Filipa Faísca de Sousa, uma das mais carismáticas artesãs do concelho de Loulé, concebe bonecas que retratam ao pormenor um ofício, uma tradição ou mesmo um costume do Interior algarvio. Esta quinta-feira, a autarquia inaugura uma exposição.
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Filipa Faísca tira com todo cuidado do caixote cada um dos 63 bonecos que vão compor a exposição. "Agora estou juntando o trigo para mostrar como era a eira", explica.
A voz já lhe treme, mas a determinação dos seus quase 84 anos não a fazem desistir. Tem de estar tudo pronto para a inauguração desta tarde em Salir, freguesia do concelho de Loulé, que leva muito a peito a festa da Quinta-feira de Espiga.
Através dos seus bonecos, esta mulher gosta de contar histórias. "Isto é a sequência do pão, desde o homem que semeia até à mulher que amassa e coze no forno".
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Filipa Faísca faz bonecos que representam os ofícios que antigamente se viam no Interior algarvio. E para cada boneco constrói uma quadra. "Nos moinhos é moído / Depois de ser peneirado / Nos fornos é cozido / Depois de ser amassado". Canta as quadras de cor. Tem todas de memória.
Garante que já fez mais de 80 bonecos diferentes e perdeu a conta aos que construiu ao longo dos 30 anos em que se dedica a esta ocupação. Mora numa aldeia vizinha, em Querença, e com o seu trabalho quer fazer perdurar uma vida do Interior algarvio que já vai desaparecendo. "São vivências que eu conheci. Hoje está tudo diferente", lamenta.
O gosto por fazer bonecos que representam os vários ofícios começou por um desafio da sua filha. Pediu-lhe que construísse uma boneca como as que lhe fazia quando era criança. Filipa habituou-se desde pequena a não ter bonecas de loja. Com um tecido e uma pedra fazia qualquer coisa para brincar.
As bonecas que hoje concebe têm todos os pormenores. Até os mais escondidos. "Esta tem saiote e cuequinhas". Sorrindo, garante que só mostra o que está debaixo das saias das bonecas às senhoras.
Numa prateleira podem ver-se os apanhadores de azeitonas, os ferreiros, o peixeiro que andava de monte em monte e as crianças que anteriormente iam para a escola, levando pela mão rodas que faziam de carrinhos. "Faziam os próprios brinquedos. Agora as crianças só estão habituadas às 'tabletes', aquelas coisas de que eu nem sei o nome", diz esta anciã.
Quase a fazer 84 anos, Filipa Faísca tem ainda muita vontade de continuar a fazer bonecas e tanta outra coisa. "Quando calha ainda cozo pão no forno e amasso, semeio batatas, graças a Deus ainda faço o que for preciso".
A coleção de bonecas de Filipa Faísca foi recentemente adquirida pela autarquia de Loulé, que esta quinta-feira inaugura uma exposição no Posto de Turismo de Salir para dar a conhecer o trabalho sobre as tradições e cultura da serra.