"Cativações e juros para os bancos." Há uma "engenharia" para atrasar reformas
A carreira como funcionária do Estado, a renovação no sindicato, o envelhecimento dos quadros sindicais, o atraso na resposta ao pedido da reforma. Ana Avoila denuncia, em entrevista à TSF, as dificuldades que enfrentou ao longo de décadas com vários governos.
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Ligada ao sindicalismo desde os 24 anos e líder sindical desde os 33, Ana Avoila revela nunca ter deixado de "acompanhar o local de trabalho" e que faz questão de "tentar que os trabalhadores exerçam os seus direitos".
"Pedi a aposentação, porque comecei a trabalhar aos 13 anos", conta também. No entanto, Ana Avoila explica que continua a aguardar resposta quanto à reforma: "Estou à espera. Há um atraso grande, que não tem que ver só com a falta de pessoal nem só com os equipamentos informáticos desfasados deste tempo."
Há uma "engenharia" no encaminhamento dos processos que interessa ao Governo e os bancos, com o "propósito de ganhar dinheiro com cativações e de que os bancos ganhem dinheiros com os juros", argumenta. Há ainda o processo de pedidos de pensões internacionais para quem tem anos de carreira contributiva no estrangeiro, em que ocorrem "atrasos brutais, numa situação muito complexa".
"Há países que apresentam atrasos maiores do que os nossos, mas isso não é desculpa. Há coisas que se podem resolver numa semana."
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Ana Avoila diz que "não é um alívio" deixar a liderança da Frente Comum dos Sindicatos da Administração Pública. "Se tivesse de ficar, ficava", sustenta a sindicalista, numa entrevista à TSF em que também alegou estar "na altura de passar testemunho".
Passar o testemunho aos jovens, já que "o futuro vai ser deles, mas têm de ser acompanhados". Ana Avoila alega que a "CGTP tem essa prática há algum tempo, com bons resultados". Esta mudança pode não ser um problema, mas será facilitada apenas se o Governo não oferecer resistência para "aceitar as propostas que estão em cima da mesa há muitos anos".
Atualmente, segundo relata a sindicalista, a média etária da administração central situa-se nos 57 anos, e tal abrange ministérios, direções gerais, secretarias de Estado, bem como institutos como o IPMA. Neste setor, a "precariedade não está resolvida", mesmo depois do prevpap.
Ana Avoila aproveitou para deixar críticas aos sucessivos governos, já que as necessidades vão sendo "colmatadas com trabalho precário" e alertou que a "polivalência é muito complicada no trabalho do Estado". É urgente, refere a sindicalista, "fazer um levantamento das necessidades" e "criar emprego no Estado". E usa os números para o sustentar: em Portugal há 657 mil trabalhadores distribuídos por todas as administrações, e, em outros países, há "uma percentagem muito maior".
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Interpelada pelo jornalista Nuno Domingues na manhã da TSF, Ana Avoila concorda que esta proporção se situará nos 6,5% da população ligada à administração pública. "Tem saído muita gente", acrescenta.
Ao longo dos anos, Ana Avoila sentou-se à mesa das negociações com as cores laranja e cor-de-rosa, e salienta que as cores partidárias nem sempre têm que ver com a vontade de mudar as coisas. "Há governos que não veem os trabalhadores, veem a macroeconomia. Às vezes, uma vitória pode ser ter de deixar como está."
A sindicalista da Frente Comum admite que no privado a preocupação com as carreiras está menos presente, e frisa que o Governo de José Sócrates foi muito prejudicial para a distinção de percursos profissionais, já que se perdeu o conceito de "carpinteiro", por exemplo. "Todos eram assistentes técnicos ou operacionais. Perdemos muito e estamos a tentar recuperar."
Agora, o futuro continua a ser preocupante, realça: "O Governo do PS não está para aí virado, nem o PSD."
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