"Aquilo que ele pensava estava primeiro." Alice Vieira conta que Balsemão sofreu pressões, mas recusou despedi-la do Diário Popular
A escritora explica à TSF que Francisco Pinto Balsemão "não tinha nada aquela ideia de patrão, a dar ordens"
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Alice Vieira recorda que Francisco Pinto Balsemão sempre defendeu com unhas e dentes os jornalistas com quem trabalhava. A escritora trabalhou no Diário Popular, que pertencia à família Balsemão.
"Ele queria sempre saber se me estavam a tratar bem. É evidente que havia problemas que ele não podia resolver que eram os problemas da censura, porque, naquela altura, ainda havia censura. Mas, tirando isso, se nós estávamos a trabalhar bem, se era preciso alguma coisa. Ele preocupava-se imenso. Tanto assim, e isto não era normal ou habitual, que os donos dos jornais terem um gabinete no próprio jornal, onde ele tinha e onde estava sempre. Portanto, qualquer coisa nós já sabíamos que lhe podíamos bater à porta para ele resolver, mas nós fazíamos isso muito poucas vezes. Ele é que era ao contrário. Ele é que saía muitas vezes de lá para ver se estava tudo a correr bem, se precisávamos de alguma coisa. Ele interessava-se muito pelo nosso trabalho e pelas pessoas", conta Alice Vieira à TSF.
Desses tempos lembra quando Balsemão recusou despedi-la, apesar das pressões, um episódio demonstrativo dos valores de Balsemão: "Há aquela história de alguém ter ido junto dele para pedirem para me porem na rua e ele nem ouviu. E não era assim uma pessoa qualquer, era uma pessoa muito conhecida. Aquilo que ele pensava de nós estava primeiro. Se o nosso trabalho era bom, se nós éramos boas pessoas. O resto logo se via."
Alice Vieira diz que Balsemão sempre se comportou como um qualquer jornalista.
"Havia uma coisa que os jornalistas todos não costumavam dizer, mas deviam, que era que um jornal que se preze não circula com palavras fora de circulação. Quer dizer, aquelas palavras muito finórias, muito parvas, muito estúpidas. Naquela altura, às vezes os jornalistas punham-se assim a falar. Aquilo que nós devemos dizer é o máximo possível no mínimo de palavras e foi sempre isso que ele tentou transmitir-nos e que ele tentou ajudar-nos. Ele não tinha nada aquela ideia de patrão, a dar ordens. Era para nos ajudar, era quase um dos nossos. Estava ali, via o que é que estava mal e o que não estava", recorda.
Francisco Pinto Balsemão, antigo primeiro-ministro e fundador da SIC e do Expresso, morreu esta terça-feira aos 88 anos.