"Catástrofe" e "manobra de castigo". Governo quer criar normas de incompatibilidade para médicos que trabalham como tarefeiros
Em declarações à TSF, o bastonário da Ordem dos Médicos refere que a medida só vai afastar mais os médicos do SNS. Também a Federação Nacional dos Médicos defende que, assim, o SNS vai perder médicos "por capricho"
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O Governo quer criar normas de incompatibilidade para os médicos que trabalham como tarefeiros. Ouvidos pela TSF, a Ordem dos Médicos receia que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) esteja a caminhar para uma "catástrofe" a nível de recursos humanos, já a Federação Nacional dos Médicos (Fnam) acusa a tutela de querer castigar os médicos, em vez de dar-lhes melhores condições de trabalho.
Segundo o semanário Expresso, que cita a versão preliminar do decreto-lei do Ministério da Saúde, os recém-especialistas que não concorram ao SNS ou que recusem uma colocação no serviço público não poderão ser contratados como prestadores de serviços. O mesmo acontece para os médicos que se desvincularam do SNS nos últimos três anos.
Em declarações à TSF, o bastonário da Ordem dos Médicos considera que há desigualdades a serem corrigidas, mas não desta forma. Carlos Cortes argumenta que a medida só vai afastar mais os médicos do SNS.
"Não temos sequer prestadores de serviço suficientes para cobrir a esmagadora maioria das necessidades do Serviço Nacional de Saúde. Se, mesmo aí, criamos um fator de instabilidade, isso não irá permitir que esses médicos, no dia seguinte, possam aderir ao Serviço Nacional de Saúde. O que vai acontecer é que muitos desses médicos irão para o setor privado ou irão mais uma vez escolher a emigração", afirma.
Para Carlos Cortes, há "uma desigualdade gritante" entre os médicos com contrato individual de trabalho e médicos em prestação de serviço, "nomeadamente nas questões remuneratórias". No entanto, o bastonário diz que o Governo "está a ir pelo sentido errado".
"Em vez de punirmos uns, o que devíamos fazer é melhorar a situação dos outros, nomeadamente dos médicos que estão em contrato individual de trabalho. Receio que se esteja a caminhar para uma catástrofe anunciada em termos de recursos humanos médicos no Serviço Nacional de Saúde", alerta.
Também ouvida pela TSF, Joana Bordalo e Sá defende que, desta forma, o SNS vai perder médicos "por capricho".
"Isto é uma manobra de castigo, não é uma solução. O Serviço Nacional de Saúde não perde médicos por capricho, perde médicos porque não lhes dá condições para estarem no Serviço Nacional de Saúde. O Governo de Luís Montenegro queixa-se de gastar mais de 200 milhões de euros em prestadores de serviço, mas recusa investir nos médicos do quadro e o resultado é que, com este tipo de medidas, ainda vão continuar a empurrar mais os médicos para o privado e para o estrangeiro", explica à TSF Joana Bordalo e Sá.
O projeto ainda vai ser negociado com os sindicatos, mas o Governo quer levar o diploma a Conselho de Ministros no próximo mês de setembro. Se este diploma avançar, a presidente da Fnam prevê também a saída de muitos médicos prestadores de serviço.
“Não é de uma forma coerciva, não é a tentar amarrar os médicos ao Serviço Nacional de Saúde, que isso se vai resolver. Os médicos não vão ficar amarrados ao Serviço Nacional de Saúde, por outro lado, poderemos ter uma saída abrupta de médicos prestadores de serviço, que são quem asseguram parte dos serviços de urgência de norte a sul do país", sublinha.
Questionada sobre se esta situação pode levar a mais urgências fechadas, Joana Bordalo e Sá responde: “Sabemos que o serviço de urgência, hoje em dia, é, muitas vezes, assegurado por médicos internos, sem médicos do quadro presentes e sabemos que estão na mão dos médicos prestadores de serviço. Isto também é uma escolha do Ministério da Saúde e do Governo de Luís Montenegro. Este regime de incompatibilidade, no fundo, é como se fosse uma areia a ser atirada para os olhos dos cidadãos, porque isto, de facto, não vai resolver nada."