Atropelar e fugir é "sinal de degradação ética". São precisas penas mais pesadas para que condutores não pensem que "se safaram"
No Fórum TSF, vários especialistas consideram "uma calamidade" o "desastre" que aconteceu em Oeiras. Redução da velocidade e segregação das vias são medidas essenciais a implementar. Mas, para o Automóvel Club de Portugal, a construção "à balda" das ciclovias em Lisboa também constitui um problema
Corpo do artigo
Após três ciclistas terem sido atropelados, no domingo, na Marginal de Oeiras, em Lisboa, e o condutor ter fugido, é unânime entre representantes de várias associações que é preciso mudar regras e as penas para quem comete este crime. No Fórum TSF, falam numa "degradação ética", a prova de que a "solidariedade social desapareceu".
O presidente da Prevenção Rodoviária Portuguesa pede um agravamento das penas para quem vai ao volante e se coloca em fuga depois de um atropelamento. Alain Areal apresenta estatísticas — "um em cada dez condutores foge quando atropela um peão" — para salientar que este tipo de situações tem acontecido cada vez mais.
Pede também uma "maior sensibilização das pessoas para o facto de que isto é um crime" e é punido em "diversas gravidades mediante as lesões [da vítima] e as circunstâncias em que ocorre, [por exemplo] sob influência de álcool".
Para Areal, é obrigatório a "segregação de vias", mas sobretudo a redução dos limites de velocidade nas cidades:
"Num atropelamento com uma velocidade de 30 km/h de impacto, o peão tem uma probabilidade de sobrevivência superior a 90%, enquanto se esse impacto for na ordem dos 50 km/hora, a probabilidade de sobrevivência é inferior a 20%."
Nesta linha, o presidente da Associação pela Mobilidade Urbana em Bicicleta, Mário Alves, defende que quem comete crimes, como atropelamento e fuga, deve passar o fim de semana na prisão ou fazer trabalho comunitário, como "vigiar florestas ou até ajudar as crianças a chegar à escola de bicicleta e a pé em segurança". A lei já chegou a prever este tipo de penas, mas tal não acontece agora.
Mário Alves sublinha que é preciso mais do que penas suspensas, que dão a sensação de impunidade ao réu. "Dizem aos amigos e aos familiares: 'Safei-me'", acrescenta.
Depois do episódio ocorrido em Oeiras, o presidente da Associação de Cidadãos Auto-Mobilizados fala num "sinal evidente de degradação ética e de que a solidariedade social desapareceu". A atitude de atropelar, colocar-se em fuga e "não assumir as responsabilidades devia ser um alerta fortíssimo para qualquer decisor", acredita.
Recusando a ideia de que se trata de um "acidente rodoviário", Manuel João Ramos vinca que, para evitar "desastres", são necessárias mudanças profundas na "infraestrutura mental" dos cidadãos. São igualmente essenciais medidas concretas, tais como "a redução da velocidade, a fiscalização e o reperfilar das vias".
Já o presidente da Federação Portuguesa de Cicloturismo e Utilizadores de Bicicleta lembra que as ruas não são apenas dos carros e a prioridade deve ser dada aos mais frágeis, no caso, os peões e as bicicletas. Para José Manuel Caetano, este episódio foi "uma calamidade" que coloca a nu um "problema nacional".
Na leitura do presidente da Federação Portuguesa de Ciclismo, a falta de civismo é a principal adversidade. O também ciclista Cândido Barbosa revela ainda que a federação vai lançar em breve uma campanha para chamar a atenção de todos para este assunto: "Sendo peões, andando de trotinete, de bicicleta ou de mota, conduzindo um camião ou um carro desportivo, seja o que for, somos todos seres vivos."
Do outro lado, o presidente do Automóvel Club de Portugal, Carlos Barbosa, culpa a falta de regras para os ciclistas no código da estrada, "porque deram liberdades, mas não deram deveres".
E aponta ao antigo autarca de Lisboa Fernando Medina pela construção "sem qualquer estudo, à balda" das ciclovias na capital: "Sem ligação umas com as outras, feitas de forma perigosa e criminosa."

