Chega, Iniciativa Liberal e Livre: quem lidera os partidos novatos do Parlamento?
André Ventura, João Cotrim de Figueiredo e Joacine Katar Moreira são as caras dos partidos que têm, pela primeira vez, um assento parlamentar. Mas quem são os representantes do Chega, Iniciativa Liberal e Livre?
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O político que é mais conhecido por ser comentador desportivo
O professor universitário, político e comentador de futebol. André Ventura, o cabeça de lista do Chega que conseguiu um lugar no Parlamento, desdobra-se, em frente às câmaras, em várias facetas e joga quase sempre ao ataque, com opiniões polémicas e fraturantes.
Foi um aluno de excelência, licenciou-se em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, com 19 valores, e doutorou-se em Direito Público na University College Cork, na Irlanda. Hoje, concilia a política e o comentário televisivo com a docência na Universidade Autónoma de Lisboa e na faculdade onde se licenciou.
Em 2008, publicou o livro "Montenegro" (sem relação com o antigo líder parlamentar do PSD), que conta a "vida de Luís Montenegro, um ciclista de exceção, vencedor da Volta a Espanha, que de um momento para o outro sente o seu mundo ruir, ao descobrir que se encontra infetado com o vírus da SIDA".
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Mais polémica gerou a obra de ficção "A Última Madrugada do Islão - A Conspiração que Matou Yasser Arafat e o Islão", com a Chiado Editora a suspender a publicação do livro por recear o "potencial incendiário" pela forma como era descrita a figura do Profeta Maomé, e pela referência a pessoas e lugares reais da OLP (Organização de Libertação da Palestina).
Incendiárias foram também as várias intervenções que o tornaram uma figura mediática. A primeira aconteceu nas eleições autárquicas de 2017, onde mereceu o apoio do então líder do PSD Pedro Passos Coelho para concorrer à Câmara Municipal de Loures. Acabou por ser eleito vereador com 21,55% dos votos e ficou conhecido pelos comentários sobre a comunidade de etnia cigana, que classificou como aqueles que "vivem quase exclusivamente de subsídios do Estado" e acham que "estão acima das regras do Estado de Direito".
Depois da chegada de Rui Rio à liderança do PSD, André Ventura abandonou o lugar na Câmara Municipal de Loures e a militância do PSD, acusando o novo presidente de "dar a mão ao PS". Decidiu então formar um novo partido: o Chega.
O processo de legalização do partido ficou marcado pelo chumbo inicial do Tribunal Constitucional (TC), que encontrou assinaturas irregulares, e mais tarde, embora tenha aceitado a inscrição do Chega como partido político, remeteu o caso para o Ministério Público.
A 12 de abril de 2019, associou-se à Coligação Basta! para as eleições parlamentares europeias de 2019, mas não conseguiu eleger qualquer eurodeputado, o que levou ao fim da coligação com o Partido Popular Monárquico e com o Partido Cidadania e Democracia Cristã.
Entre as propostas do Chega para as eleições europeias estavam a castração química de pedófilos e a proibição constitucional da eutanásia. Ventura defende ainda a prisão perpétua para homicidas e violadores, e considera que "não devem ser restringidos os direitos dos homossexuais" mas não se deve poder chamar "casamento" à união de pessoas do mesmo sexo.
Debater a Europa ou debater futebol?
A cadeira vazia um debate para as eleições europeias promovido pela televisão pública ficou como marca da campanha de André Ventura. Em vez de debater as ideias para a União Europeia e as razões que o levaram a candidatar-se a eurodeputado, André Ventura preferiu "um compromisso profissional que tinha" como comentador desportivo na CMTV, função que considera compatível com a campanha política."
"Eu não sou rico. Vivo dos meus compromissos profissionais e decidi cumprir com a minha palavra e com a minha obrigação" , justificou, na altura, o candidato.
No rescaldo das eleições legislativas, o presidente do Chega destacou o "feito histórico" do partido, "o mais votado dos partidos pequenos", e rejeitou acordos para formar Governo.
O gestor que serviu cocktails agora é deputado. Quem é o primeiro deputado da IL
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No espaço de três meses, a vida de João Cotrim de Figueiredo mudou radicalmente. Gestor de profissão, sem carreira política, a 6 de outubro é eleito deputado para a Assembleia da República.
Aos 58 anos, "uma surpresa". Não só para os lisboetas, como para o próprio deputado. Na sua página no Facebook, João Figueiredo anunciava as suas motivações: "aceitei porque não já não consigo ficar sentado enquanto o país marca passo e não dá à geração dos meus filhos metade das oportunidades que a minha geração teve".
