Partido apresenta projeto de lei para tentar ajudar a combater a crise na habitação proibindo a venda de imóveis a empresas ou cidadãos não-residentes no território nacional. Mariana Mortágua diz à TSF que o país vive numa "situação de urgência" e que a "ganância de quem quer lucro rápido" não se pode sobrepor ao direito à habitação.
Corpo do artigo
O primeiro artigo do projeto apresentado agora pelo Bloco de Esquerda é claro: "proibição da venda de imóveis em território nacional a pessoas, singulares ou coletivas, com residência própria e permanente ou sede no estrangeiro, por forma a combater a escalada de preços com a habitação".
Na base deste projeto está a crença de "a situação da habitação em Portugal configura uma crise" e que "é uma situação de urgência em que a maior parte das pessoas não consegue encontrar casa devido aos preços de compra ou de aluguer". Explica Mariana Mortágua que, no entender do partido, uma parte destas razões deve-se "à liberalização das rendas, à falta de proteção de quem procura arrendar uma casa, mas deve-se também à entrada de investidores estrangeiros, quer empresas, quer cidadãos de altos rendimentos provenientes de outros países, que são atraídos a Portugal através de benefícios fiscais".
"Discute-se hoje a proteção do direito à habitação dos residentes de um país relativamente a investidores estrangeiros que chegam com um poder de compra que não pode ser igualado pelos salários portugueses. É isso que se trata em Portugal, nós temos uma parte do parque habitacional cujos preços estão a ser inflacionados por rendimentos ou empresas que pagam à vista valores que são impossíveis tendo em conta os salários pagos em Portugal", sublinha Mariana Mortágua ao apresentar o projeto à TSF que visa então impedir o negócio "sempre que se situe em zonas de pressão urbanística" a não-residentes em território português.
Mortágua deixa claro que esta não é, naturalmente, "uma proibição de venda a estrangeiros". "Os estrangeiros podem comprar casa em Portugal desde que residam em Portugal", nota a deputada sublinhando que existem exceções previstas na proposta de lei que são "qualquer pessoa que tenha um cônjuge ou esteja unida de facto com alguém que viva em Portugal, um refugiado que vive em Portugal e que assim queira encontrar casa, e, obviamente, qualquer pessoa que tenha um visto de residência em Portugal".
Na apresentação do projeto, Mortágua destaca ainda que esta não é uma discussão inédita e lembra exemplos de países como Canadá ou Dinamarca, as ilhas de Palma de Maiorca e Ibiza ou ainda a Holanda "que também está a discutir medidas".
Novo ministério da Habitação vai mudar alguma coisa?
Com a Habitação a ser agora um ministério liderado por Marina Gonçalves, para o Bloco de Esquerda não se anteveem grandes alterações no combate à crise na habitação.
Mariana Mortágua afirma que "a criação do ministério da Habitação é muitas vezes apresentada como uma nova prioridade dada pelo governo à habitação", mas o Bloco não esquece "que a criação deste ministério advém de uma crise no governo e da solução encontrada pelo primeiro-ministro para esta crise".
"Não encontramos nas políticas do governo qualquer alteração daquele que tem sido o rumo do Partido Socialista nas questões de habitação. O PS continua a falar de habitação mas mantém todas as regras que estão a promover a especulação e que estão a promover uma inflação dos preços da habitação", vinca a parlamentar lembrando promessas de António Costa como o fim dos vistos gold.
Mas não só: "o regime dos residentes não habituais, que confere benefícios fiscais a residentes não habituais através da compra de casa, mantém-se; os benefícios fiscais aos fundos de investimento, mantém-se; acresce agora uma política de atração de nómadas digitais que tem como resultado uma inflação dos preços do imobiliário".
Além disso, Mariana Mortágua destaca que "as regras do arrendamento mantém-se, em larga medida, como o PSD e CDS as deixaram, com a lei Cristas a determinar a desproteção de quem procura casa". "Por isso, entendemos que a política do governo não tem dado uma resposta ao problema da habitação, a crise na habitação é cada vez pior, o alojamento local continua a pressionar os centros das cidades sem qualquer resposta de políticas públicas".
"É necessário haver políticas determinadas, nomeadamente através do controlo de rendas, através do controlo do alojamento local e também através da restrição da venda de casas a residentes em Portugal. Há um princípio aqui que se deve sobrepor a qualquer outro: o direito constitucional à habitação. A ganância de quem acha que o imobiliário é uma fonte de lucro rápido não se pode sobrepor ao direito constitucional que os residentes em Portugal têm a ter uma habitação digna a custos que sejam suportáveis pelos seus salários", conclui.