APA dá luz verde (condicionada) à captação de água para abastecer Algarve. Ambientalistas criticam, autarcas aplaudem
A iniciativa visa assegurar "um regime de caudais ecológicos eficaz" e aumentar a capacidade disponível da albufeira de Odeleite, numa articulação entre Portugal e Espanha
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A Agência Portuguesa do Ambiente (APA) emitiu na segunda-feira uma declaração de impacto ambiental favorável à captação de água do rio Guadiana para abastecimento do Algarve, embora "condicionada ao cumprimento de um conjunto de condições".
Em comunicado, a entidade adiantou que o parecer técnico da comissão de avaliação reunida para o efeito foi elaborado após um período de consulta pública de 30 dias para o estudo prévio de um projeto destinado à captação de água no Pomarão, aldeia do concelho de Mértola, distrito de Beja.
Integrado no Plano Regional de Eficiência Hídrica do Algarve e orçamentado em cerca de 61,5 milhões de euros, com financiamento do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), o projeto contempla a construção de uma conduta enterrada, de cerca de 40 quilómetros, até a água ser restituída à albufeira de Odeleite, no concelho de Castro Marim, distrito de Faro.
A APA alega que a iniciativa visa assegurar "um regime de caudais ecológicos eficaz" e aumentar a capacidade disponível da albufeira em causa, numa articulação entre Portugal e Espanha, e refere que o licenciamento e a concretização do projeto apenas poderão ocorrer "após emissão da decisão de conformidade ambiental do projeto de execução".
A Ministra do Ambiente e Energia, Maria da Graça Carvalho, informou, em 06 de agosto, que Portugal e Espanha vão assinar um acordo final quanto à captação de água no Pomarão, na fronteira luso-espanhola, no dia 26 de setembro, em Madrid.
Em 09 de julho, a Comunidade Intermunicipal do Baixo Alentejo (CIMBAL), que integra 13 dos 14 municípios do distrito de Beja, sendo Odemira a exceção, aprovou uma tomada de posição contra a captação de água e exigiu que o projeto sirva também a população local.
A CIMBAL referiu então que o concelho de Mértola é "um dos territórios mais suscetíveis à desertificação" e debate-se "com escassez de água e elevado 'stress' hídrico, agravados por períodos de seca mais prolongados".
As críticas dos ambientalistas e os aplausos dos autarcas algarvios
As associações ambientalistas Zero e Plataforma Água Sustentável (PAS) também criticaram o projeto. Em declarações à TSF, Francisco Ferreira, presidente da Zero, considera que Portugal está a seguir uma estratégia errada para lidar com a seca.
"A Zero foi crítica do projeto por algumas falhas que continuam, no nosso entender, a existir. A primeira é que precisamos de trabalhar não apenas na oferta da água, mas, acima de tudo, na gestão da procura, na eficiência. E estruturalmente, essa é uma resposta que o Algarve ainda não tem. Nós tivemos planos de emergência para lidar com a seca, mas falta-nos realmente algo mais, numa perspetiva de longo prazo para as diferentes atividades, desde a agricultura ao consumo humano. Depois, há outro elemento também crucial que é a negociação com Espanha, que a senhora ministra já veio afirmar que vai ter lugar em setembro. Essas duas questões, a par das garantias de um caudal ecológico, para nós, eram essenciais para viabilizar o projeto e, portanto, há aqui uma antecipação de uma decisão que achamos que ainda falha por estas condições não estarem garantidas", sublinha.
Se, por um lado, os ambientalistas criticam, por outro, os autarcas vêm esta notícia com bons olhos. António Pina, presidente da Câmara Municipal de Olhão, que lidera a Comunidade Intermunicipal do Algarve, afirma, em declarações à TSF, que ficou satisfeito com a luz verde para a chegada ao Algarve de água do Pomarão.
"É mais um dos passos determinantes, que estavam previstos e que foram amplamente discutidos com as diferentes entidades portuguesas, mas falta ainda uma resposta mais concreta por parte do Governo sobre como está o acordo ibérico", afirma à TSF António Pina.
O presidente da Comunidade Intermunicipal do Algarve critica ainda as reservas dos ecologistas a esta decisão e fala em exagero e falta de bom senso.
"Os ecologistas deviam ser postos à prova e serem os primeiros, no caso de haver falta de água, a sofrer as consequências dessa racionalização, portanto, é falta de bom senso. A água é uma questão essencial na vida humana e temos de fazer, por vezes, algumas decisões que têm alguns impactos, mas sobre a captação da água no Pomarão, nem sequer estamos a falar de transvases, nem preocupações ambientais com contaminação de faunas e floras", acrescenta.
No âmbito da iniciativa de captação de água, o Ministério do Ambiente e Energia solicitou, no final de julho, à APA um plano para garantir o abastecimento público regular de água potável à freguesia do Espírito Santo, onde se encontra a localidade de Pomarão.