Lisboeta, mas com paixão pelo Alentejo, onde tem um alojamento local, na vila de Redondo. João Cotrim de Figueiredo estudou na Escola Alemã de Lisboa, e formou-se em Economia na London School of Economics. Nos seus tempos por Inglaterra, serviu cocktails na Serpentine Gallery, de arte contemporânea, tal como escreveu o Público a 4 de outubro.
João Cotrim Figueiredo foi diretor-geral da TVI ao longo de um ano, entre 2010 e 2011. Antes disso, tirou um MBA em Administração, Negócios e Marketing na Universidade Nova de Lisboa, tendo liderado a Compal entre 2000 a 2006.
Na Iniciativa Liberal, o agora deputado encontrou pessoas que "acham que Portugal e os portugueses merecem e são capazes de mais". João Figueiredo pedia liberdade e autonomia para os seus parceiros, indo ao encontro de um Portugal "mais liberal".
Por último, o deputado afirmava respeitar todas as opiniões diferentes, e pedia que fizessem o mesmo com o seu partido. "Com a vossa ajuda vamos construir um Portugal mais Liberal", concluía.
Foi presidente do Conselho Diretivo do Turismo de Portugal entre 2013 e 2016, e vice-presidente da European Travel Commission. Desempenhou igualmente funções de administrador na Jason Associates e na Faber Ventures. Lança-se agora num novo desafio: é o primeiro deputado da Iniciativa Liberal a chegar ao Parlamento português.
Quem é Joacine, a mulher que quer deixar o Parlamento (e o país) "desconfortável"?
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A mulher, negra, ativista antirracista e promete trazer "desconforto" ao Parlamento. Joacine Katar Moreira tem 37 anos, chegou a Portugal - vinda da Guiné-Bissau - aos oito, pela mão da avó, e chega agora à Assembleia da República, onde quer ser o rosto de uma esquerda "antifascista", "antirracista" e "verde".
Licenciada em História Moderna e Contemporânea - vertente de Gestão e Animação de Bens Culturais, mestre em Estudos do Desenvolvimento e doutorada em Estudos Africanos no ISCTE-IUL, Joacine tem como bandeira as questões "de género, do desenvolvimento, a História, a política e os movimentos sociais e cívicos", como a própria escreve na sua página de apresentação do partido Livre.
Foi a primeira mulher negra a encabeçar a lista de um partido a concorrer às eleições legislativas, cerca de um ano depois de criar o INMUNE - Instituto da Mulher Negra em Portugal , uma entidade que "combate o silenciamento das mulheres negras, africanas e afrodescendentes na História e no tempo presente e promove o empoderamento, a participação social e política de mulheres, a igualdade de direitos, a paridade e a justiça social", como se pode ler na página do instituto.
Ainda que queira dar voz a quem não a tem, Joacine garante que não vai para o Parlamento "para confortar ninguém, nem maiorias, nem minorias" e quer que o Livre seja "uma voz desconfortável" na Assembleia da República.
"Gaguejo quando falo, não quando penso"
O que deixou muita gente desconfortável foi a gaguez da candidata do Livre, algo que lhe valeu muitas críticas nas redes sociais. Houve até quem desconfiasse da condição de Joacine, acusando-a de fingir ser gaga para angariar votos, o que já foi, entretanto, desmentido.
Em resposta ao desconforto alheio e às acusações infundadas, Joacine disse, em entrevista ao humorista Ricardo Araújo Pereira no programa da TVI Gente Que Não Sabe Estar, uma das frases mais marcantes da campanha eleitoral: "Eu gaguejo quando falo, não gaguejo quando penso. O que é um risco enorme na Assembleia são os indivíduos que estão lá e que gaguejam quando pensam."
As críticas ao "Bolsonaro português"
Joacine Katar Moreira terá de partilhar o hemiciclo com André Ventura, o candidato do CHEGA que comparou ao Presidente do Brasil. "Precisamos de evitar que haja Bolsonaros" em Portugal, afirmou Joacine Katar Moreira à Lusa, poucos dias antes das eleições.
A candidata do Livre considerou que "Bolsonaro é um exemplo muito semelhante ao do André Ventura aqui", sustentando que ambos "são indivíduos completamente populistas, com uma ótica antidemocrática, mas são indivíduos que igualmente não têm programa para o país".
Não será difícil adivinhar um choque de ideias na Assembleia da República entre os dois deputados, até porque Joacine já garantiu que "não há lugar para extrema-direita no parlamento".