A Comissão Europeia, que na quarta-feira colocou Portugal sob «monitorização específica» por desequilíbrios económicos excessivos, criticou a estratégia de consolidação orçamental seguida, que assenta em fatores cíclicos e «não facilita» o cumprimento dos objetivos de médio prazo.
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No relatório hoje divulgado sobre Portugal, que dá seguimento ao mecanismo de alerta (de desequilíbrios macroeconómicos) realizado em novembro no âmbito do calendário do Semestre Europeu, refere-se que as medidas discricionárias subjacentes à estratégia orçamental recente «têm sido substancialmente reduzidas», o que quer dizer que a diminuição do défice orçamental decorre «sobretudo da recuperação cíclica em curso».
Para Bruxelas, isto «não facilita» o cumprimento dos objetivos de médio prazo «nem ajuda a reduzir o nível elevado da dívida pública», lamentando ainda que os esforços de consolidação «tenham abrandado» desde o fim do programa de resgate.
Uma das críticas apontadas a Portugal foi o facto de o sistema de proteção social não ter sido capaz de lidar com o aumento da pobreza nos últimos anos.
O executivo comunitário afirma ainda que algumas das medidas tomadas recentemente pelo Governo, como o corte nos apoios sociais, «tiveram um impacto negativo no rendimento disponível», afetando «desproporcionalmente os mais pobres» e «as crianças com menos de 10 anos».
Outro aspeto em relação ao qual há margem para fazer «muito mais» é na melhoria do combate à evasão e à fraude fiscais, com Bruxelas a frisar que «a administração fiscal deve continuar a sua agenda de reformas e deve ser feito muito mais para melhorar o cumprimento das obrigações fiscais dos contribuintes».
Quanto à reforma do IRS, a Comissão admite que pode haver «um risco de que os agregados com rendimentos mais altos beneficiem mais do que aqueles com os agregados com rendimentos mais baixos» e, relativamente à reforma da Fiscalidade Verde, considera que é preciso garantir que «a competitividade e os investimentos não são afetados negativamente».
Na banca, o executivo comunitário deixou no entanto um aviso: os bancos portugueses têm uma «capacidade limitada» para suportar as perdas decorrentes de empréstimos em risco de incumprimento, os chamados créditos vencidos e de cobrança duvidosa, «sem injeções de capital adicionais».
A Comissão Europeia referiu-se também ao mercado de trabalho, defendendo que a criação de emprego em Portugal deverá abrandar e que a taxa de desemprego pode estabilizar em níveis muito elevados.
Os técnicos europeus alertam que, «olhando para a frente, a criação de emprego deverá abrandar e o crescimento do emprego deverá tornar-se mais alinhado com o crescimento do PIB».
Ainda em relação ao mercado laboral, Bruxelas estima que o número de trabalhadores que ganha o salário mínimo em Portugal mais do que duplicou entre 2005 e 2014, atingindo os 12,9%, e adverte que o impacto do aumento desta remuneração no emprego e na competitividade é «relativamente pequeno».
O executivo comunitário insistiu na necessidade de Portugal fazer mais reformas estruturais para melhorar a competitividade da economia portuguesa, nomeadamente nos setores da habitação e dos transportes, bem como no combate à corrupção.
No setor da eletricidade, a Comissão alerta que o preço pode subir mais de 3,3% este ano e que os aumentos possam ser superiores ao esperado nos próximos anos para que Portugal cumpra a meta de redução do défice tarifário em 2020.
Estas recomendações do executivo comunitário deverão ser analisadas pelos ministros das Finanças da EU (Ecofin) na reunião de março, apontando a Bruxelas que em maio será apresentado um novo pacote de recomendações específicas por país, já com base também nos programas nacionais de reformas dos Estados-membros.