Numa viagem de mais de 200 quilómetros, as sugestões desta quinta-feira passam por Colares, Lisboa e Odemira.
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Não faltam histórias em Sintra e os escritores portugueses e outros sabiam-no bem. Parece que o lugar atrai relatos únicos, mais ou menos romanceados. A do Barão Bodo von Bruemmer no Casal de Santa Maria é bem real e promete continuar. Entre Colares e a "guest House" Paraíso Escondido, são mais de 200 quilómetros. Recomenda-se uma paragem no Belcanto em Lisboa. Só para se perceber porque é que existe o conceito de "fine dinning".
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A calma reinava nas terras de Colares. Meados dos anos 60, a vida corria devagar no Casal de Santa Maria onde morava o barão Bodo von Bruemmer, oriundo do Báltico, prussiano, naturalizado alemão. Comprou a quinta em 1962 e plantou 5000 pés de rosas. Poucos anos mais tarde, um amigo da Alemanha que também morava em Portugal desafiou-o para comprar cabras da Namíbia e vender a sua carne. Depois das formalidades, que até envolveram um ministro português do interior, importaram 18 cabras. Dizia o amigo do barão que se cresciam muito depressa e reproduziam-se com facilidade. Tudo verdade. Em pouco tempo eram 240. O problema é que os portugueses não gostavam de carne de cabra e o negócio "milionário" foi por água abaixo.
Mais tarde o barão von Bruemmer foi operado na Suíça já com 96 anos. Acordou e nas primeiras declarações decidiu fazer vinho. A quinta tinha produzido vinho no início do século XX, mas as vinhas tinham sido abandonadas. Plantou 23 castas estrangeiras e dos 5000 pés de roseiras, ficaram "apenas" 700.
O barão morreu com 105 anos em 2016 e o neto Nicholas agarrou o sonho do avô. O novo barão estava na banca privada e na gestão de fortunas de famílias. De CEO da Hansa, onde trabalhou diretamente com Gerhard Swarovski da empresa joalheira, passou a agricultor no Casal de Santa Maria onde não prevê sair nunca mais.
Percebe-se porquê. Uma zona tranquila, no topo da serra, com vista para o Atlântico e vinhas, as mais ocidentais da Europa, que produzem o DOC Colares Branco Malvasia e o DOC Colares Tinto Ramisco, ambas castas da região. Jorge Rosa Santos e António Figueiredo são os enólogos com quem Nicholas vom Bruemmer trabalha e em conjunto fizeram o primeiro vinho de Nicholas, o rosé Mar de Rosas. O tinto Pinot Noir, os brancos Chardonnay, Arinto, Malvasia e Sauvignon Blanc, Riesling, uma casta alemã rara em Portugal, e ainda uma colheita tardia são algumas das pérolas da quinta.
Muitas estrelas
Falar de restaurantes e não referir o Belcanto é pecado. Ou quase. Foi o primeiro chef português a arrecadar duas estrelas Michelin no seu restaurante e não seria surpreendente que este ano aumentasse o número. Três estrelas Michelin seria a primeira vez em Portugal, uma vez que há apenas espaços (mais quatro) galardoados com duas estrelas.
Avillez gere 18 restaurantes (está outro a caminho no Dubai), mas é no Belcanto que tem a sua montra. É o mais exigente, onde o controlo é mais apertado, o mais afinado. É onde se realiza mais enquanto cozinheiro.
O Belcanto existe desde 1958, mas foi só em 2012 que José Avillez tomou conta do espaço. São dois menus de degustação, mas também há serviço à carta. Entre outros pratos, há leitão revisitado, cozido à portuguesa e carabineiro grelhado com cinzas de alecrim. Pudim abade de priscos e a famosa Tangerina, que é um sumo da própria fruta que chega em forma de bola, sólido, tratado com azoto líquido, recheado de espuma de tangerina, mas que se desfaz junto ao "tangerina curd", um creme especial.
A carta de vinhos tem mais de 350 referências e cerca de oitenta por cento são portugueses. O Belcanto fica no coração do chiado, no centro de Lisboa, da qual José Avillez tem opinião: "A luz, a vida, os bairros, as gentes. A história, o rio, a terra, o mar. Aqui vivemos, aqui crescemos. Aqui nos inspiramos, aqui caminhamos. A cozinha é o nosso fado, a nossa forma de expressão."
Escondido e ainda bem
Berny Serrão e Glenn compraram uma casa no Alentejo, perto de S. Teotónio, onde convidavam amigos. Raramente estavam apenas o casal e a filha.
Berny nasceu em Moçambique, estudou na África do Sul onde trabalhava em publicidade. O inglês Glenn, também ele da área de publicidade e marketing conheceu-a na terra de Mandela. Foram morar para Londres onde nasceu a filha Gisela, mudaram-se para Singapura e acabaram no Alentejo, onde Berny identificou uma terra que lhe matou as saudades de África e onde reconheceu semelhanças.
Em 2008 decidiram avançar para uma "Guest House", mas as burocracias e lentidão típica em processos semelhantes atrasou a abertura para 2014, altura em que nasceu o Paraíso Escondido. A história é muito familiar e poderia até ser semelhante a outras, mas há uma particularidade que a faz sobressair: a forma como recebem os clientes, a beleza e tranquilidade e a atenção especialíssima de Berny pelos pormenores. Por vezes não se repara, mas em conjunto o resultado é surpreendente. A pedido é possível que se possa almoçar ou jantar, o que é uma possibilidade que convém incluir.
A propriedade de luxo é tipicamente alentejana com 10 quartos, todos com casa de banho privativa e acesso direto ao jardim, pátio e piscina. Não é "de caras" dar com o monte alentejano, a menos de 20 quilómetros da praia, e ainda bem.
"Boa Vida", com Augusto Freitas de Sousa. Para ouvir todas as quintas-feiras na antena da TSF, depois das 20h00, e em permanência na página do programa no site da TSF.