja um autarca, seja um ministro, seja um primeiro-ministro. Se há uma suspeição, as autoridades judiciais são livres para investigarem", garante, acrescentando sobre si que, como qualquer outro titular de cargo político, não está acima da lei.
Confiança e sacrifícios: os agradecimentos
"Neste momento, permitam-me agradecer em primeiro lugar aos portugueses pela confiança que em mim depositaram ao longo destes anos e pela oportunidade que me deram para liderar o país".
Costa agradece também aos titulares de órgãos de soberania, ao Presidente da República, à Assembleia da República, às regiões autónomas, às autarquias, aos parceiros sociais e a "todos e todas aqueles que serviram nos três governos" que liderou.
Deixa também uma palavra aos líderes e dirigentes dos outros partidos, "muito especialmente ao Partido Socialista".
"Por fim, uma palavra muito sentida de agradecimento à minha família, em especial à minha mulher", a quem Costa agradece, já com a voz embargada, o "grande sacrifício pessoal".
"É uma etapa que se encerra, foram quase oito anos aos quais dediquei toda a minha energia", sublinha.
Antes de se ter sabido que António Costa se preparava para falar ao país ao início da tarde, o primeiro-ministro saiu do Palácio de Belém, em Lisboa, após uma reunião com o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que durou cerca de dez minutos.
O primeiro-ministro foi filmado pelas televisões a entrar no Palácio de Belém poucos minutos antes das 13h00 pela entrada da Calçada da Ajuda e a sair perto das 13h10, pela mesma porta.
De manhã, o chefe de Estado recebeu António Costa a pedido deste, na sequência de buscas em gabinetes do Governo, incluindo na residência oficial de São Bento, visando o chefe de gabinete do primeiro-ministro, Vítor Escária, que foi detido para interrogatório.
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"No decurso das investigações surgiu, além do mais, o conhecimento da invocação por suspeitos do nome e da autoridade do Primeiro-Ministro e da sua intervenção para desbloquear procedimentos no contexto suprarreferido. Tais referências serão autonomamente analisadas no âmbito de inquérito instaurado no Supremo Tribunal de Justiça, por ser esse o foro competente", lê-se numa nota divulgada esta terça-feira pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
Galamba arguido
O ministro das Infraestruturas, João Galamba, foi constituído arguido pelo Ministério Público num inquérito relacionado com os negócios do lítio e hidrogénio verde, a par do Presidente do Conselho Diretivo da Agência Portuguesa do Ambiente, Nuno Lacasta.
De acordo com a PGR, estarão em causa os crimes de prevaricação, de corrupção ativa e passiva de titular de cargo político e de tráfico de influência.
A investigação visa as concessões de exploração de lítio nas minas do Romano (Montalegre) e do Barroso (Boticas), um projeto de central de produção de energia a partir de hidrogénio em Sines e o projeto de construção de "data center" desenvolvido na Zona Industrial e Logística de Sines pela sociedade "Start Campus".
